“Não entregaria mais secretaria a partido político e errei ao não me comunicar”, diz Serafim

Do AMAZONAS ATUAL:

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Serafim e a professora Cristiane Balieiro, candidata a vice na chapa do PSB à Prefeitura de Manaus (Foto: Divulgação)

 

Por Cleber Oliveira, da Redação

MANAUS – Ex-prefeito, o deputado estadual Serafim Corrêa Fernandes (PSB) quer voltar à Prefeitura de Manaus. Ele comandou o município de 2005 a 2008. Na disputa pela reeleição, perdeu para Amazonino Mendes (PDT), candidato que havia derrotado anteriormente. Aos 69 anos de idade, entrará na concorrência pelo cargo com outros dez adversários, alguns bem mais jovens. Para convencer o eleitorado que o rejeitou para um segundo mando no Executivo Municipal, Sarafa, apelido pelo qual é conhecido, aposta em um projeto de política pública centrado em três pilares e no legado que diz ter deixado à sociedade manauense. Economista de formação, auditor fiscal no início da carreira profissional e vida pública consolidada na política, na qual começou em 1988 como vereador, Serafim diz que não cometerá dois erros do passado: entregar secretarias a partidos políticos e deixar de se comunicar com o manauara. Abaixo, a entrevista que ele concedeu no sábado, 9, na redação do AMAZONAS ATUAL, ao jornalista Cleber Oliveira.

AMAZONAS ATUAL – O senhor lançou pré-candidatura a prefeito anunciando que não fará coligação. Por quê?

SERAFIM CORRÊA – Entendemos, respeitando a posição de todos os demais partidos, que há dois momentos. O primeiro turno é para que os partidos apresentem suas ideias. Quem não passar para o segundo turno, aí é que vai levar em conta aquela candidatura com a qual tem mais afinidade e decide se vai apoiar ou não. Aí diz: eu não participarei do segundo turno. Com relação à eleição proporcional, os partidos estão entendendo cada vez mais que devem ter chapas próprias. O que haverá após a votação do impeachment e após as eleições municipais é um grande acordo entre os partidos para fazer uma reforma política centrada em dois tópicos: primeiro, o fim das coligações proporcionais, que só existem no Brasil. Eu acho que estamos em um processo de aperfeiçoamento e é muito importante seguir esse caminho. E outro item da reforma é a cláusula de barreira: quem não atingir 5% dos votos para deputado federal terá que se fundir com outro partido.

ATUAL – Essa é uma forma de se sobressair entre os adversários?

SERAFIM –  Não. O PSB já faz isso desde 2008. Analisando o cenário político de Manaus, com algo em torno de 13 pré-candidaturas, ou você coloca sua cabeça de fora e vai defender suas ideias e suas propostas ou você vai sumir no processo. E todos têm direito a fazer isso.

ATUAL – Ao disputar uma eleição sem apoio de outros partidos, o senhor pretende evitar também o desgaste da credibilidade de possíveis aliados?

SERAFIM – Toda aliança traz bônus e ônus. Nós avaliamos que não tínhamos o direito de querer fazer alianças até para evitar essa situação porque isso é bilateral, vale para os dois lados. Trás coisas boas e ruins para um lado e pro outro. Então, para evitar qualquer problema, nós vamos seguir unidos e pacificados internamente. A gente vem discutindo isso há seis meses, pelo menos. E chegou a um momento que afunilou, tínhamos que definir.

ATUAL – Conforme o senhor anunciou, sua plataforma de campanha será baseada em três pilares: destravar, pacificar e cuidar. Qual é o mais urgente?

SERAFIM – Os três. Manaus é uma cidade travada, por exemplo, no trânsito e na economia. Hoje, uma empresa para vir se instalar no Distrito Industrial, ela primeiro tem que ter PPB (Processo Produtivo Básico, um índice de nacionalização dos produtos). O Ministério da Indústria e Comércio e o MCT (Ministério da Ciência e Tecnologia) demoram seis meses, um ano para conceder essa autorização. Isso na cabeça de um investidor japonês é uma maluquice. Depois, o Ipaam coloca obstáculos, o Implurb coloca obstáculos, a Semef coloca obstáculos. Nós temos que fazer a nossa parte como prefeito e, como autoridade, cobrar do governo do Estado e da Suframa que a gente destrave. O trânsito de Manaus tem que ser umbilicalmente ligado ao transporte coletivo. Nós tivemos um aumento absurdo no número de carros que é, portanto, o transporte individual. Aí avolumou o número de veículos e você tem gargalos. Manaus até tem uma malha viária boa, mas você tem gargalos nos quais a coisa para. E aí tem mexidas feitas que complicaram mais ainda. A faixa azul do lado esquerdo na Constantino Nery (avenida na zona centro-sul de Manaus), quando apenas 10% dos ônibus abre a porta para o lado esquerdo. Outros 90% abre do lado direito. Qual seria o lógico? Que a faixa azul existisse, mas do lado direito, e que houvesse recuo nas paradas. Isso é uma obra pequena, que custa muito pouco e que dá para a prefeitura resolver.

