Para Jobs, é melhor ser pirata do que entrar na marinha

Por Joaquim Falcão

Na biografia de Steve Jobs, best seller internacional, existem duas passagens que todos que se preocupam com questões de direito autoral devem necessariamente ler.

Diz, em certo momento, textualmente, Walter Isaacson, biógrafo oficial de Jobs, (Steve Jobs. Ed.Companhia das Letras, 2011) na página 161,: “Outra máxima de Jobs no retiro de janeiro foi: ‘É melhor ser pirata do que entrar na Marinha’. E ele queria instilar um espirito de rebeldia nos integrantes da equipe, para que se comportassem como valentões orgulhosos do que faziam, mas também dispostos a roubar dos outros.”

Como se não bastasse, numa áspera discussão com Bill Gates sobre o uso de um software gráfico, Jobs acusou Gates de estar pilhando ele, relata Isaacson, na página 196. “Você está nos pilhando, vociferou. Confiei em você, e agora você está nos roubando!”

Gates devolveu “Bem, Steve, penso que existe mais de uma maneira de ver a coisa. Penso que é assim: nós dois tínhamos esse vizinho rico chamado Xerox, invadi a casa dele para roubar o aparelho de tevê e descobri que você já tinha roubado”.

Ou seja, o software em disputa, não pertencia nem a Gates nem a Jobs. Mas a Xerox.

É dificil crer que a fortuna de dois dos homens mais ricos do mundo tenha origem justamente na atitude, e ao que consta, na prática da pirataria tanto combatida pelos próprios Estados Unidos. Será que houve algum exagero do autor? Mas não foi o próprio Jobs que encomendou esta biografia e a deixou como um legado de sua vida?

De qualquer modo, toda autoridade responsável pela política, legislação e implementação de direito autoral, diplomatas, magistrados, representantes nas organizações internacionais, e a própria mídia deveriam ler e refletir sobre o ensinamento destas passagens.

Durante anos, a indústria fonográfica e videográfica americana pressionou o governo brasileiro, não somente pela mídia, mas pelas próprias autoridades americanas, para combater a pirataria de cds e vídeos no Brasil. Chegaram a comparar um jovem que comprasse um dvd pirtara a um traficante de drogas.

Hoje se sabe que a decadência destas indústrias deveu-se a sua própria obsolência tecnológica. Não souberam acompanhar o desenvolvimento da tecnologia de informação nem formular modelos de negócios mais modernos.

Ao exigir repressão policial e do ministério público e criminalização, no fundo estavam transferindo para o governo brasileiro os custos de sua própria obsolescência. Não adiantou. A indústria fonográfica quase acaba. As lojas de cds e vídeos, também. Com ou sem repressão.

Na medida em que a internet cria modelos de negócios que viabilizam baixar músicas legalmente, pouco a pouco o consumidor vai se adaptando e, com preços adequados, surge um promissor mercado, mas não mais controlado por estas indústrias. Mas pelas empresas de informação.

Este é um típico exemplo do “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”. O Brasil tem que ter sua própria política de proteção ao direito autoral com uma combinação de estímulo à criação e inovação, e acesso da maioria da população aos bens culturais e científicos.

O canibalismo recôndito que transparece na biografia de Jobs, não pode servir de exemplo, nem para indivíduos nem para países.

Silvio Meira, com certeza o maior cientista de tecnologia da informação do Brasil, afirma que Gates vai entrar para a história muito mais por vir a ser o homem que criando a sua fundação, acabou com a malária no mundo. Mas e Jobs?

Sempre foi contra a filantropia e a responsabilidade social dos empresários. Será que existe uma correlação necessária entre suas práticas empresarias e seu sucesso como empreendedor? Este tipo de capitalismo ja é o passado, ou ainda será o futuro?

Comentário meu: O trecho em que o autor aborda a questão dos CDs e DVDs,  destacado em azul, deve servir para uma reflexão sobre o futuro do nosso Pólo Industrial.