UM IMPROVÁVEL ENFRENTAMENTO DA CORRUPÇÃO

Por Everardo Maciel: 

É ainda difusa a pauta das manifestações de rua, não vinculadas a grupos políticos ou movimentos subsidiados com verbas governamentais.

A despeito disso, algumas bandeiras são nítidas: a repulsa à corrupção, a indignação com as práticas políticas e o descontentamento com os serviços públicos.

Destaco o tema da corrupção, pela sequência de notícias que fazem parecer que o País regrediu à barbárie, sendo o Estado assaltado de forma sistêmica e contínua.

Como reação ao clamor popular, foram anunciados alguns pacotes anticorrupção.

Gilson Dipp, ministro aposentado do STJ, em entrevista ao Correio Braziliense (22.03.2015) assinalou, sensata e objetivamente, que esses pacotes: a) são leis de ocasião, apenas para dar uma satisfação à sociedade; b) as medidas propostas são iniciativas requentadas; c) não é a gravidade da pena que impede a prática do delito.

Corrupção é fenômeno complexo e oportunista. Seu enfrentamento requer atitude permanente, envolvendo a adoção de medidas efetivas e simbólicas. Caso permaneçam as causas que dão ensejo à corrupção, nenhuma legislação será eficaz.

No plano simbólico, o Estado precisa vestir-se com os trajes da austeridade.

É um escárnio a existência de 39 ministérios, constituídos meramente para abrigar pouco virtuosas postulações políticas.

A publicidade oficial devia limitar-se a campanhas públicas educativas, abdicando das peças autolaudatórias e narrativas mitomaníacas de interesse exclusivamente político-partidário.

No âmbito das medidas efetivas, uma questão central é a ocupação dos cargos de direção na administração pública. A vedação ao nepotismo foi um avanço. Nada se fez, entretanto, para prevenir o afilhadismo.

O afilhado tem compromisso apenas com o padrinho (político ou organização política), e nunca com o Estado. Antes, os apaniguados faziam pequenos favores. Mais adiante, a prática evoluiu para entrega de parte dos honorários da função comissionada para o partido patrocinador da indicação. Hoje, são entregues parcelas de contratos celebrados com a administração pública. Um descalabro.

Não são desarrazoadas indicações de partidos para o exercício de funções políticas no Executivo. Funções técnicas, contudo, deveriam ser reservadas a servidores selecionados mediante critérios meritocráticos, estabelecidos em lei.

É ingenuidade supor que a corrupção tenha se limitado à Operação Lava Jato. Não seria a hora de instituir um programa sério e transparente de apuração de presumíveis irregularidades nos setores elétrico e rodoviário, fundos de pensão, etc.? Será que devemos continuar na dependência de incidentes para iniciarmos investigações de corrupção?

É deplorável a destinação de cerca de R$ 900 milhões para o Fundo Partidário, cujas verbas são utilizadas, muitas vezes, em proveito próprio dos “donos” de partidos ou para um ridículo proselitismo. A propósito, até hoje, inexistem regras para fiscalizar e aprovar as contas dos Fundos Partidários.

O orçamento público é território conhecido da corrupção, aqui e alhures.

Hoje sujeito a regras completamente obsoletas, o orçamento, no Brasil, possibilitou o aperfeiçoamento contínuo da vilania das emendas parlamentares.

Em tese, a participação dos parlamentares na elaboração do orçamento é inerente à democracia. Na prática, todavia, não é bem assim.

As emendas, frequentemente, estão associadas ao financiamento ilícito de campanhas eleitorais e a favorecimentos pessoais, o que implica, quase sempre, corrupção, como atestam seguidos exemplos desde o escândalo dos “anões” do Orçamento. Além disso, propiciam lamentáveis barganhas com o Executivo, que não serão eliminadas com o orçamento impositivo, a mais recente “jabuticaba” brasileira.

É indispensável empreender a reforma orçamentária, cuidando, ao menos, das regras concernentes à previsão das receitas e à inserção de emendas nos programas orçamentários.

Também se inscrevem no rol de medidas para enfrentamento da corrupção: o disciplinamento dos lobbies, a revisão da lei de licitações, o financiamento privado de campanhas eleitorais, o restabelecimento da competência da Receita para proceder à suspensão de imunidade tributária dos partidos políticos (suprimida à época das investigações do mensalão), etc. Enfim, uma tarefa árdua e, infelizmente, pouco provável.