A nova eleição direta para governador do Amazonas, determinada pelo Plenário do Tribunal Superior Eleitoral, pode não servir de precedente para o caso da chapa Dilma-Temer, em julgamento na corte, avaliam especialistas em Direito Eleitoral consultados pela ConJur. O que vai definir isso será a decisão do Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucionalidade que discute se regras do Código Eleitoral podem se sobrepor a normas da Constituição Federal.
Isso porque a sucessão presidencial é definida por regras próprias (Artigo 81 parágrafo 1º da Constituição Federal), enquanto o Código Eleitoral coloca regras para a vacância de cargos eletivos por decisão judicial.
Em maio, o Plenário do TSE cassou os mandatos do então governador, José Melo (Pros), e de seu vice, José Henrique Oliveira, por compra de votos durante a campanha de 2014. Ao cassar a chapa, o TSE determinou que o Tribunal Regional Eleitoral organizasse novas eleições para o comando do Executivo estadual, ocupado interinamente pelo presidente da Assembleia, David Almeida.
A corte baseou-se no Código Eleitoral, que, após a minirreforma eleitoral de 2015 (Lei 13.165), fixou que a eleição será por votação indireta somente se a vacância do cargo ocorrer a menos de seis meses do final do mandato.
Segundo o ministro Luís Roberto Barroso, ao julgar um recurso da Assembleia Legislativa do Amazonas, as mudanças de 2015 nas normas eleitorais, apesar de questionadas no Supremo pela Procuradoria-Geral da República, têm “presunção de constitucionalidade”. Assim, seguem valendo.
A advogada Ezikelly Barros explica que antes da Lei 13.165/2015, a invalidação de eleições majoritárias garantia novo pleito quando a decisão anulasse mais da metade dos votos válidos. Mas se fosse afetado menos de 50% do resultado, deveria ser chamado o segundo colocado nas eleições.
Ela detalha que, na cassação do mandato do governador do Amazonas, o TSE, ao aplicar os parágrafos 3 e 4 do artigo 224 do Código Eleitoral, analisou a questão apenas sob a ótica do artigo 16 da Constituição Federal. O dispositivo determina que “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.
“Muito embora a minirreforma eleitoral de 2015 seja posterior à eleição anulada — que ocorreu em 2014 —, o TSE entendeu que o ‘critério para sucessão’ no caso de cassação do diploma do chefe do Poder Executivo não altera o processo eleitoral e, portanto, não se submete ao principio da anualidade ou da anterioridade eleitoral”, explica.
Regras específicas
Já no caso da presidência, o artigo 81 parágrafo 1º da Constituição Federal define que “vagando os cargos de presidente e vice-presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga” e detalha que o pleito deve ser indireto, feito pelo Congresso Nacional, quando a vacância ocorrer “nos últimos dois anos do período presidencial”.
Para Karina Kufa, o caso amazonense não vale como precedente também porque foi julgado sem a composição completa dos titulares da corte — Gilmar Mendes e Luiz Fux. “Mudaram a jurisprudência sem a composição de titulares. Como o julgamento contará agora só com titulares, eles acompanharão a jurisprudência”, afirma.
Influência das ADIs
Já o eleitoralista Leandro Mello Frota entende que o artigo 224 do Código Eleitoral vale, sim, para o caso caso a chapa Dilma-Temer, por fazer menção expressa à cassação por corte eleitoral. Sendo assim, continua, caso ocorra a condenação pelo TSE, as eleições serão diretas, pois o dispositivo é claro ao definir esse modelo de pleito em caso de decisão judicial proferida com mais de seis meses para o fim do mandato.
Assim, segundo ele, a eleição só seria indireta caso o TSE definisse a situação de Michel Temer a menos de seis meses do fim do mandato ou o Congresso Nacional o afaste por impeachment.
Os parágrafos 3 e 4 do artigo 224 do Código Eleitoral, ainda serão analisadas pelo STF nas ações diretas de inconstitucionalidade 5.525 e 5.619. As duas têm o ministro Barroso como relator.
Ambas questionam a constitucionalidade dos parágrafos 3 e 4 do artigo 224 do Código Eleitoral alegando que o dispositivo viola a autonomia federativa que permite a estados e municípios regulamentar o critério de sucessão em caso de vacância da chefia do Executivo.
“E a discussão posta no caso de eventual cassação da chapa Dilma-Temer, também objeto das ADIs 5.525 e 5.619, é a prevalência da norma prevista no artigo 81 da Constituição Federal sobre uma regra de legislação infraconstitucional”, diz Ezikelly Barros.
A lei poderia, continua a advogada, oferecer, no máximo, detalhamento sobre o procedimento para novas eleições, “mas não trazer prazo diverso do previsto constitucionalmente para que ocorram eleições indiretas”.
Publicação do acórdão
Segundo o advogado Fernando Neisser, o que chama a atenção no caso amazonense, e pode servir de precedente é o cumprimento imediato da decisão antes da publicação do acórdão. “Sem acórdão a parte não pode recorrer”, ressalta.
Ele explica que é habitual do TSE esperar a publicação do acórdão para determinar o cumprimento da decisão, porque a parte vencida costuma apresentar embargos de declaração. No caso do governador cassado do Amazonas, a decisão determina imediata organização de novas eleições. Neisser diz ainda que, conforme a jurisprudência do TSE, a decisão, depois de esgotados os recursos, só será suspensa se houver recurso provido pelo Supremo.
Brenno Grillo é repórter da revista Consultor Jurídico.