Com habilidade e clareza de posicionamento, como membro nato na composição do Conselho de Administração da Suframa, o presidente da FIEAM, Antônio Silva foi ao ponto: cobrou especial atenção do representante do MDIC, o secretário-executivo, Ricardo Schaefer, para as demandas salariais dos servidores da Suframa e da reposição dos cargos e funções esvaziadas. Os servidores têm uma depreciação histórica nos vencimentos e falta gente e instrumento pra tocar na orquestra. De quebra, indagou sobre a liberação dos PPBs. O questionamento se insere no movimento maior de impaciência e revolta de empresas que esperam 6, 12, 24, 36… meses, por uma autorização, com data pré-fixada pelo Conselho da autarquia, que confere as isenções constitucionais. Este tem sido o maior entrave federal – à parte os gargalos de infraestrutura. Apesar dos dados otimistas da Suframa de faturamento em real, na aferição que utiliza o dólar, há um visível encolhimento do desempenho do PIM. É absurdo deixar investimentos embargados na gaveta sob a alegação de prejuízos virtuais em outras regiões do país. É como se fosse um jogo de futebol, em que, na volta do intervalo, o juiz mudou as regras e não avisou aos interessados. São episódios que autorizariam a reescrever uma versão baré do Processo de Franz Kafka, o clássico da literatura tcheca que descreve as situações de absurdo existencial e social em limites insuspeitados. Com uma composicao que inclui os ministerios de Desenvolvimento e de C&T e Inovação, além da representacao institucional dos atores envolvidos, o CAS é uma esquizofrenia institucional, com personalidades ambíguas que se degladiam contra o interesse de quem as mantém.
O caso Adidas é emblemático, e remete a uma das maiores fábricas de material esportivo do mundo, que optou por iniciar suas atividades em Manaus, um forte apelo ambiental, e que fica no Brasil, o país do futebol. A empresa teve que instalar na Argentina sua fábrica, por decisão/embromação kafkiana dos burocratas de Brasília. Ninguém cogitou consultar as entidades locais para saber vantagens ou eventuais prejuízos concorrenciais. Nem levou em conta a contrapartida que exigisse – formalmente – a paulatina adoção dos fatores e elementos da biodiversidade e diversidade étnica e cultural milenar da floresta como a empresa sugeriu. E que, por evidentes razões de mercado, pretendia fazer. O alerta da FIEAM revela uma inquietação em relação às regras do jogo. É complicado investir numa economia, marcada pela volatilidade d e tantos fatores, à mercê de burocratas distraídos. Este é um cenário que precisa ser enfrentado e que se deve abrir uma discussão pública a respeito. Os descaminhos são decorrência direta e proporcional ao mandonismo do gabinete.
A questão é crucial e definitiva. E tudo sugere que o novo secretário-executivo do MDIC está disposto, pelo menos, a escutar. É um embaraço perverso sobre o qual é imperativo conversar, argumentar, regulamentar e esclarecer, em definitivo, e no melhor dos mundos, no contexto de construção de uma politica industrial. Topamos a parada desde quando não signifique travar o modelo, afugentar investimentos em nome de abstrações explícitas ou barganhas sombrias. A especulação em cima de eventuais setores de canibalização de investidores precisa ser debatida sobre os registros econômicos da História sob o signo de Macunaíma. Com os acertos políticos da União antropofágica, a produção de açúcar na Amazônia, além da borracha e do cacau, foi canibalizada por outras regiões do p aís, exatamente pela ausência crônica de uma definição combinada de segmentação industrial na perspectiva da redução das desigualdades regionais. No caso dos embargos autoritários do PPB, o bom senso sugere que é melhor verticalizar – com as exigências de nacionalização de componentes – do que não publicar, condenar ao estado de expectativa e suspensão investidores que optaram compartilhar este desafio de investir e desenvolver no meio da floresta comprometidos com sua conservação e sustentabilidade. Com todo respeito às alianças politicas federais… esta relação de dependência já esgotou suas prodigalidades.
A questão do Centro de Biotecnologia da Amazônia – pra ilustrar a psicopatologia atávica – foi novamente pautada, como ocorre há 13 anos, e a promessa da iminente definição do modelo de gestão, que “estava saindo do forno” no dia 19 de agosto último, deverá ser objeto de uma nova consulta. Comissão técnica virá de Brasília para colher expectativas locais de sua estruturação institucional para prospecção de negócios e resultados. Um filme cuja reprise já ultrapassou todos os limites de paciência na expectativa de um final, se não feliz, decente e coerente com o interesse local. Vem à mente o impacto dessa enrolação sobre todas as propostas e oportunidades de negócios que foram alimentados, estimulados há mais de uma década, e que aguardam o desfecho da festa com a definição de um CNPJ… A expectativa de fazer da relação entre o chip da inovação e o cipó deste bioma infinito, uma caldeirada de negócios, fica para depois, montada mais uma comissão, para resolver aquilo que já tem solução e definição natural.
Tudo sugere, porém, que a Suframa descartou convidar a Embrapa para ajudar a equacionar o enigma, com sua bagagem de 40 anos no setor. Ao longo dos últimos meses esta foi uma solução a mais sensata e disponível – que envolveu o apoio de mais de três dezenas de instituições locais – para fazer andar na direção dos bionegócios este empreendimento que já consumiu mais de R$ 120 milhões das empresas instaladas na ZFM. A Suframa não tem gente, hoje, para atender as demandas formais das exigências que a Lei e suas variações absurdas impõem. Ao que consta, em seu quadro defasado de material humano, não há especialistas em biotecnologia. Entre os que lá atuam – a opinião pública ficou sabendo nesta quinta-feira – ganham salários ridículos, menores que de muitas categorias de quem não se exige qualificação ou experiência. E neste vai e vem da esquizofrenia federal, fica difícil ouvir e saber , meu caro Thomaz, que pito toca o CAS?
(*) Alfredo é filósofo e ensaísta