Titular de Cartório: Melhor Ocupação do Brasil é Ganhar Dinheiro com a Desconfiança

 Por Fernando Nogueira da Costa

https://fernandonogueiracosta.wordpress.com

Finalmente, uma reportagem investigativa abriu um pouco a “caixa-preta” sobre a qual confesso minha completa ignorância: quem são os Titulares de Cartórios?

Só sei estarem, em todos os anos, no Top da Pirâmide de Riqueza e Renda entre todas as ocupações. Pelas DIRPF 2017 – AC 2017 eram menos de 10.000 declarantes, precisamente 9.671. Seus rendimentos per capita mensais eram disparatados em relação aos restantes: cerca de 101 mil reais. O patrimônio líquido (bens e direitos – dívidas) per capita considera valores históricos — e não atualizados — de seus imóveis.

Além disso, eu me pergunto: qual é a função social do Titular de Cartório justificadora de tamanha renda e riqueza? Quais são seus títulos além de ser titular?

Lembro-me do irônico comentário: “o Brasil só tem pessoas honestas denunciantes de pessoas desonestas“. Gente se considera honesta simplesmente porque não sabia como ganhar dinheiro fácil… E daí veste camisa verde-e-amarela para protestar!

Cibelle Bouças (Valor, 02/05/18) informa: no ano passado, os 11.946 cartórios extrajudiciais existentes no país faturaram R$ 15,76 bilhões, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O crescimento em relação ao ano anterior foi de 11,7%.

Neste ano, apesar de serviços tradicionais como o reconhecimento de firma e autenticação de documento estarem perdendo espaço para a certificação digital, os cartórios ganham novas atribuições, com potencial de novas receitas. A mudança mais recente foi a permissão para que cartórios possam fazer mediação e conciliação extrajudicial.

Na área de registro civil, deixou de ser obrigatório ir à Justiça para fazer alteração de nome, correção de erros de grafia, reconhecimento de paternidade, registros de nascimento por técnicas de reprodução assistida, barriga de aluguel, maternidade e paternidade socioafetiva. Esses atos, que na Justiça demoravam até cinco anos para serem concluídos, hoje são feitos em cartório, de acordo com a Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg/BR).

A Anoreg/BR estima que esses serviços que passaram a ser feitos pelos cartórios geraram economia aos cofres públicos de aproximadamente R$ 4,2 bilhões entre 2013 e 2017. [E a receita foi para mãos privadas?!]

“O processo de desjudicialização traz mais rendimento aos cartórios, mas há ganho também para os usuários. Uma ação que demorava seis meses, até anos no Judiciário, se resolve em um dia no cartório”, afirmou Márcio Evangelista, juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, órgão do CNJ.

Na avaliação de Evangelista, a alta no faturamento dos cartórios em 2017 está ligado a alguns fatores. “Pode ter havido mudanças nas tabelas de preços, que são definidos por cada Estado”, disse o juiz. A profissionalização dos cartórios também deixa o negócio mais eficiente, segundo Evangelista. Além disso, o aumento da procura por pessoas físicas e governos contribuiu para o crescimento do faturamento dos cartórios.

A renda dos cartórios é bastante irregular, variando de acordo com a natureza das atividades e a demanda. Segundo dados do CNJ, em número referente a 9,2% do total de cartórios no país:

  • 88 tiveram no segundo semestre de 2017 faturamento bruto acima de R$ 10 milhões;
  • outros 230 tiveram um faturamento entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões;
  • outros 1.094 tiveram faturamento bruto superior a R$ 1 milhão.

O maior cartório faturou R$ 256,5 milhões no segundo semestre de 2017. Trata-se do Cartório do Único Ofício da Comarca de Queimadas, na Paraíba, que foi procurado, mas a porta-voz não estava disponível para dar entrevista.

“O sucesso do cartório hoje depende muito da forma como trato as pessoas e da qualidade do serviço prestado”, afirmou Paulo Tupinambá Vampré, tabelião titular do 14o Tabelionato de Notas Vampré. Esse cartório é o quinto maior do país em faturamento, tendo atingido R$ 33,1 milhões no segundo semestre de 2017. O lucro antes de impostos fica em torno de 9% da arrecadação.

O 14o Tabelionato de Notas Vampré ocupa um prédio em Pinheiros, na zona oeste da capital paulista,. Emprega 190 pessoas. As atividades vão desde autenticação de cópias a reconhecimento de filhos, testamento e divórcio. Recentemente, Vampré começou a treinar sua equipe para oferecer mediação e conciliação.

