Sem rumo

Sem rumo

Enquanto, em seu macabro curso, a crise sanitária se intensifica, o Brasil reproduz velhas práticas de um País sem rumo, que abomina o planejamento, trava batalhas verbais, extremadas e inconsequentes, e se encanta com chavões, especialmente os importados.

É notória a grande volatilidade nos preços do petróleo, com repercussões sobre os combustíveis e, por consequência, toda a economia.

É preciso, primeiramente, estabelecer um debate público sobre a formação dos preços dos combustíveis para, em seguida, tomar iniciativas, como talvez a ampliação do refino no País, e estabelecer mecanismos compensatórios à flutuação de preços, especialmente no campo tributário porquanto aqueles produtos são submetidos a um elevado ônus.

Quando, no final da década de 1990, o Brasil decidiu eliminar o monopólio da Petrobrás na importação de combustíveis, configurou-se uma situação que encerrava dois problemas: a extinção da Parcela de Preço Específica (PPE), um espécie inominada de tributo que a Petrobrás recolhia ao Tesouro, em virtude do exercício daquele monopólio, e um desequilíbrio tributário entre a produção doméstica e a importação de combustíveis, em desfavor daquela, porque sobre ela incidia o PIS/Cofins ao passo que, à época, essas contribuições não incidiam sobre as importações, configurando o que se denomina discriminação territorial inversa.

Para corrigir o desequilíbrio e repor as relevantes perdas decorrentes da extinção da PPE, é que se apresentou proposta que resultou na Emenda Constitucional (EC) nº 33, de 2001, facultando a instituição de uma contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE) nas atividades de importação e comercialização de petróleo, gás natural e seus derivados, e álcool combustível.

A alíquota da CIDE poderia ser diferenciada por produto ou uso e reduzida ou restabelecida, a qualquer tempo, por ato do Poder Executivo. O produto de sua arrecadação seria destinado a subsidiar preços ou transporte de combustíveis ou, então, financiar projetos ambientais ou de infraestrutura de transportes.

Na mesma EC nº 33, previu-se a possibilidade de os Estados fixarem, mediante convênio, alíquotas aplicáveis àqueles produtos, uniformes em todo território nacional, podendo ser diferenciadas por produto e específicas por unidade de medida adotada, o que as tornaria menos vulneráveis às variações nos preços do petróleo.

Já a CIDE poderia ser utilizada como uma câmara de compensação para os preços daqueles produtos, aumentando a alíquota quando o preço do petróleo caísse e diminuindo quando ocorresse o contrário. Afora isso, poderia subsidiar diretamente o preço ou o transporte de combustíveis.

Como é recorrente neste País, a marcha da insensatez se fez presente. A faculdade conferida aos Estados jamais se efetivou. A EC nº 42, de 2003, ao dar nova redação ao parágrafo primeiro do artigo 150 da Constituição, eliminou a flexibilidade para ajustes na CIDE. A EC nº 44, de 2004, por sua vez, estabeleceu a partilha da arrecadação da CIDE com os Estados e Municípios, desconsiderando sua natureza estritamente regulatória. Por fim, a CIDE foi reduzida a zero.

Hoje, quando ocorre uma perversa combinação de elevação do dólar e dos preços do petróleo e não tendo a Petrobrás recorrido à insensata política de controle de preços, constata-se que foram suprimidos meios para promover ao menos a mitigação da alta nos preços dos combustíveis.

Em contrapartida, para minorar a alta nos preços, sem perda de arrecadação, optou-se por reduzir a zero o PIS/Cofins incidente sobre o diesel, por dois meses, e, por prazo indeterminado, sobre o gás de cozinha.

Em 2020, o Poder Executivo encaminhou ao Congresso Nacional projeto de lei que cria a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota única, e extingue em 6 meses, a contar da sanção da lei, o PIS/Cofins. Já escrevi sobre as impropriedades desse projeto, mas como ficaria o agora proposto tratamento diferenciado para o diesel e o gás de cozinha? Parece que há algo de errado em tudo isso.