Só os fanáticos não têm dúvidas. Esta frase, se não é de Nelson Rodrigues, poderia ser. E, na política, só os covardes, acrescento, não têm convicções. Mas, entre a dúvida e a convicção, entre a tibieza e o sectarismo, descortina-se um amplo espaço para que floresçam a reflexão, a busca do conhecimento e o exercício da inventividade.
Relembro esse filósofo do cotidiano que foi Nelson Rodrigues, cético de carteirinha, não para me resignar ao imobilismo crônico que parece caracterizar a atual governança do país, mas, pelo contrário, para reagir à miudeza de um varejo político aprisionado na acomodação e voltado para o imediatismo. Ao grau zero de criatividade do continuísmo, cabe à oposição contrapor a responsabilidade cívica de pensar, ousar, debater, divergir e convergir.
Realizamos, há uma semana, no Rio, o seminário “A Nova Agenda: Desafios e Oportunidades”, promovido pelo Instituto Teotônio Vilela, sob a coordenação dos economistas Elena Landau e Edmar Bacha.
O ITV é uma entidade partidária ligada ao PSDB. O seminário não o era. Quem teve a oportunidade de assisti-lo, de percorrer o repertório de propostas e ideias apresentadas por Pérsio Arida, Gustavo Franco, Armínio Fraga e Simon Schwartzman, entre muitos outros, compreendeu claramente que o ali proposto extrapola uma mera agenda de alternativa de poder.
Foi encerrado com brilhantismo por um Fernando Henrique renovado e provocativo, que não nos deixou esquecer que a oposição precisa vocalizar -“Ou fala ou morre”, sentenciou com razão.
Afinal, há nove anos o Brasil é coadjuvante do seu próprio crescimento. Surfamos na onda da prosperidade mundial enquanto deu. Agora aguardamos, em perplexidade entorpecida, que a tormenta internacional se dissipe.
Ao governo, absorvido pelo cotidiano gerenciamento da governabilidade, falta o combustível da energia política capaz de conduzir as reformas estruturais -na economia, na administração pública, na educação, na infraestrutura-que fariam o Brasil mudar de patamar como nação.
Ouvimos formulações de alto alcance estratégico e outras de simplicidade desconcertante. Por exemplo, de como modernizar toda a malha ferroviária em operação no país com o dinheiro que está reservado para o inacreditável trem-bala; de como aumentar a remuneração da caderneta de poupança e do FGTS, impactando positivamente a poupança interna do país.
Refletiu-se sobre novos caminhos para superação da baixa qualidade da educação e saúde oferecidas nas redes públicas. Muitas ideias surgiram. Outras certamente virão. Que elas possam inspirar o novo e necessário debate que o Brasil e os brasileiros merecem.