Sarney: A crise continua…

A casa de Sarney em Brasília, em foto de Dida Sampaio, da Agência Estado
A casa de Sarney em Brasília, em foto de Dida Sampaio, da Agência Estado

O jornal O ESTADO DE SÃO PAULO, de hoje, traz uma matéria sobre uma operação imobiliária entre o Banco SAFRA e o Presidente do Senado, José Sarney, que vai exigir novas explicações.

Segundo o jornal, a operação aconteceu em 1997. O banco vendeu uma casa no Lago Sul em Brasília ao Presidente por R$ 400.000,00. No entanto, esta casa não integrou a declaração de bens prestada por ele à Justiça Eleitoral, nem em 1998, nem em 2006. Como numa dessas declarações o Presidente escreveu de próprio punho que aqueles bens correspondiam aos constantes da sua Declaração de Imposto de Renda, o jornal concluiu que houve omissão. A escritura só foi formalizada em 2007, dez anos depois da compra e venda.

Ainda há pouco o presidente Sarney distribuiu a seguinte nota:

“A casa foi comprada em leilão público, realizado em 19 de agosto de 1997, em São Paulo, pelo leiloeiro Ronaldo Milan, conforme anúncio publicado nos jornais em 13 de agosto do mesmo ano. A quitação foi feita em 10 parcelas. Durante esse período, o imóvel permaneceu em domínio de seu antigo proprietário, motivo pelo qual não foi incluído na declaração de Imposto de Renda de 1998 do senador e, por conseqüência, não foi informado à Justiça Eleitoral daquele ano. A partir de 1999, a casa passou a constar na declaração à Receita Federal. O registro do contrato de compra e venda foi lavrado em cartório em 2 de setembro de 1997. Somente a formalização em escritura se realizou em 2007.

Além da Receita Federal, a propriedade consta das declarações entregues pelo senador anualmente ao Tribunal de Contas da União e ao Senado Federal desde 1999.

Por equívoco do contador, em 2006, foi apresentada à Justiça Eleitoral a mesma lista de bens de 1998.

Todos esses esclarecimentos estavam prometidos ao O Estado de S. Paulo para hoje, por envolver pesquisa em documentos de arquivo, mas o jornal preferiu não esperar, embora o assunto seja atemporal”.

A nota revela a existência de dois equívocos. Um é reconhecido explicitamente, qual seja o da omissão da declaração de bens de 2006 entregue à Justiça Eleitoral, e pode não ter relevância.

O outro precisa ser mais bem explicado, podendo esclarecer de vez ou complicar a situação. Se esclarecer, ótimo, o Presidente sai por cima e ganha forças para enfrentar as outras questões. Caso contrário, a crise tende a se agravar.

E qual é o equívoco?

É a omissão na Declaração de Bens constante da Declaração de Imposto de Renda referente ao ano calendário de 1997, exercício de 1998. Isto porque se o contrato de compra e venda foi firmado em 2 de setembro de 1997 e previa o pagamento dos R$ 400.000,00 em dez parcelas, devem ter sido pagas no ano de 1997 quatro parcelas no valor total de R$ 160.000,00. Ora, esse valor pago resultou em um direito a um bem e como tal, inquestionavelmente, teria que estar na Declaração de Bens da Declaração ano calendário 1997, exercício 1998. A aquisição da casa teria que constar na Declaração de Bens. O Presidente poderia optar por dois caminhos: o primeiro registrar a compra pelo valor global de R$ 400.000,00, e indicar a dívida de R$ 240.000,00. O segundo, informar o valor das parcelas pagas no ano, ou seja, R$ 160.000,00.

Sobre como proceder, embora o primeiro caminho também esteja correto, a Receita Federal do Brasil, no seu “Perguntas & Respostas” trata do assunto na pergunta nº 438, a seguir transcrita:

“CONTRATO DE GAVETA

438 – Como declarar as aquisições efetuadas por meio de contrato particular de compra e venda ou contrato de gaveta, quando a aquisição ocorre num determinado ano-calendário e a escritura em cartório em outro ano-calendário?

O contrato particular firmado entre construtora/agente financeiro ou pessoa física e o adquirente é instrumento válido para configurar a aquisição do imóvel, mesmo que o adquirente não tenha desembolsado qualquer quantia. Assim, o adquirente deve informar os dados da aquisição na coluna Discriminação e o valor pago até 31 de dezembro, na coluna do ano-calendário do contrato.”

Não sou chegado a pré-julgamentos, além de ter pelo Presidente Sarney respeito pela sua história na condução do processo de transição, embora não tenha qualquer admiração pelos seus métodos na política do Maranhão e Amapá.

Não serei eu, portanto, a prejulgá-lo.

No caso, podemos estar diante de um simples erro de preenchimento, por desconhecimento de quem fez a declaração, ou, e aí seria grave, de uma omissão deliberada.

Qual é, então, o cerne da questão?

É o seguinte: nos meses de setembro a dezembro de 2007, o Presidente teve rendimentos que cobririam o desembolso dos R$ 160.000,00?

Se tiver, assunto resolvido. O Presidente vai tirar essa preocupação da sua frente.

Agora, se não teve, estará caracterizada a omissão e aí será mais uma dor de cabeça para o Presidente José Sarney porque esse valor teria que ser tributado à luz do art. 55, XIII, do Regulamento do Imposto de Renda/99, a seguir transcrito:

Art. 55. São também tributáveis (Lei nº 4.506, de 1964, art. 26, Lei nº 7.713, de 1988, art. 3º, § 4º, e Lei nº 9.430, de 1996, arts. 24, § 2º, inciso IV, e 70, § 3º, inciso I):

XIII – as quantias correspondentes ao acréscimo patrimonial da pessoa física, apurado mensalmente, quando esse acréscimo não for justificado pelos rendimentos tributáveis, não tributáveis, tributados exclusivamente na fonte ou objeto de tributação definitiva;

Como não foi tributado, imaginem o turbilhão que isso pode provocar se ele não tiver rendimentos suficientes.

Torço para que ele chame alguém do ramo que demonstre de forma indubitável que ele tinha rendimentos que cobriram o seu acréscimo patrimonial.

One thought on “Sarney: A crise continua…

Comments are closed.