Osíris M. Araújo da Silva
O discurso do Papa Francisco, na abertura do Sínodo da Amazônia, no domingo, 6, causou profundo impacto. Especialmente junto ao mundo cristão quando afirmou com todas as letras que “Deus nos preserve da ganância dos novos colonialismos”. Dentre os tópicos mais relevantes as afirmativas de que “o fogo ateado por interesses que destroem, como o que devastou recentemente a Amazônia, não é o do Evangelho. O fogo de Deus alimenta-se com a partilha, não com os lucros. O fogo devorador alastra quando se quer fazer triunfar apenas as próprias ideias, formar o próprio grupo, queimar as diferenças para homogeneizar tudo e todos”. O recado, como interpretado por diversos especialistas em Vaticano, é claro como água benta. Expressa nítido anseio de que o Sínodo da Amazônia seja “histórico” e marque um reposicionamento da Igreja Católica, o que tem assustado desde bispos, fiéis e políticos de todas as correntes mundo afora.
O documento “Instrumentum Laboris”, elaborado para orientar os debates do Sínodo a partir da consulta “a mais de 80 mil pessoas na Amazônia”, defende, segundo seus pressupostos, “exatamente o oposto da política do governo brasileiro para a floresta”. Reivindica “um outro tipo de desenvolvimento, colocando a Amazônia no centro e os povos da floresta como protagonistas” e propõe, por meio do Sínodo, “um Cristo com face amazônica”. O próprio Papa Francisco preconiza a ideia de que “a Igreja deve se abrir para os conhecimentos dos povos indígenas e ser mudada por estas outras experiências de ser e de apreender o mundo. Uma espécie de multiculturalismo ao modo do Vaticano”. O documento, todavia, é omisso ao não apontar meios para chegar a esse nível de excelência conjuntural.
Segundo o Vaticano, o Sínodo Diocesano diz respeito a uma assembléia de eclesiásticos e leigos, uma reunião universal, periódica e consultiva de bispos da Igreja de Roma (incluindo os das igrejas orientais católicas), convocada pelo Papa. Tem como objetivo superior refletir, discutir e aconselhar o Sumo Pontífice sobre diversos assuntos, nomeadamente em relação à políticas e orientações diretivas gerais da Igreja. Informes do Vaticano dão conta de que neste Conselho não participam todos os bispos do mundo inteiro, mas apenas representantes eleitos pelas suas respectivas conferências episcopais. Sínodos, ao contrário dos orientais, normalmente não produzem nenhum decreto ou resolução de força (salvo expresso desejo do Papa de tal acontecer). Também não formulam novas doutrinas e crenças, algo que os “concílios ecumênicos”, unidos com o Papa, fazem. De caráter apenas consultivo, o Sínodo dos Bispos foi instituído do pelo Concílio Vaticano II (1962–1965), convocado no dia 25 de dezembro de 1961, através da bula papal “Humanae salutis”, pelo Pontífice João XXIII.
Em Roma, aposta-se que o Sínodo da Amazônia possa imprimir caráter ambientalista ao Vaticano ao alinhar-se a poderosas ONGs na reação ao chamado “negacionismo climático”, ou seja, aos grupos de pessoas que não acreditam que o aquecimento global seja causado pela ação humana. Os ditos “negacionistas climáticos” são vistos como uma das maiores ameaças que pairam sobre a Amazônia, embora não constituam a maioria da população do mundo. Além do extremo cuidado do Papa Francisco, assessorado por ambientalistas, que se fazem acompanhar de grupos representativos de setores dos povos da floresta, o Sínodo está passando ao largo das discussões em profundidade sobre quais exatamente os entraves que inibem a alavancagem sócio-econômica e as respectivas correções dos pontos de estrangulamento causadores da destruição do bioma. Olhar à distância, ditar regras, apontar soluções sem base local pode levar o Papa Francisco a distanciar-se irreversivelmente do governo e da sociedade brasileira empenhada na formulação de políticas públicas e engenharias financeiras que atendam às necessidades e prioridades do desenvolvimento.