O futuro dos cartórios passa por realizar atos que antes eram exclusivos do Judiciário. Com a informatização, atividades tradicionais perderam espaço. Há dez anos o cartório fazia uma média de 200 mil autenticações de firma por mês. Hoje, a média é de 60 mil e cai mês a mês. snif, snif…

José Carlos Alves, presidente do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil – Seção São Paulo, citou como fonte crescente de renda o protesto das certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos municípios, de autarquias e fundações públicas. A cobrança extrajudicial desses títulos começou a ser feita após a publicação da Lei No 12.767, de 27 de dezembro de 2012.

“Nos cartórios de protesto, a demanda cresceu nos últimos anos com o protesto de dívidas públicas. Não houve aumento da demanda pelo setor privado”, disse Alves. A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) recuperou mais de R$ 22 bilhões em dívidas públicas através dos cartórios de protesto em 2017. Alves disse que o governo federal levou a protesto em cartórios 235 mil certidões de dívida ativa em 2017. Do total de títulos, 7,4% foram recuperados. A taxa média de recuperação na Justiça fica entre 3% e 4%.

De acordo com a Anoreg/BR, as mudanças mais relevantes nos cartórios se deram a partir da publicação da Lei No 11.441/2007, que permitiu a realização de inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual por cartório.

Segundo a Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados (Censec), sistema administrado pelo Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal (CNB-CF), desde 2007, os cartórios realizaram 1,9 milhão de atos extrajudiciais, sendo 1,1 milhão de inventários, 547,2 mil divórcios diretos, 84,2 mil conversões de separação em divórcio, 47,8 mil separações, 21,4 mil nomeações de inventariantes, 17,8 mil partilhas, 5,5 mil reconciliações e 72,2 mil sobrepartilhas.

Em 2017, foram feitos 227,5 mil atos, ante 220 mil em 2016. “Os atos de desjudicialização desafoga a Justiça e traz economia de custos para o Estado”, disse Laura Ribeiro Vissotto, diretora do Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo e titular do 1o Cartório de Notas de São José dos Campos (SP).

Outro serviço que os cartórios passaram a realizar, desde 2016, é o apostilamento, ato que simplifica a legalização de documentos e o reconhecimento de documentos brasileiros no exterior. Desde 2016, foram realizados quase 2 milhões de apostilamentos. “O prazo de espera para quem solicita o apostilamento baixou de três meses para cinco dias”, disse Laura.

A regularização de imóveis por usucapião é outro serviço recente nos cartórios. O reconhecimento extrajudicial foi definido pela Lei No 13.105/2015. Em dezembro de 2017 o CNJ estabeleceu diretrizes para os cartórios realizarem o ato.

Luis Carlos Vendramin Júnior, vice-presidente da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais, observou que os cartórios de registro civil foram autorizados, em janeiro por lei, a fazer solicitação e entrega de documentos, como passaporte, RG, documento nacional de identificação, CNHs, carteira de trabalho e título de eleitor.

Mas, o Partido Republicano Brasileiro (PRB) entrou com ação direta de inconstitucionalidade (ADI 5855), alegando erro na tramitação do projeto no Congresso. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu em março liminar suspendendo a lei, até que a ADI seja julgada. Não há prazo definido para que o STJ faça o julgamento. ?

A disputa para ser titular de um cartório costuma ser alta. Os candidatos são atraídos principalmente pela chance de vir a comandar um negócio cuja receita é líquida e certa.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por exemplo, realiza no momento um concurso para preencher 165 vagas de titulares, que atraiu 10.857 candidatos. A média é de 65,8 candidatos por vaga. Para se ter uma base de comparação, a concorrência para o curso de Direito na Universidade de São Paulo (USP) no vestibular para este ano chegou a 27,4 candidatos por vaga.

De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), dos 11.946 cartórios extrajudiciais existentes no Brasil, 4.589 são considerados “vagos”, ou seja, sem um profissional concursado como titular. Esse número corresponde a 38% dos cartórios do país.

Os cartórios ficam vagos quando o antigo titular se aposenta, falece, faz concurso e se transfere para outra unidade, ou simplesmente desiste. O mais comum é que titulares de cartórios extrajudiciais deficitários façam um novo concurso para serem transferidos a outra unidade.

Quando o cartório fica “vago”, o Poder Judiciário estadual indica um profissional interino para responder pela unidade, até a conclusão do concurso público.

