Do CONSULTOR JURÍDICO por Dalton Cesar Cordeiro de Miranda
A humanidade respira novos ares, uma era de geração e troca de informações nunca d’antes verificada. Creditamos tal experiência ao diário e constante desenvolvimento tecnológico desenvolvido na área de informatização.
Hoje, com celulares smartphones, tablets e e-readers, cada vez mais pessoas têm acesso remoto a dados relevantes e notícias em tempo real, em qualquer local e independentemente da atividade que estejam realizando. Livros, jornais, periódicos e outros produtos semelhantes são disponibilizados a um número infinito de usuários de forma gratuita ou onerosa.
Não é só. A tecnologia de informação não restringiu seu avanço ao setor privado, pois também vem sendo incorporada e aplicada em larga escala pelo setor público. Exemplos não faltam, e citamos: e-gov, agendamento eletrônico previdenciário, consultas eletrônicas públicas, boletins eletrônicos de órgão públicos, etc.
De extrema importância e em sintonia com o reclame da sociedade — frisamos — por mais transparência e celeridade, tivemos no Poder Judiciário a implantação do processo eletrônico: o e-processo. O Superior Tribunal de Justiça não só foi pioneiro na utilização dessa ferramenta, como também é referência para os demais tribunais naquilo que diz respeito a este tema.
O ato de abolir o trâmite de processos em meio físico e permitir a consulta pública e virtual deles aos profissionais especializados, promover julgamentos e a concretização da entrega de prestação jurisdicional com a assinatura eletrônica pelos julgadores de suas decisões é uma realidade que se faz presente, uma revolução positiva sem caminho de volta.
A apresentação feita acima é pertinente e relevante quando enfrentamos debate ainda embrionário em nossa Corte Suprema, qual seja: a expressa vedação constitucional de cobrar tributos para o papel destinado à impressão de livros, jornais e periódicos, disciplinada no artigo 150, inciso VI, alínea “d”, da Constituição Federal.
Segundo o Supremo Tribunal Federal, temos que o instituto da imunidade tributária em comento representa um poderoso fator de contenção do arbítrio do Estado, qualificando-se como instrumento de proteção constitucional vocacionado a preservar direitos fundamentais — com a liberdade de informar, a liberdade de acesso à cultura e o direito do cidadão a ser informado — em ordem a evitar uma situação de perigosa submissão tributária ao poder impositivo do Estado. (AC 2.559-REF-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 14/06/2010, Segunda Turma, Informativo 591).
Ora, se a busca e intenção do legislador constitucional foi de garantir ao cidadão o livre acesso à cultura e informação, temos que tal interpretação também deve ser extensiva ao novo “conceito de papel”’ ora apresentado à sociedade, realidade essa inclusive admitida pelo próprio Poder Judiciário, quando franqueou aos jurisdicionados e demais cidadãos o acesso ao e-processo, naquilo que diz respeito à substituição do papel pelo meio digital/eletrônico.
E esse novo “conceito de papel”, defendemos, também deve ser alcançado pela imunidade tributária prevista na Constituição Federal. Tal afirmativa é feita considerando o fato de que matéria análoga à presente aguarda exame pelo plenário da Corte Suprema em repercussão geral, reconhecida que foi em face de sua importância, tendo o ministro Marco Aurélio afirmado como razões a fundamentar sua importância que “passo a passo, o Supremo há de estabelecer, com segurança jurídica desejável, o alcance do texto constitucional” (RE 595.676).
Com isso, entendemos haver uma primeira sinalização da importância que deve ser dada ao tema e da necessidade d’um debate sobre ele, técnico e profundo, sob olhares de contemporaneidade e avanço da sociedade, seja de ordem industrial ou cultural.
Não se diga aqui que, ao assim proceder, ou seja, reconhecendo a imunidade tributária para o novo “conceito de papel”, estaria o Supremo Tribunal Federal atuando como legislador positivo, pois assim não estará. Estará, sim, dentro de sua competência constitucional — como já realizado em outras oportunidades em que foi provocado a tanto —, estabelecendo uma interpretação contextualizada no tempo e espaço da norma que disciplina a imunidade tributária do “papel”.
A Constituição Federal foi promulgada em 1988, distante de nossa atual realidade no campo da tecnologia e informática, que efetivamente deixou o legislador de acompanhar e que agora reclama estabelecimento de nova e segura interpretação do alcance de seu texto, em face do novo “conceito de papel” que se apresenta.
Tal evolução, verificada para o novo “conceito de papel”, possibilita, a nosso ver, o questionamento judicial do tema.
Por fim, sustentamos não haver dificuldade para que o Fisco promova a futura fiscalização desse novo “conceito de papel”, e se esse seria ou não imune aos impostos, nos termos da Constituição Federal, pois que os aplicativos hoje disponibilizados permitem fácil identificação do que é semelhante a livros, jornais e periódicos.
Dalton Cesar Cordeiro de Miranda é advogado na Advocacia Dias de Souza, pós-graduado em Administração Pública pela EBAP/FGV e conselheiro do CARF.