Samuel Benchimol: O “Estatuto do Amazônida”, 18 anos depois

Samuel Benchimol, em 1989, ao lado de Bernardo Cabral
Samuel Benchimol, em 1989, ao lado de Bernardo Cabral

O professor Samuel Benchimol, uma das maiores autoridades sobre Amazônia, quando da realização da ECO-92, escreveu o “ESTATUTO DO AMAZÔNIDA”. Dezoito anos depois, ele já está em outro plano mas o texto é bem atual e merece de todos nós uma reflexão. Reproduzo abaixo:

ESTATUTO DO AMAZÔNIDA

Considerando a importância da Amazônia Brasileira pela sua grandeza continental, peculiaridade geo-regional e extensão de sua bacia hidrográfica;
Pensando na extrema variedade e complexidade dos seus ecossistemas florestais e na grande biodiversidade de suas espécies;
Enfatizando o rico potencial de suas várzeas, igapós, terras firmes, campos e cerrados e os seus complexos ecossistemas florestais;
Relembrando o enorme potencial de seu sistema fluvial para aproveitamento energético, de transporte e navegação;
Recordando a abundancia e variedade de seus recursos minerais, sua importância para a metalurgia e sua contribuição para a balança de pagamentos do país;
Examinando as recentes descobertas de hidrocarbonetos, petróleo e gás natural e suas grandes perspectivas de seu aproveitamento petroquímico e energético;
Registrando as conquistas já alcançadas no campo industrial, pela criação de pólos avançados e produção de bens e serviços, no campo agrícola com as culturas de subsistência e matérias-primas e nas áreas próprias de criação da pecuária bovina, bufalina e criatório em geral;
Rememorando o potencial de seus inúmeros pesqueiros de água doce, salobra e salgada e a riqueza que essa diversidade representa para a psicultura e para a produção de alimentos;
Analisando a importância das populações nativas de índios, caboclos e nordestinos, que constituem a base de nossa formação histórica e humana;
Observando a riqueza cultural dessa pluralidade cultural e étnica, cuja integridade devemos preservar por meio da manutenção de sua identidade e integração à sociedade nacional;
Auscultando a necessidade da educação em todos os níveis, da qualificação profissional, universitária e dos institutos de ciência, pesquisa, tecnologia e extensão;
Verificando que a cosmo visão da Amazônia Continental mostra que ela representa a vigésima parte da superfície terrestre; um quinto das disponibilidades mundiais de água doce; um terço das reservas mundiais de florestas latifoliadas; um décimo do biota universal; um quarto do volume mundial de carbono armazenado na sua biomassa vegetal; mais da metade do potencial hidrelétrico e gás natural do Brasil e dos minérios de ferro, bauxita, manganês, cassiterita, caulim, ouro, potássio e outros; quatro décimos da superfície da América do Sul; três quintos do Brasil e apenas quatro milésimos da população mundial.
Levando em conta essa realidade e amparado em toda uma vida consagrada ao estudo deste pedaço do Brasil, lanço aqui o Estatuto do Amazônida:

Todo Amazônida tem direito:

Ao pleno uso, gozo e fruição dos seus recursos naturais existentes na área, desde que o faça de modo não destrutivo. Fica estabelecido o seu direito à subsistência, liberdade de escolha, livre iniciativa, trabalho produtivo e justiça social, e resguardada a sobrevivência das gerações futuras e ao convívio harmonioso com a natureza;
A uma existência digna livre de quaisquer constrangimentos, injustiças e outras formas coercitivas que limitem o exercício de seus direitos de cidadania;
De usufruir os produtos da floresta, cuja venda, a preços justos, lhe permita um padrão de vida digno;
De utilizar os recursos pesqueiros de forma auto-sustentada, para garantir a alimentação de sua família, a elevação de seu padrão de vida e o exercício de atividade empresarial;
Nas zonas apropriadas, de se beneficiar dos seus bens minerais existentes na região, dos recursos hídricos para transporte e geração de energia elétrica, do uso de terras para fins agrícolas e para formação de campos de criação;

Todo Amazônida tem o dever:

De proteger os recursos naturais florestais, hídricos e terrestres de forma a garantir o desenvolvimento econômico e social equilibrado, conservando-os e preservando-os para as gerações atuais e futuras;
De resguardar as florestas naturais, parques nacionais, estações ecológicas, reservas biológicas, santuários da vida silvestres, monumentos cênicos e sítios arqueológicos;
De exigir proteção às populações indígenas, assegurando-lhes a demarcação e posse de suas terras e manutenção de sua identidade cultural;
De lutar pelos seus direitos à saúde, educação, transporte, obras de infra-estrutura que permitam o desenvolvimento individual e de suas comunidades;
De reagir contra toda e qualquer forma de intervenção internacional que implique o constrangimento à soberania brasileira, sem embargo ao reconhecimento à cooperação internacional legítima e bem intencionada, para promoção de defesa do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável da Amazônia.

2 thoughts on “Samuel Benchimol: O “Estatuto do Amazônida”, 18 anos depois

  1. O professor Benchimol, através de seus escritos, deixou para as próximas gerações a prova de que educação, conhecimento, talento e trabalho quando direcionados para o bem comum são capazes de criar cidadãos que são exemplos não só para a sociedade em que vive mas para toda a humanidade. Samuel Benchimol será lembrado daqui a 200 anos pois se revela a cada dia como um veradadeiro oráculo amazônico.

  2. Um HOMEM fora de sério.
    Um Deus que a amazônia perdeu, na presença física, mas o eternizou com seus pensamentos.
    Um homem que deve se ter sempre como referencia quando se falar em Amazônia.
    Sempre a frente de seu tempo. Construiu a justiça, semeou bosn frutos, defendeu a amazonia, virou, mexeu!!!!!
    Sua biografia deveria ser estudada, obrigatoriamente, em qualquer graduação, pelos aspectos, filosóficos, sociológicos, estatísticos, neméricos, científicos e humanos.
    Na moratória da amazonia, sua precisão é surpreendente!!!
    Deixou um legado que deve ser sempre aperfeiçoado, atualizado, em qualquer conferencia, congressos e etc, sobre a Amazonia.
    Louvado seja Samuel Benchimol, pai defensor da Amazonia.

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