Dep Serafim Correa Foto Marcelo Araújo

“O número de homicídios em Manaus vem crescendo. Isso não é uma questão exclusivamente da polícia. A polícia vai combater os efeitos, não vai combater as causas. São causas de origem social

AMAZONAS ATUAL – O senhor fala em pacificação, mas isso não é competência da polícia?

SERAFIM – Manaus é uma cidade conflagrada. Todo final de semana morrem quase dez pessoas. O número de homicídios em Manaus vem crescendo. Isso não é uma questão exclusivamente da polícia. A polícia vai combater os efeitos, não vai combater as causas. São causas de origem social. A falta de escola, de emprego, uma série de coisas. E cabe ao prefeito essa articulação, esse compromisso. Por último, cuidar da cidade. É uma agressão à cidade você ver que em um dia de chuva a quantidade de geladeira, fogão, estofado, aparelho de ar-condicionado, lixo que são jogados nos igarapés. Quando a gente compõe a chapa tendo como vice uma professora (Cristiane Balieiro), uma pessoa voltada para a educação, nós estamos dizendo aqui: olha, o caminho é esse. Se tiver educação, a gente vai ter menos problemas de saúde, menos problema de saneamento, menos problema na vida das pessoas.

ATUAL – A escolha de uma professora como vice foi pensada apenas como fator educacional ou para ganhar o voto do eleitorado feminino?

SERAFIM – A primeira questão não é essa, o voto é o segundo momento. O primeiro momento é saber para que você quer o voto. Você está pedindo voto para chegar ao poder para fazer o que? Estamos dizendo claramente que nós queremos melhorar a economia e com isso gerar emprego e impostos. Nós queremos pacificar a sociedade e nós queremos cuidar da cidade cuidando das pessoas. Aí se vai votar ou não vai votar, é o segundo momento. E tanto eu quanto a professora Cristiane vamos buscar desse voto sem dizer nem ao menos que os outros candidatos são feios. Nós vamos dizer assim: nós queremos o seu voto para, chegando ao poder, fazer isso. Provavelmente, coisas que nós diremos não agradarão a uma fatia do eleitorado. Mas nós temos a expectativa de que esse programa é um bom programa para a cidade de Manaus. Nós não temos a pretensão de dizer que somos os melhores, que somos isso e aquilo. O eleitor, que é o juiz supremo, no altar que é a urna, ele vai decidir o futuro de Manaus.

ATUAL – Com uma candidata jovem como vice, para quem será dirigida sua candidatura: os jovens, adultos ou idosos?

SERAFIM – Para todos. A composição da chapa sinaliza para isso. O eleitor  faz a média da cidade. Tem eleitor de 16 anos e tem de 90 anos. Todos vivem na mesma cidade. Você tem que ter uma proposta que abrace esse arco. A Cristiane é jovem e eu já estou na melhor idade. Na média, nós atendemos a todos.

ATUAL – Quem o eleitor vai ver representado na campanha: o Serafim, especialista em finanças públicas, ou o Sarafa?

SERAFIM – Eu acho que as duas coisas. Eu tenho clareza disso, de que você tem que estar presente em todos os segmentos. Graças a Deus, eu circulo em todo lugar. As pessoas podem até não votar em mim, podem até não simpatizar, mas elas me recebem, conversam.

ATUAL – O senhor pretende fazer campanha para expor essa plataforma com recurso do Fundo Partidário. É suficiente?

SERAFIM – Ainda não caiu a ficha das pessoas. Não vai ter outro recurso. Os recursos que todo partido vai ter serão os do fundo partidário. O Brasil não tem a cultura de doação de pessoa física. Depois de todas as operações policiais que já aconteceram, fica até difícil para um candidato pedir uma doação a alguém. Porque aquele que se dispõe a doar fica com receio: ah, eu vou doar e amanhã eu vou ser acusado disso e daquilo. As pessoas fogem da política. O mundo das pessoas comuns não é o mundo dos políticos. Então, há a necessidade de que todos nós tenhamos consciência disso. O dinheiro que vai ter será do Fundo Partidário. A direção nacional de todos os partidos vai fazer uma divisão dos pães. E é óbvio que nós temos que entender que Manaus é uma cidade importante, mas ela não é a única. Existem 26 capitais, porque Brasília não tem eleição municipal, e existem centenas de cidades-polo que irão partilhar esses recursos.

