Por Ribamar Bessa:
Sábado de Aleluia. Tradicional malhação do Judas. No bairro de Aparecida, em Manaus, o boneco pendurado no poste trazia o testamento no bolso, escrito pelo Edilson, o gaguinho, com estrofes sem um só verso de pé-quebrado. O gênio da poesia popular, irreverente e atrevido, resumia intrigas políticas e fofocas do bairro. Não poupava ninguém, nem ele mesmo.
Depois da leitura pública do testamento e da queima de Judas, iniciava a cruel cerimônia do “Serra Velho”. Na madrugada, jovens com serrotes, pedaços de pau e latas faziam barulho infernal na frente da casa do morador mais idoso – só respeitavam aqueles doentes – quando então cantavam:
– As caveiras do outro mundo / vieram lhe dizer-êêê / que agora neste ano / você vai morrer-êêê.
Depois gritavam em coro:
– Encomende a alma a Deus, porque seu corpo já não vale nada.
Alguns velhos entendiam como gozação e até apareciam na janela para um dedo de prosa. Outros se irritavam, como dona Maria Rosa, que jogava o conteúdo de um penico sobre as “aves agourentas”. Psicografado pelo Edilson, apresento-lhe aqui o testamento do Judas de 2017.
01.Há dois mil anos me malham
Muda o mundo, pra mim nada Chega o sábado de Aleluia E me enchem de porrada.
03.Ao Trump bundão eu deixo O muro de Jericó E a espada de Herodes Pra enfiar no fiofó;
05.Ao “Índio” Eunício deixo A Funai, só de pirraça. Que ela poupe os índios, Mas acabe com tua raça.
07.Ao Rodrigo, o “Botafogo”, Vil sucessor do Cunha Deixo o dedão do Temer Pra rasgar o tu com a unha.
09. Aos da lista do Fachin Dou um penetrante créu Com delação premiada Lego o atestado de réu.
11. Ao Eliseu Padilha, o “Primo”, Amigo de Temer, de FHC, Deixo-lhe balcão de negócios E da Odebrecht o guichê.
13. Ao Jucá que a falcatrua Fez sair da pindaíba Deixo a suruba com Cunha Na prisão de Curitiba
15. As trinta moedas de prata E o caroço desse angu Deixo pro Sérgio Cabral Curtir no spa de Bangu.
17. Ao Moro, o vaza a jato, pra Rede Globo vaza veloz Lego tua foto com Aécio Tão promíscua e tão atroz.
19. Para Alexandre de Moraes O plagiador kinder-ovo Deixo o evangelho de Lucas Pra copiar tudo de novo.
21. Que o pato da FIESP fique Com os seis milhões do Skaf Ele enganou os paneleiros? Que da prisão não escape.
23. Deixo a Arena Amazônia, Ao senador Braga, o Dudu Com a superfatura exposta Que ele vá tomar na rima.
25. À Vanessa e ao Eron Que estão na lista do Fachin Deixo um capital polpudo Em Moscou ou em Pequim.
27.Ola-lá, olha o boi que te dá? Eu tirei da algibeira A propina do Caixa 2 É para o Cabo Pereira.
29. Ao prefeito Artur Neto Deixo um resto de decoro Vai aposentar o kimono Depois de se ver com o Moro.
31 Ih, já ia me esquecendo Do sócio do Cabral, o Pezão Pelo calote na UERJ Deixo-lhe sua cassação.
33.Aos paneleiros que pouparam O Barrabás, contumaz ladrão. Deixo meu arrependimento Para que gritem: Fora Poltrão.
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02.Mas antes de me ferrarem
E morrer mais uma vez Eis aqui o inventário Do que eu lego pra vocês.
04.A ti, Temer, legar-te-ei Minha corda de enforcado Pendurar-te-ás na figueira Seu traíra desgraçado.
06.O Renán é quem herda Um implante de pentelho, Feito com verbas do Senado, Com ele eu me aconselho.
08. O Cunha preso não está Só é usufrutuário da cela. Dou-lhe caixão de defunto Pra quando esticar a canela.
10.Oh ministros e parlamentares! Deixo-lhes o meu Caixa Dois Com propina milionária Sois ladrões, ora pois pois.
12. A Odebrecht atirou O pau no gato te-otó Acertou Moreira Franco O Angorá do quiproquó.
14. O Lula “amigo” herda, Um tríplex em Guarujá, Um sítio em Atibaia Até tu comeu o jabá?
16. Ao outro Sérgio, o Cortes, Dançou em Paris no inverno. Deixo a Fatura Exposta Pra bailar lá no inferno.
18. Ao “paladino da honradez” Ao Collor das Alterosas Ao Aécio, tucano e corvo, Deixo propinas fuderosas.
20. Gilmar Mendes a ti deixo Exame de coproscopia Da tua diarreia verbal O Janot tem merdofobia.
22. Anastasia, tu finges ser Um santinho do pau ôco Encheste a burra de grana Taquiprati o meu cotôco.
24. Lego ao senador Omar Aziz A ponte superfaturada, viu? Com a propina embolsada Vá pra ponte que se partiu.
26. A ti José Melo Merenda, Estadista de igarapé Deixo as verbas desviadas Para ser cassado pelo TSE.
28. Paguei, paguei, paguei Paguei torno a pagar. Ao Alfredo Nascimento Ao Dudu e ao Omar.
30.Criticou o Artur na Lava Jato Marcelo Ramos, o velho novo Pra lembrar o amigo Buchada, Deixo-lhe catuaba com ovo.
32. Ao José Mayer assediador Que diz estar arrependido Deixo-lhe Maria Madalena, Para testar se é bandido.
34 Lá onde perdi as botas Lego ao povo brasileiro A desconfiança nesses pulhas A esperança do testamenteiro.
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