Do Globo Economia:
RIO – Prestes a se tornar o terceiro maior mercado mundial de computadores, o Brasil ainda vende desktops e notebooks (laptops) ultrapassados tecnologicamente em relação a países como os Estados Unidos e, ainda assim, muito mais caros. Com a pesada carga tributária no país, multinacionais do setor de informática, como Sony, Lenovo, HP, Samsung e Dell, optam por lançar no mercado brasileiro, na maioria dos casos, versões “tropicalizadas”, com processadores (que conferem velocidade aos equipamentos) menos potentes e memórias menores em relação ao vendido em nações ricas.
Mesmo “antigos”, os modelos brasileiros são bem mais caros que os “top” de linha vendidos nos EUA. Levantamento feito pelo GLOBO com 30 produtos, de seis marcas globais, constatou valores muito maiores em todos os casos. Em uma das comparações, o preço pago pelo brasileiro é 166% mais alto que o cobrado do americano. Do outro lado, os fabricantes reagem. Dizem que no Brasil falta escala de produção – já que a renda média no país ainda é baixa -, o que é essencial para reduzir o custo dos produtos. Especialistas também culpam a elevada carga tributária que varia de 24,3% a 33,6% do valor computador no ponto de venda, além dos custos altos da mão de obra, como os encargos da folha de pagamento.
Analistas e advogados que atuam no setor ressaltam que os fabricantes embutem sua margem de lucro. Segundo eles, no caso de notebooks ela chega a 10%. Porém, afirmam que a diferença nos preços entre os mercados brasileiro e americano já foi maior. Eles citam a Lei do Bem, que reduziu a cobrança de impostos para modelos de computadores.
– No Brasil, há uma série de tributos. Como as maioria das empresas monta os produtos no país, têm de importar as peças, pagando impostos de importação. Há ainda a logística de entrega e os investimentos em segurança. Por isso, é necessário tropicalizar os computadores e notebooks. Se trouxer o que há de melhor, ficará tão caro que ninguém vai comprar. Esse cenário só mudaria se o governo investisse em uma política de desenvolvimento de semicondutores. Com isso, haveria criação de tecnologia no Brasil e se passaria a produzir aqui, deixando os produtos mais em conta – explica Luciano Crippa, gerente de Pesquisa da consultoria IDC.
Por enquanto, o consumidor é quem sofre. Conforme o levantamento do GLOBO, um laptop da HP, por exemplo, com processador Intel Core i5, 4 giga (GB) de memória interna e 640GB de disco rígido, é vendido nos EUA por R$ 1.124,22, já com impostos. No Brasil, um similar, mas com 500GB de disco rígido, sai 166,76% mais caro (R$ 2.999). No caso de modelos iguais, a mesma constatação. Enquanto o laptop da Samsung Serie 9 é vendido a R$ 2.774,46 nos EUA, no Brasil o preço é R$ 4.749,05 – 71,17% maior.
Pedro Serejo, que comanda a empresa de eventos Blast, conhece bem as diferenças entre os dois mercados. Ele reclama que o Brasil sempre fica atrás quando o assunto é tecnologia em computadores.
– Estou pesquisando um novo laptop, pois preciso de algo moderno e com boa capacidade. O meu atual já está velho. Nos EUA, há mais opções a preços menores – afirma Serejo.
O presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), João Eloi Olenike, explica que os tributos respondem por 24,3% do valor dos computadores com preços até R$ 3 mil comercializados no varejo do país:
– Dentro desses 24,3% há tributos como PIS/Cofins, ICMS, além de Imposto de Importação e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
‘Máquinas daqui não são mais atrativas nos EUA’
Como os itens são caros, o consumidor brasileiro, em geral, faz a sua escolha de acordo com os preços, afirmam fabricantes. Eles ressaltam que a maior parte dos clientes não leva em conta o processador e a memória na hora da compra. Segundo Crippa, gerente da IDC, um laptop com 2 GB de memória interna, considerado obsoleto nos EUA, representa a maior parte das vendas no Brasil. O mesmo ocorre com as gerações mais antigas de processadores.
– As máquinas vendidas aqui não são mais atrativas para os EUA, onde os consumidores são maduros. Enquanto no Brasil grande parte ainda está comprando o primeiro laptop, o americano já está no terceiro e no quarto – afirma Crippa.
Segundo Jaison Patrocínio, diretor de Produtos da Lenovo, o poder aquisitivo do brasileiro e suas necessidades são essenciais na hora de definir os lançamentos. Por isso, os modelos de laptops mais vendidos no Brasil são os com memória interna de 320GB. Nos EUA, as vendas estão concentradas em itens acima de 500GB.
– O Brasil não está atrás de oferta, mas, sim, de demanda. Nos EUA, 80% (dos consumidores) querem tecnologia atual. No Brasil, o número oscila entre 30% e 40%. Vemos muitos concorrentes fazendo ofertas com produtos de até quatro gerações passadas – diz Jaison, ressaltando que alguns dos modelos vendidos hoje nos EUA chegarão ao Brasil em breve.
O país este ano irá superar a Inglaterra em venda de computadores (ficando apenas atrás de EUA e China). Espera-se uma alta de 30,6% na venda de notebooks este ano, para 8,1 milhões, e de 2,6% para desktops, com 7,7 milhões. Mesmo adquirindo importância crescente, Willen Puccinelli, gerente de Produto da linha Vaio, da Sony, ressalta que ainda é preciso muito avanço no Brasil. Por isso, completa, o foco é outro:
– Nem todos os mercados conseguem ter o mesmo tipo de uso. Aqui se paga muito imposto. Quando há algum produto muito sofisticado, ficamos impedidos de trazer porque o valor chegará muito alto para o consumidor. Por isso, os produtos passam por ajustes de configuração – esclarece, lembrando que, em julho, a empresa trará novos itens na faixa dos R$ 2 mil.
Fabiano Takahashi, diretor da unidade de Computadores Corporativos da HP, faz coro às declarações de Puccinelli, da Sony. O executivo ressalta também que o Brasil tem necessidades específicas, já que a maior parte da população ainda está no primeiro computador:
– A demanda aqui é simples. Eles querem acesso à internet e não recursos mais sofisticados. Mas o mercado é promissor.
Otimista, Raymundo Peixoto, presidente da Dell Brasil, diz que já percebe uma tendência de alta nas vendas de itens mais sofisticadas.
– O preço aqui é importante. Mas não é mais o único item. Nos EUA, há mais opções de produtos por já haver consumidores mais experientes – diz, ao ser perguntado por que nem todos os itens à venda nos EUA são encontrados no Brasil.
A Samsung, endossa Ricardo Dominguez, gerente da área de Notebooks, lança itens no Brasil cobrindo todas as faixas de preço. Embora os modelos de entrada tenham um volume maior de vendas (com 2GB de memória interna e 320GB de disco rígido), os modelos com maior capacidade têm registrado aumento nas vendas.
– Nos EUA, o mercado é de 15 polegadas, pois eles preferem tamanho maior de tela. No Brasil, opta-se por telas menores, pois o brasileiro não quer peso. Não é que o país receba coisas antigas. É que há diferenças entre os dois países – diz.