O BOM exemplo do Espírito Santo.

Do UOL:

Reviravolta põe Espírito Santo como modelo contra violência em prisões

João Wainer – 11.mar.2010/Folhapress
Carceragem de delegacia de Vila Velha (ES), em 2010
Carceragem de delegacia de Vila Velha (ES), em 2010

FABRÍCIO LOBEL, DE SÃO PAULO

Há dois anos sem registrar nenhum assassinato dentro de seus presídios, o Espírito Santo aposta na ressocialização para evitar a violência atrás das grades. Há metas de atendimento jurídico, foco na educação dos detentos, oferta de emprego para ex-presidiários e, para evitar encarceramentos desnecessários, o encontro do juiz com o detido ocorre sempre em até 48 horas depois do flagrante.

Em contraste com o restante do país, a melhora nas condições carcerárias do Estado é relatada desde o sindicato dos agentes penitenciários à Pastoral Carcerária, passando também pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e o Tribunal de Justiça estadual.

O Estado, que tempos atrás viveu uma severa crise nos presídios, chegou a ser denunciado à ONU em 2010 pela precariedade e a superlotação de suas instalações.

Presos, por exemplo, eram acorrentados ou mantidos em contêineres por falta de vagas.Mas, de acordo com o governo Estadual, desde 2003 houve o investimento de cerca de R$ 500 milhões na estrutura carcerária, o que permitiu a criação e reforma de 10 mil vagas nos presídios.

Desde 2003, a superlotação tem diminuído. Se naquela época o número de presos era 131% maior do que o de vagas, em 2014, ele é 23%. Embora ainda acima do ideal, segundo dados de 2014 do Ministério da Justiça, o Estado tem a menor superlotação do país –16.694 presos para 13.572 vagas.

Luiz Silveira/Agencia CNJ Espirito Santo
Centro de detenção Provisoria Feminino de Vila Velha (ES), em 2011
Centro de detenção Provisoria Feminino de Vila Velha (ES), recém entregue em 2011

De acordo com o delegado federal e atual secretário de Justiça do Estado, Walace Pontes, foi essa a lógica praticada pelos governos do Estado nos últimos anos.

“Mais do que criar vagas, a ampliação do sistema prisional permitiu espaços para a inserção de programas de ressocialização com cursos profissionalizantes, ensino e acompanhamento médico.”

As penitenciárias têm, por exemplo, que cumprir metas de atendimento jurídico, psicológico ou de saúde dado a seus detentos. Enquanto isso, o currículo do ensino regular dado dentro das cadeias é exatamente o mesmo aplicado na rede pública. Por isso, o preso que sai do sistema penitenciário tem a opção de se matricular na rede pública e continuar os estudos.

MENOS PRESOS

Em 2015, o Judiciário local implantou as audiências de custódia, a exemplo do que já ocorria em São Paulo. Pelo modelo, um preso deve estar diante de um juiz em até 48 horas após sua detenção.

Nesse momento, decide-se se o criminoso está sendo acusado de um crime grave o suficiente para gerar uma prisão ou se ele pode esperar o julgamento em liberdade.

“Foi criado um filtro na porta do sistema prisional. É possível identificar os casos em que a prisão não é a melhor solução naquele momento”, explica a juíza criminal e coordenadora do grupo de monitoramento e fiscalização do sistema prisional do Espírito Santo, Gisela Souza.

“Existem outras medidas [punitivas] que podem ser mais eficientes que a prisão. Às vezes, não adianta colocar o criminoso no sistema prisional, fazer com que ele perca os laços familiares e sociais e ainda aproximá-lo de outros criminosos”, diz a juíza.

Já no início de 2016, em parceria com o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), as prisões no Estado voltaram sua atenção para a “porta de saída” do sistema. Por um lado, o Judiciário intensificou a análise de processos dos presos para verificar quais deles já poderiam receber benefícios como redução de pena, de progressão de regime ou indulto.

Por outro lado, foi criado o “Escritório Social” que visa criar um plano individual de ressocialização do ex-detento e encaminhá-lo a serviços públicos como acompanhamento psicossocial, qualificação profissional, acolhimento, entrevistas vocacionais e emissão de documentos.

“O Escritório Social ainda não atinge todo o Estado, mas já funciona nas duas maiores unidades”, explica a juíza. O sistema carcerário tem ainda 200 empresas cadastradas que costumam empregar ex-presidiários.

RIGOR

De acordo com o presidente da Comissão de Política Penitenciária da OAB do Espírito Santo, Homero Mafra, o rigor e a organização do sistema disciplinar são fatores que contribuem para o cenário sem mortes ou rebeliões nos últimos anos (o último motim ocorreu em 2013).

Já o sindicato dos agentes penitenciários acredita que a qualificação da categoria e o avanço da infraestrutura de trabalho na última década são os responsáveis pelo bom desempenho do sistema prisional do Estado. “Temos uma das melhores estruturas de presídio do país”, conta o diretor do sindicato dos agentes penitenciários e da federação nacional da categoria, Wilker de Freitas.

Para Freitas, outra vantagem é o fato do Estado não ter facções criminosas agindo intensamente dentro dos presídios. “Existem membros de diferentes facções no sistema carcerário, mas eles não exercem força dominante, não são atuantes”.

Para ele, no entanto, a situação dentro das cadeias do Estado já esteve mais tranquila. “Nos últimos três anos, sentimos o aumento da superlotação e falta de inspetores concursados. Temos uma boa estrutura que não podemos perder”, explica.

O Estado ainda luta para reduzir a taxa de homicídio, que nos últimos anos esteve acima da média nacional. A taxa de homicídios no Espírito Santo em 2015, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança, foi de 35 a cada cem mil habitantes, contra 26 no Brasil.

O governo local estuda a ampliação de vagas com a construção de duas novas unidades prisionais e a reativação de uma unidade Apac (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados), tida como prisão-modelo. Segundo o governo estadual, a abertura de novas vagas tem por objetivo atacar a superlotação e não possibilitar o aumento de novos detentos.