[Quem, hein? Quanto ganha? Quem indica? Fica com quanto? Faltou à reportagem responder às questões-chave do jornalismo: seis perguntas indicadas no mnemônico OCC-OCP (“Oh, cecê! Olhe com pudor.):

  1. quê?
  2. Quem?
  3. Quando?
  4. Onde?
  5. Como?
  6. Por quê?]

Os Tribunais de Justiça fazem concursos a cada semestre para preencher as vagas disponíveis. Atualmente, Tribunais de Justiça de Alagoas, Amazonas, Ceará, Minas Gerais, São Paulo, Sergipe e Tocantins realizam concursos para a escolha de titulares para 928 cartórios.

“No Brasil há um imenso fosso que separa a grande maioria dos cartórios de baixa renda, das ilhas de eficiência e modernidade representada pelos cartórios situados em grandes centros urbanos“, disse Sérgio Jacomino, presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB), registrador imobiliário e doutor em Direito Civil pela Unesp.

Dos 11.946 cartórios existentes no país, 1.094 tiveram um faturamento bruto superior a R$ 1 milhão no segundo semestre de 2017, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Isso equivale a 9,2% do total de cartórios em operação no país.

A Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg/BR) calcula que, descontadas as despesas de repasses, funcionamento e impostos, 20,99% dos cartórios (2.507 unidades) faturam acima de R$ 21.491,00 por mês. Outros 11,75% dos cartórios (1.474 unidades) recebem por mês de R$ 13.246 a R$ 21.491,00. E 32,13% dos cartórios (4.032 unidades) recebem por mês de R$ 3.101 a R$ 13.245,00. [O que?! Não bate com as DIRPF!]

Para se ter uma base de comparação, o piso salarial de um advogado em São Paulo é de R$ 3.057,50, para 40 horas semanais. Do total de cartórios existentes no país, 35,13% (4.409 unidades) têm receita mensal de até R$ 3.100,00. Dentro desse grupo, 138 cartórios tiveram receita zero no segundo semestre de 2017 e outros 126 cartórios apresentaram uma receita bruta inferior a R$ 1 mil.

É enorme a quantidade de pequenos cartórios de registro de pessoas vagos, pois são deficitários. Os serviços mais praticados são gratuitos e requerem funcionários, computador, energia, sistema, etc”, afirmou Luis Carlos Vendramin Júnior, vice-presidente da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil) e vice-president da Arpen-SP.

A Corregedoria do CNJ, que fiscaliza os cartórios, observou que os registros de nascimento e óbito correspondem a mais de 70% dos atos realizados pelos cartórios de registros civis de pessoas naturais. Há outros serviços gratuitos, como casamentos, reconhecimento de paternidade, regularização de imóveis para pessoas consideradas pobres, procurações para fins previdenciários. O protesto de títulos em alguns Estados, como São Paulo, é gratuito para o credor. Então, dependendo da natureza do cartório, a geração de faturamento pode ser maior ou menor.

Os candidatos aprovados nos concursos também têm a opção de escolher as unidades disponíveis, dependendo da sua classificação. E há casos em que os candidatos preferem não assumir um cartório deficitário, ficando então aquela unidade vaga de forma indefinida.

A Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg/BR) observa que, sobre o faturamento bruto dos cartórios são descontados repasses a diferentes órgãos públicos, além do Imposto de Renda, Imposto Sobre Serviços (ISS) e despesas de funcionamento do cartório – como salários, água, aluguel, luz, entre outros. Os repasses legais variam de 6,54% a 52,20% do faturamento bruto, dependendo do Estado e da natureza do cartório.

Na média, os repasses legais para órgãos públicos comprometem 28% da receita bruta dos cartórios. Esses repasses são destinados a governos Estaduais e Tribunais de Justiça.

Os cartórios também destinam parte do faturamento a fundos usados para cobrir custos com a prestação de serviços gratuitos. Os fundos também repassam recursos para os cartórios deficitários arcarem com os custos da atividade. Em alguns Estados, os cartórios também fazem repasses para fundo de reaparelhamento do Judiciário e Fundo Especial de Apoio e Desenvolvimento do Ministério Público. Há ainda cobranças específicas, como repasses para a Santa Casa de Misericórdia, em São Paulo.

