Vemos de novo o velho filme das enchentes, com a morte de centenas de pessoas, vítimas de problemas que se repetem todos os anos: enchentes, deslizamentos, disseminação de doenças, desmoronamento de casas, trânsito, enfim, uma verdadeira tragédia.
O Poder Público tem falhado no enfrentamento dessas questões. Em São Paulo, por exemplo, no ano passado, quando dezenas de pessoas morreram, a culpa foi jogada nas chuvas. Mas o prefeito, Gilberto Kassab, havia investido irrisórios 8% do que aplicara em propaganda no ano anterior. Em 2011, Kassab avaliou que “os piscinões corresponderam à expectativa” e que “chove cada vez mais”. Mas a prefeitura bateu recorde de arrecadação em 2010 (20,4% de alta, R$ 835 milhões a mais só de IPTU), e o investido em ações antienchentes foi menor que o previsto no Orçamento. Muitos projetos ficaram no papel.
A razão maior da tragédia está na má escolha de prioridade e na falta de planejamento, além da desarticulação entre as prefeituras vizinhas e ausência de coordenação com o governo estadual. Inegável a responsabilidade do Poder Público, mas a magnitude da tragédia —que se abate especialmente os mais pobres— exige que se fuja da tentação fácil de apontar culpados.
É preciso uma ação conjunta das autoridades. Urge socorrer e assistir os cidadãos afetados pelas chuvas torrenciais. A liberação de R$ 780 milhões pela presidenta, Dilma Rousseff, para os Estados compõe esse esforço emergencial. Há ainda as verbas do PAC 2 para obras de contenção de encostas.
É determinante as prefeituras traçarem mapas de risco, com planos de retirada das pessoas e deslocamento para outras áreas, além de detalhamento de como agir em alagamentos. São dados que permitirão munir o país com equipes nacionais de defesa civil para atuar —inclusive, em outras emergências.
Paralelamente, é imperativo limitar o agravamento do problema. O geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos, em artigo na Folha de S.Paulo (10/01), apontou a importância de se mudar o perfil de urbanização, com regulação técnica do crescimento das cidades.
Na perspectiva mais estrutural, a saída é construir piscinões, fazer a limpeza constante de córregos, rios e piscinões, dotar as cidades da concepção de captação de água em unidades menores —para aliviar os reservatórios principais— e promover o desassoreamento de rios.
É fundamental ainda tirar as famílias que moram em áreas de risco, via programas habitacionais —quem sabe dedicar uma parte do “Minha Casa, Minha Vida” para essas pessoas?
Finalmente, é preciso ampliar as áreas verdes urbanas. Não podemos mais seguir com a impermeabilização do solo —cabe até pensarmos em um mínimo por imóvel, com taxação dos que não atenderem à exigência e destinação do dinheiro a projetos antienchentes. E estimular programas de educação da população e das empresas sobre o tratamento adequado de lixo.
O tamanho da catástrofe mostra que a tarefa não é simples, mas trabalhando com afinco e de forma planejada é possível conter o agravamento do problema e começar a superá-lo.
José Dirceu, 64, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT