O número de deputados e a PEC da discórdia

*Maurício Romão

“Quando você elimina o impossível, o que resta, por mais improvável que pareça, só pode ser a verdade.” – Arthur Conan Doyle.

Em virtude das atualizações populacionais ensejadas pelo Censo de 2010, o Legislativo amazonense reivindicou junto ao TSE – com grande possibilidade de acatamento – aumento de duas vagas de deputado federal.

Como o número total de deputados na Câmara Baixa é fixado em 513, caso o pleito seja acolhido haverá aumento de dez vagas nos estados cujas bancadas estão sub-representadas, relativamente às suas populações, e perdas correspondentes em outros, cujas bancadas, ao contrário, estão sobre-representadadas.

Os estados com representação parlamentar diminuída terão, naturalmente, interesse em reverter a decisão da Corte Eleitoral. Com baixa probabilidade de êxito no STF, tudo indica que o problema deverá desaguar no Legislativo Federal.

Na Câmara, exigir-se-á uma PEC para mudar o arcabouço legal que rege a determinação da representação parlamentar dos estados – art. 45, § 1º da Carta Magna (estipula proporcionalidades e limites máximo e mínimo de deputados por estado) e Lei Complementar nº 78 (fixa em 513 o total de deputados).

Naquela Casa, todavia, suas excelências vão deparar-se com uma forte restrição: só existe uma única solução para acomodar o acréscimo de dez deputados em alguns estados, sem diminuir a mesma quantidade em outros: aumentar o número total de deputados da Câmara para 523.

Tal escapatória, entretanto, acarretará forte reação da sociedade, dada a imagem extremamente negativa de que padece o Legislativo. Ademais, passa-se a ideia de que nas próximas legislaturas vai acontecer a mesma coisa, já que haverá atualização populacional a cada ano antes das eleições.

O fato é que qualquer outra solução envolve recomposição numérica de bancadas, com perdas e ganhos, incluindo a reversão da decisão do TSE para voltar à configuração vigente, mantida constante desde 1994.

É impossível elaborar uma saída que não altere*: (a) o limite mínimo, ou (b) o limite máximo, ou (c) os dois simultaneamente ou, ainda, embora preservados os limites, (d) alguma forma de proporcionalidade no binômio população-representação.

Por exemplo, a sugestão de se suprimir os limites mínimo (oito) e máximo (70) de deputados e de se adotar a proporcionalidade geral, buscando-se o princípio democrático de “um homem, um voto”, é inviável: geraria perda de representação em 19 estados e haveria um aumento da bancada de São Paulo, de 70 para 111 deputados.

Imagine-se, ainda neste contexto, que se pretenda evitar o peso excessivo de São Paulo, impondo-se o limite máximo à sua bancada e adotando-se proporcionalidade geral no restante dos estados. Esta alternativa tem um sério empecilho: os cinco estados da região Norte, beneficiados pelo limite mínimo constitucional, perderiam 27 parlamentares em conjunto.

Suponha-se outra possibilidade, a de distribuir perdas de vagas de forma igualitária e menos traumática para alguns estados atingidos pela medida do TSE. Estatui-se que as unidades da federação que perderiam e ganhariam vagas por conta da atualização populacional continuassem a fazê-lo, só que não mais que uma vaga por estado.

Se assim fosse, sete estados perderiam um parlamentar cada e apenas seis se beneficiariam, gerando a necessidade de alocar uma vaga arbitrariamente para algum estado.

Uma variante desta última possibilidade seria a manutenção do teto máximo de 70 parlamentares, porém com modificações no limite mínimo, que passaria a ser de sete deputados, ao invés dos atuais oito, combinado com o requerimento de que nenhum estado ganhasse mais que uma vaga.

Nesta variante, oito estados ficariam com menos um deputado cada e apenas seis ganhariam um a mais, restando, assim, duas vagas. Neste caso, todavia, poder-se-ia reduzir o total de deputados para 511, um número ímpar.

Mesmo a tentativa de instituir que o nº de deputados por estado seja determinado pelo eleitorado e não pela população, conforme sugestão de deputado piauiense, resulta infrutífera. Com efeito, a mudança deixa a configuração de bancadas muito semelhante à que deriva da provável decisão do TSE.

Enfim, há inúmeras alternativas dentro do escopo da manutenção do total geral de deputados em 513. Entretanto, todas elas geram perda de parlamentares em alguns estados.

*Economista e cientista político.