Paulo Roberto Gaiger Ferreira, presidente do Colégio Notarial do Brasil (CNB) e conselheiro da União International do Notariado (UINL), observou que cada tabelião tem autonomia para informatizar seus serviços. “De modo geral, os novos concursados já começam fazendo uso intensivo das novas tecnologias”, afirmou.

Os custos cartoriais são elevados e têm grande dispersão no Brasil, encarecendo os custos do setor imobiliário. A avaliação consta de estudo feito pela Associação das Empresas do Mercado Imobiliário no Estado do Amazonas (Ademi-AM) e que está sendo divulgado pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).

Celso Petrucci, presidente da Comissão da Indústria Imobiliária da CBIC, disse a área estar “umbilicalmente” ligada aos cartórios e é preciso haver um maior grau de “equalização” nos custos cartoriais do país. “Estamos buscando mostrar para a sociedade o absurdo que é enfrentar preços e procedimentos diferentes para fazer a mesma coisa”, disse.

O executivo afirma que em um processo de incorporação, a empresa tem que fazer diversos procedimentos cartoriais, alguns que, inclusive, se repetem desnecessariamente.

A Ademi-AM, além de mostrar um amplo leque de serviços cartoriais e seus preços em 11 Estados, avaliou um caso concreto: um empreendimento de 20 mil metros quadrados, com 250 apartamentos. A dispersão de custos apontada nesse exemplo é de fato elevada. O menor gasto cartorial foi verificado no Rio Grande do Sul, com R$ 1,166 mil no caso em questão. A despesa mais alta ocorreria em São Paulo, com R$ 246 mil. O custo médio calculado para esse caso nos 11 Estados foi de R$ 60,8 mil.

Para Petrucci, o sistema cartorial possui uma série de “penduricalhos”. “Na Bahia, por exemplo, 52% dos recursos vão para outros órgãos que não o cartório”, disse, explicando que isso também encarece o processo.

O estudo, que considera as tabelas cartoriais de 2016, mostra, por exemplo, que uma averbação de loteamento de imóvel custa R$ 3,45 no Distrito Federal e R$ 297,30 no Pará. Uma escritura de imóvel avaliado em mais de R$ 3,2 milhões custa R$ 1,5 mil no Rio de Janeiro e R$ 14 mil no Amazonas.

“Como justifica colocar R$ 14 mil de valor numa escritura? Isso é um escracho. Os valores são fora da realidade. O serviço é muito simples pelos valores que cobram”, disse o presidente da Ademi-AM e consultor da CBIC, Romero Reis. A Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg) não quis comentar o assunto.

Fernando Nogueira da Costa:

Dou abaixo o exemplo real do custo de uma compra de imóvel realizada em 2011 na capital de São Paulo:

A compra de imóvel não implica somente em pagar o valor do bem. Além disso, o interessado ainda gasta cerca de 9% do preço do imóvel só com documentação. Dentre os gastos, estão taxas de cartório e impostos. Com relação às certidões de cartório, os valores são relativamente pequenos. Mas o que pesa mesmo é o preço da escritura e o ITBI – Imposto de Transição de Bens Imóveis, além do pagamento de advogado, caso seja necessário o exame minucioso da validade jurídica da documentação.

O ITBI é de competência municipal e, por isso mesmo, tem legislação própria para cada um deles. O imposto custa 2% sobre o valor do imóvel em São Paulo. A título de ilustração, em imóvel de R$ 300 mil, o preço pago com o imposto seria de R$ 6 mil.

O ITBI é sempre calculado sobre o maior valor do imóvel. Se no IPTU (Imposto Predial Territorial Urbano) aponta que ele custa R$ 120 mil, mas a pessoa pagou R$ 100 mil, vale o primeiro. Caso o comprador tenha desembolsado R$ 120 mil e o IPTU diz que vale R$ 100 mil, o imposto incide sobre o que foi pago.

Com relação ao valor da escritura, os preços estão disponíveis na Tabela I dos Tabelionatos de Nota. Por exemplo, para o imóvel na faixa de R$ 278.602,00 até R$ 417.903,00, o gasto do comprador seria de R$ 2.094,73.

Nos negócios de compra e venda de imóveis, é bastante comum a assinatura de um instrumento particular de compra. Uma vez assinado este documento, o comprador, em geral, dá um sinal até 20% do valor do imóvel que está a venda, como forma de garantia. Por exemplo, em compra por R$ 300.000 seria até
R$ 60.000.