“Nós não temos a pretensão de dizer que somos os melhores, que somos isso e aquilo. O eleitor, que é o juiz supremo, no altar que é a urna, ele vai decidir o futuro de Manaus

ATUAL – No Brasil, campanhas políticas são personalistas. Os políticos evitam abordar questões ideológicas. O PSB pretende deixar claro sua ideologia de esquerda?

SERAFIM – Sim, mas mostrando os objetivos do partido. Resumindo em uma frase: somos claros. A ideia é chegar ao poder para fazer uma sociedade mais justa e mais fraterna. Isso resume a ideologia do socialismo. O que se quer é isso. E os caminhos através dos quais nós buscamos isso serão expostos na campanha. E se resume na necessidade de destravar economicamente, pacificar socialmente e de cuidar das pessoas.

ATUAL – A representatividade política passa por uma crise nas três esferas de poder político: municipal, estadual e federal. O senhor foi prefeito e perdeu na disputa pela reeleição. Como resgatar a confiança do eleitorado?

SERAFIM – Estamos caminhando para que, nas próximas décadas, seja intensificada a democracia direta. Daqui a cinco ou dez anos, até por força da facilidade dos meios de comunicação, será intensificada a consulta popular. Desde a elaboração do orçamento, desde a definição das prioridades passando por aquilo que a sociedade realmente quer. Por exemplo: Portugal. Eleição em Portugal tem uma agenda de debates. Lá se discutiu o que vai fazer da TAP (Companhia aérea estatal portuguesa). Vai privatizar a TAP ou manter estatal? O candidato que ganhou defendia privatizar a TAP. Então, quando chegou ao momento seguinte quem tinha perdido a eleição? A TAP foi privatizada. No Brasil, por exemplo. Temos assuntos aqui delicados para o futuro do País que precisamos resolver. E eu coloco na ótica dos municípios a questão do pacto federativo. No meu entender, nós temos que dividir melhor o bolo tributário federal. E tem que acabar com uma série de coisas e repassar esse dinheiro direto para os municípios. No município já está carimbado o dinheiro, não tem jeito. São 25% para a educação, 15% em saúde. O que ocorre? Os municípios têm menos recursos para atender suas demandas e o governo federal fica lá com uma postura monárquica, em que os prefeitos têm que andar com pires na mão pedindo dinheiro. Ele gasta mais tempo pedindo dinheiro em Brasília que na sua cidade trabalhando, administrando e vendo os melhores caminhos.

ATUAL – Seria o caso, então, de debater como tornar Manaus uma cidade mais inserida no conceito Zona França?

SERAFIM – Uma das grandes questões da Zona Franca é que o Distrito Industrial está de costas para a cidade e a cidade está de costas para a Zona Franca. Nosso primeiro problema, que eu considero relevante, é o capital humano. Nós temos duas universidades públicas e mais de uma dezena de universidades privadas, mas você não encontra um dirigente de empresa formado em uma dessas universidades. Então, tem alguma coisa de errado nisso. Nós precisamos conversar mais e o prefeito tem que fazer esse papel, de tentar trazer as pessoas para dentro da discussão sobre as questões da cidade. Todos nós vivemos na cidade. O Distrito não pode ser um enclave. Ele está ali esperando o tempo passar. Não é isso.

ATUAL – A urbanização do Distrito Industrial, inclusive, é um problema. A prefeitura e nem a Suframa se responsabilizam pela manutenção da área…

SERAFIM – A questão da manutenção das ruas do Distrito é antiga, que nos remete para a revisão do pacto federativo. Não há como os municípios brasileiros suportarem esse ônus que é pesado sem que haja uma repactuação de recursos. E essa é a razão que não só eu enquanto prefeito, mas todos que foram eleitos sempre cobraram da Suframa e a Suframa sempre não fez. Na minha época, aqueles primeiros R$ 60 milhões (dinheiro do governo federal repassado para reforma e asfaltamento de ruas) foram uma promessa do Lula à Prefeitura de Manaus. O dinheiro saiu, mas quando chegou a hora de assinar o convênio a Suframa fez o convênio com o Cieam (Centro da Indústria do Estado do Amazonas) que não tinha nenhuma expertise no assunto. Claro que aí tiveram as inserções políticas que, deixa pra lá, isso ficou para trás. Eu lamento por elas terem acontecido, mas o correto era ter feito com a prefeitura.

