As Súmulas Vinculantes, criadas com a Emenda Constitucional 45/2004, desequilibraram o sistema de freios e contrapesos que rege o tripé dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. A afirmação é do ministro Alexandre de Moraes, para quem, a mudança permitiu que, de certa forma, o STF legislasse.
Essa “super competência” já foi citada anteriormente pelo constitucionalista português Carlos Blanco de Morais em entrevista à ConJur. Segundo o jurista, “o STF pode até substituir-se a Deus e à dogmática jurídica, julgando normas inconstitucionais e depois repô-las em vigor quando se percebeu a existência de certos efeitos indesejáveis”.
Moraes também criticou as interpretações abrangentes feitas por membros do Judiciário. “Uma coisa é a interpretação constitucional, outra é o ativismo judicial”, disse durante sua palestra no IV Colóquio sobre o Supremo Tribunal Federal, organizado pela Associação dos Advogados de São Paulo na segunda-feira (4/12), na capital paulista.
Ele defendeu a possibilidade de serem feitas interpretações do conteúdo sistêmico das leis e adaptações com o passar do tempo — que fazem parte da evolução jurisprudencial —, mas criticou a falta de limites nesses entendimentos, muitas vezes amplos demais.
O problema da interpretação das normas conforme preceitos de momento, para o ministro, é que “amanhã, podemos não concordar com as decisões do Supremo”. Segundo ele, essas práticas, se ilimitadas, permitem ao juiz, em alguns casos, tomar a liberdade do que ele classificou de “acho que, não gosto de…”
“Pode interpretar, pode evoluir, mas não pode esquecer aquilo que está escrito expressamente”, explicou. Destacando que o ativismo não é feito só no STF, “mas também pelo juiz de primeira instância”, Alexandre de Moraes citou como um dos exemplos desse ativismo a proibição à cláusula de desempenho, criada com a Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096//97).
Ele explicou que, à época da decisão, o entendimento pode até ter agradado a todos, por conta das repercussões que teria naquele momento. Mas o tempo passou, continuou, e uma sucessão de decisões do STF e do Tribunal Superior Eleitoral resultaram em 29 partidos políticos no Congresso, 36 criados e mais 50 na fila do TSE.
“Há partidos absolutamente insignificantes que vendem seu tempo de TV ou vão ao debate bater língua de trapo […] Não se deve aplicar ativismo à política eleitoral, porque não se sabe quais os efeitos sobre o Congresso”, afirmou.
Ator ou moderador
Esse mesmo argumento foi usado por Moraes em seu discurso na XXII Conferência Nacional da Advocacia, na última semana, também em São Paulo. Ele defendeu que o Judiciário não crie interpretações a partir das próprias crenças para conseguir julgar normas inconstitucionais.
Na ocasião, ele defendeu que o Supremo evitasse virar principal ator político do país, mesmo “neste momento histórico, em que temos um Congresso Nacional sem nenhum apoio”, disse. Para o ministro, não se pode “confundir jamais o continente [a democracia] com o conteúdo [parlamentares envolvidos em ilícitos]”.
“Discordar de uma lei e trocá-la por outra é uma opção legitima do legislador”, afirmou. “Podemos discordar ou não do tratamento dado a uma matéria. Mas daí a dizer que ele é inconstitucional, há uma distância. Uma distância que pode ser reduzida quando utilizam de forma ampla princípios gerais.”