Como era de se esperar, não é recomendável assinar ou efetuar o pagamento deste depósito antes de ter certeza de que tanto a documentação do imóvel quanto a do vendedor estão corretas. Dentre os cuidados a serem tomados, é importante que o comprador assegure-se de que o vendedor está em dia com o pagamento de impostos (ex. IPTU), taxas (ex. taxa de lixo) e outras despesas (ex. água, luz, condomínio).

Também é preciso cuidado, por exemplo, com imóveis que foram doados em herança, ou que são alvo de partilha de bens entre casais. Neste caso, a venda pode estar bloqueada até a conclusão do inventário ou da partilha.

Necessita-se de declaração com firma reconhecida de que o vendedor, assim como o conjugue ou companheiro (a não ser que tenha dado declaração de que não convive em união estável desde determinada data), não é nem foi proprietário ou sócio de empresa. Caso contrário, tem de se apresentar os documentos da empresa, caso tenha sido ou seja proprietário / sócio.

Outro problema é verificar processos arquivados ou em andamento. Toda essa documentação, para ser examinada por advogado, segundo Tabela da OAB, exige o pagamento de 6% do valor do imóvel, logo, se este tiver o valor de R$ 300.000, seriam R$ 18.000 pagos a essa corporação de ofício!

Somados aos gastos anteriores, poderia se atingir cerca de R$ 27.000 ou 9% do valor desembolsado para se pagar o imóvel à vista. Como as rentabilidades das aplicações financeiras, em 2010, em geral, ficaram abaixo desse percentual, veja a expropriação que é submetido o comprador: todo o rendimento de seu capital (R$ 300.000), durante o último ano, é entregue a “intermediários” da aquisição do imóvel tão “imprescindíveis” como cartórios, governo local, advogados e até corretores, caso o comprador os tenha contratado.

Evidentemente, outro custo de oportunidade deve ser calculado. Se o aluguel mensal de imóvel similar ficar em torno de 0,5% do valor patrimonial ao mês, os 6,17% (sem considerar a TR) de rentabilidade anual dos depósitos de poupança já pagariam o aluguel durante um ano. Em termos financeiros, desconsiderando eventual ganho de capital com sua venda futura, parece não valer a pena comprar imóvel nesse País cartorial e com tanta insegurança jurídica.

Vamos, agora, ilustrar os argumentos apresentados com mais números reais sobre a custa cartorária. É absurda, mas nenhum político ou autoridade ousa enfrentar o problema.

Pela intermediação imobiliária, por exemplo, de apartamento de dois quartos com 60 m2, na cidade de São Paulo, por R$ 300.000, e vaga na garagem por R$ 35.000, o vendedor desses imóveis compromete-se a pagar a comissão de corretagem relativa ao negócio à Empresa de Consultoria de Imóveis, no valor de R$ 20.000,00, quando do recebimento da parcela relativa ao sinal, distribuído da seguinte forma:

  • R$ 2.500 para o coordenador dos diversos corretores;
  • R$ 7.500 para o corretor que realizou diretamente a negociação com o comprador;
  • R$ 10.000 para a Consultoria de Imóveis.

Mas não é só.

Observa-se que os serviços de despachante para obtenção de certidões juntos a inúmeros Tabeliões de Notas e Protestos, Distribuidores de Ações Judiciais, Prefeituras ou outras Autarquias, serão de responsabilidade exclusiva das partes. Por essa razão, a Consultoria de Imóveis, responsável pela citada intermediação, não será responsável por qualquer quantia paga ou recebida para a satisfação dos serviços mencionados.

O pagamento pelo comprador do sinal mencionado, entre 10% a 20% do valor total dos imóveis, está condicionado, legalmente, à apresentação por parte do vendedor de documento idôneo (matrícula) que comprove ser ele o legítimo proprietário sobre o imóvel em questão. Também não basta só isso. O vendedor deverá entregar ao comprador, no prazo de até dez dias úteis, a partir da assinatura desse Compromisso de Compra e Venda dos Imóveis, outros documentos elencados em seguida.

A documentação relativa aos Imóveis é constituída por:

  1. certidões atualizadas das matrículas dos Imóveis, expedidas pelo 10º Cartório Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, com negativa de ônus e alienações, e incluindo as averbações referentes ao número de contribuinte da vaga e ao casamento do Vendedor, com prazo inferior a 30 (trinta) dias;
  2. certidão negativa de débitos municipais, com prazo inferior a 30 (trinta) dias;
  3. Imposto Predial e Territorial Urbano (“IPTU”) com parcelas pagas do corrente exercício fiscal, inclusive com os dados corretos dos Imóveis;
  4. três últimas contas de luz, água e gás pagas;
  5. declaração do síndico com prazo inferior a 30 (trinta) dias, com firma reconhecida, de que não existe débito do vendedor para com o condomínio, juntamente com a cópia autenticada da Ata de Assembleia Geral que elegeu o síndico.