ATUAL – O senhor diz que, quando prefeito, deixou um legado para a cidade. Qual foi?

SERAFIM – Em linhas gerais, nessa linha de melhorar o ambiente de negócios, a economia, tentar pacificar Manaus, cuidar das pessoas, eu acho que nós temos um legado que pode mostrar isso. Eu vou resumir algumas obras que não têm como ser desconhecidas. Maternidade Moura Tapajós. Já nasceram na maternidade mais de 40 mil crianças na melhor maternidade da cidade, que foi feita por nós. Então isso mostra o quê? Compromisso com a mulher, com a mãe, com a criança. Quarenta mil pessoas equivalem à Arena da Amazônia lotada. Se você considerar que foram 40 mil mães e 40 mil crianças, isso daí é Itália x Inglaterra e Portugal x Estados Unidos. São oitenta mil pessoas. Isso mostra um legado que os outros até procuraram esconder porque não tem nenhum outro ex-prefeito que tenha essa obra e que é a obra social mais relevante da cidade. Quem mais fez isso?

Outro exemplo: a água. O problema da água era do Estado, que de forma competente, entre aspas, fez uma venda da concessão pública de abastecimento de água e coleta de esgoto e ficou com US$ 200 milhões,   deu US$ 10 milhões para a prefeitura e deixou para o prefeito apenas a responsabilidade de aumentar a tarifa anualmente. Quer dizer, o governo do Estado saiu lindo na foto e o prefeito ficou com o abacaxi. Eu assumi e esse abacaxi estava na minha mão. Só que não era mais um abacaxi, era uma bomba que iria explodir na minha cadeira porque os prefeitos que me antecederam, quando viram o que tinha sido feito, eles se recusaram a dar o reajuste da tarifa. Quando eu assumi estava o impasse: não tinha reajuste há três anos. Eu paguei esse preço, assumi esse ônus, mas naquela altura foi feita uma repactuação que solucionou o problema.

ATUAL – Mas isso faz parte do jogo. Quem se candidata tem que estar ciente dos problemas que vai assumir…

SERAFIM – Sim. E isso rendeu votos naquele primeiro momento? Provavelmente não. Mas hoje, oito anos depois, as pessoas podem constatar o quanto isso foi importante. Eu vejo muita gente falando de saneamento básico e um dos itens de saneamento básico é a coleta e destino final do lixo. Quando nós chegamos à prefeitura, havia uma lixeira a céu aberto com 300 pessoas se engalfinhando lá por restos de comida, por descartáveis, recicláveis e tudo mais. Nós retiramos aquelas pessoas de lá, fizemos cooperativas e Manaus tem um aterro consolidado. De lá para cá não foi feito mais nada. Nós temos um legado bom para mostrar.

O deputado estadual eleito e ex-prefeito de Manaus Serafim Corrêa em noite de autógrafos da obra Tributos: é mais fácil do que você pensa (Foto: Valmir Lima)

“Agora o que eu não faria de novo?  Entregar a secretaria para partido político. Isso foi um erro cometido não só por mim, mas por tantos outros prefeitos e governadores e até presidentes da República. E a outra questão que eu não faria mais: deixar de me comunicar.

ATUAL – O que o senhor fez que considera um erro e não repetiria em um possível novo mandato na Prefeitura?

SERAFIM – Agora o que eu não faria de novo?  Entregar a secretaria para partido político. Isso foi um erro cometido não só por mim, mas por tantos outros prefeitos e governadores e até presidentes da República. E a outra questão que eu não faria mais: deixar de me comunicar. Eu falhei muito. Não estou atribuindo culpa a ninguém. Eu falhei muito na minha comunicação. Eu deveria ter sido mais proativo e durante quatro anos eu tinha sete horas de programas de televisão e rádio, todos os dias me atacando. E eu fiquei lá na busca por recursos, tentando resolver problemas internos e não cuidei dessa parte. Como tudo aquilo que a prefeitura fez era coisa visando a próxima geração e não a próxima eleição, quando você faz uma maternidade você faz para as gerações futuras. Quando você resolve o aterro, você está cuidando da saúde das pessoas. Quando você resolve o problema da água, a saúde da cidade. E essas obras em si não dão voto. Mas eu preferi trabalhar para as próximas gerações do que para a próxima eleição.