Por Demóstenes Torres, no Blog do Noblat:
Nesta Legislatura definimos o marco regulatório do sistema de saneamento do Brasil com a edição da lei 11.445/07 – que estabelece as diretrizes gerais para o setor – e a lei 12.305/10, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Portanto, não se pode mais falar em falta de segurança jurídica aos investimentos públicos e, sobretudo privados, para o serviço essencial.
No entanto, as respostas ainda são lentas e basta mirar o ritmo das inversões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para se mensurar que o País está muito distante de alcançar a universalização do serviço. Conforme dados de 2008 do Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento (SNIS) do Ministério das Cidades, apenas 43,2% da população têm acesso à coleta de esgoto.
A se considerar os dados demográficos do período nada menos do que 108 milhões de brasileiros estavam excluídos do atendimento ao serviço básico. Os números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), divulgadas em setembro último, demonstraram que em 2009 caiu em relação ao ano anterior o percentual de domicílios atendidos com coleta de esgoto ou fossa séptica, o que implica dizer que o Brasil não consegue expandir o sistema nem para acompanhar o crescimento populacional.
Em novembro de 2007, a Fundação Getúlio Vargas e o Instituto Trata Brasil divulgaram interessante estudo que projetou, caso se mantivesse o nível de investimentos dos 14 anos anteriores, que somente em 2122, no aniversário dos 300 anos da independência, o Brasil alcançaria a universalização do serviço de saneamento. Vejam que os países europeus resolveram o problema no século 19 e só em 1971 tivemos o primeiro plano nacional para o setor.
O mesmo País que conseguiu competência tecnológica e empresarial para desenvolver programas avançados de energia renovável e de extração de petróleo em águas profundas, não é capaz de coletar os efluentes domésticos, a exemplo do que há de pior no terceiro mundo. E a conta do hospital só cresce.
Documento do Trata Brasil relata que o País economizaria cerca de R$ 745 milhões despendidos em internações no Sistema Único de Saúde causadas por infecções intestinais caso houvesse a cobertura de esgoto em todos os domicílios.
Tecnicamente, caso as previsões de aporte dos R$ 40 bilhões reservados para o primeiro período do programa (2007-2010) tivessem se confirmado precisaríamos de sete PACs para alcançar o objetivo de atender toda a população com abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto. Mas no Brasil sempre há enorme diferença entre o planejamento e a execução das iniciativas estatais.
Para se ter noção do abismo entre a intenção e o gesto, basta citar que em março deste ano, quando o governo lançou o PAC 2 e revigorou a promessa de investir também R$ 40 bilhões no próximo quadriênio no setor, haviam sido concluídas apenas 11% das obras previstas. Nos três primeiros anos do programa, o total efetivamente aplicado equivaleu a 2% dos investimentos programados. É verdade que o atual governo mostrou disposição de revigorar o setor de saneamento e recuperar o tempo das décadas de 1980 e 1990 perdidas. O marco regulatório definido comprova a boa intenção, mas ficou nisso.
O Brasil tem de entender que está superado o discurso de que o saneamento está fora de prioridade por não ser obra aparente. Saneamento significa primordialmente meio eficaz de redução da pobreza e providência essencial de qualquer política ambiental. São sabidos os ganhos diretos que o serviço traz para a melhoria da condição de saúde da população, com reflexos positivos na produtividade no trabalho, no aprendizado na escola, no incremento da atividade turística e na valorização imobiliária.
Definido o marco regulatório para o setor, o próximo passo é atrair os investimentos da iniciativa privada, sem os quais o Brasil não conseguirá superar o atraso herdado do século 20.
Demóstenes Torres é procurador de Justiça e senador (DEM-GO)