A documentação relativa à pessoa física do vendedor inclui:

  1. cópia autenticada do RG e CPF, e da Certidão de Casamento atualizada;
  2. certidões negativas dos distribuidores cíveis da Comarca desta Capital (São Paulo) abrangendo o período de 10 (dez) anos, englobando inclusive ações cíveis, de família, executivos fiscais, com prazo inferior a 30 (trinta) dias;
  3. certidões negativas dos dez Cartórios de Protesto da Capital, no período de 5 (cinco) anos, com prazo inferior a 30 (trinta) dias;
  4. certidão negativa do distribuidor da Justiça Federal, em São Paulo, no período de 10 (dez) anos, com prazo inferior a 30 (trinta) dias;
  5. certidão negativa da Justiça do Trabalho dessa Capital; e
  6. certidão conjunta negativa de Tributos Federais e Dívida Ativa da União.

Portanto, o objetivo de tanta papelada é investigar se há algum apontamento negativo referente ao imóvel ou ao contribuinte, no caso de PF (pessoa física), o conjugue, ex e herdeiros, no caso de PJ (pessoa jurídica) também os sócios. O imóvel pode ser parte de inventário ou garantia de dívida, no caso de ser trabalhista, esta praticamente anula a venda.

São inúmeros documentos:

  1. débitos IPTU e de Tributos Imobiliários,
  2. dívida ativa,
  3. valor venal / valor atribuído do imóvel,
  4. situação junto ao SERASA, Cível, Executivos Fiscais, Protestos, Justiça de São Paulo, Justiça Federal, Justiça do Trabalho, CND e porventura algo mais que foi esquecido nessa lista imensa.

Como “não existe almoço de graça em Economia”, quem paga por isso? Em última análise, o comprador, pois, logicamente, tudo é precificado pelo vendedor. Ele repassa o custo da conformidade jurídica e o gasto com a intermediação imobiliária (inclusive com despachante) para o preço cobrado pelo preço do imóvel. Ele consegue? Depende da elasticidade da demanda.

Se, por exemplo, se o vendedor comprou o citado imóvel por R$ 100.000 em novembro de 2004 e o colocou à venda por R$ 300.000 em novembro de 2010, ele está tendo ganho nominal de capital de R$ 200.000 ou rentabilidade de 200% em seis anos! Entretanto, ele cobrou R$ 335.000, justificando o acréscimo de R$ 35.000 pela vaga na garagem, mas, na verdade, era para pagar seu custo de intermediação imobiliária. O aquecimento do mercado imobiliário levou ao vendedor “esticar a elasticidade-preço da demanda”. O crescimento econômico ou do crédito  permitiu o comprador “esticar a elasticidade-renda da demanda”.

O comprador, além de pagar os R$ 335.000 pelos imóveis, pagará mais:

  • R$ 6.700,00 de ITBI ou SISA;
  • R$ 2.363,24 pela Escritura; e
  • R$ 2.300,00 pelos Registros.

Serão R$ 2.363,24 com os seguintes emolumentos:

  • ao Tabelião, R$ 1.467,84;
  • à Santa Casa, R$ 14,68;
  • ao Registro Civil, R$ 77,26;
  • ao Tribunal de Justiça, R$ 77,26;
  • ao Estado, R$ 417,18; e
  • à Carteira das Serventias, R$ 309,02.

Portanto, somando R$ 6.700 pelo imposto, R$ 2.363 pela escritura e R$ 2.300 por dois registros, um do apartamento, outro da vaga, atinge-se R$ 11.363, ou seja, o custo de intermediação, considerando-se também a corretagem imobiliária, é de R$ 31.363 ou 9% do gasto total (R$ 346.363) na compra dos imóveis. Considerando-se apenas a área do apartamento, o custo é R$ 5.772 /m2!

O que?! Quem?! Por que?! Ninguém sabe porque tantos mordiscam e, portanto, ganham com a elevação especulativa dos valores de mercado do patrimônio imobiliário da cidade… A resposta é: “Ora, não amole, é pegar ou largar!”