O Tribunal de Contas da União não pode deixar de aplicar leis que entenda inconstitucionais, decidiu o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, em mandado de segurança. Segundo ele, embora cortes de contas estejam autorizadas a “apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder público” pela Súmula 347 do STF, a “subsistência” do verbete, “obviamente, ficou comprometida” com a promulgação da Constituição, em 1988. A súmula é de 1963.
A decisão, monocrática, é de dezembro de 2017. Depois, portanto, que o Plenário do Supremo autorizou “órgãos administrativos autônomos” a deixar de aplicar leis que avalie inconstitucionais. A decisão foi tomada em dezembro de 2016, na última sessão do ano, e o acórdão foi publicado em dezembro de 2017.
Na decisão, prevaleceu a tese da relatora, ministra Cármen Lúcia, para quem deixar de aplicar uma norma por entendê-la inconstitucional é diferente de declará-la inconstitucional. Órgãos de controle administrativo, conforme a ministra, têm o “poder implicitamente atribuído” de adotar essa prática. Entre esses órgãos, ela citou o Conselho Nacional de Justiça, o do Ministério Público e o Tribunal de Contas da União.
Para justificar sua decisão no mandado de segurança, Alexandre de Moraes cita tese defendida por ele no livro Direito Constitucional. “O exercício dessa competência jurisdicional pelo CNJ acarretaria triplo desrespeito ao texto maior, atentando tanto contra o Poder Legislativo, quanto contra as próprias competências jurisdicionais do Judiciário e as competências privativas de nossa Corte Suprema”, diz a obra, na página 563.
O ministro também cita diversos precedentes do STF, todos em mandado de segurança, todos anteriores à decisão do Plenário em que venceu a tese da ministra Cármen.
Bônus ineficientes
A decisão do ministro também acrescenta mais um ingrediente na briga em torno do “bônus de eficiência” pago a auditores fiscais. A verba foi criada em 2016 por meio de medida provisória para evitar a concessão de aumento salarial à categoria. É paga conforme as multas aplicadas pelos auditores aos contribuintes autuados.
O bônus vem sendo bastante criticado por especialistas por ter pouco a ver com eficiência, e muito com arrecadação. A decisão do TCU que motivou o mandado de segurança julgado pelo ministro Alexandre foi tomada em setembro e proibiu o pagamento da verba aos servidores inativos.
Pela regulamentação do bônus de eficiência, todos os auditores fiscais devem recebê-lo de acordo com o alcance das metas globais de produtividade da Receita Federal. E aí ele é pago a todos os auditores, conforme as peculiaridades de cada carreira.
O TCU proibiu o pagamento aos servidores inativos (aposentados ou afastados) por entendê-lo inconstitucional. O principal motivo é a não inclusão do desconto da contribuição para a previdência dos servidores no pagamento da verba. Para Alexandre de Moraes, o TCU não poderia ter deixado de aplicar a lei, já que não pode fazer controle de constitucionalidade.
A corte de contas não vem sendo simpática ao pagamento do bônus. Em relatório publicado em setembro de 2017, o TCU disse que o trabalho da Receita é ineficiente. Chegou a essa conclusão depois de ver que, mesmo diante de créditos de R$ 205 bilhões e uma dívida ativa de R$ 1,6 trilhão, o Fisco apresentou os piores resultados dos últimos três anos.
De acordo com o TCU, 90% dos servidores da Receita entrevistados contaram não ter conseguido aumentar sua capacidade de produção, apesar do pagamento do bônus. Ou seja, as fiscalizações vêm caindo, segundo o relatório da corte de contas.
A liminar foi concedida a pedido do sindicato dos auditores da Receita Federal, o Sindireceita, representado pelo advogado Ibaneis Rocha.
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MS 35.410