Em nosso último encontro, antes de sua partida, Moysés Israel disse que me havia deixado uma encomenda em seu escritório. Tratava-se de um livro, a tradução final e ilustrativa de sua trajetória, sua teimosia e alegria pelo Amazonas. “Cultivo de pinhão-manso”, do professor Nagashi Tominaga. Transformado em curso, disponível na web, “Cultivo de Pinhão-Manso para Produção de Biodiesel” foi criado pelos pesquisadores da Universidade Federal de Viçosa. A obra mostra os aspectos botânicos potenciais para a produção de biodiesel. O autor se uniu a especialista no cultivo de pinhão-manso, os engenheiros agrônomos Jorge Kakida e Eduardo Kenji Yasuda. Cientistas consultores da Boeing, pesquisadores de biocombustíveis, vieram a ter com ele antes de fechar um acordo com a Embraer, o CTA, Centro de Tecnologia da Aeronáutica e o Polo de Biotecnologia de São José dos Campos, para assegurar uma linha de pesquisa e produção de pinhão-manso. Uma espécie tropical amazônica com prioridade de investigação nos principais centros de pesquisa do planeta. No Amazonas, ele buscou convencer as autoridades liberar o plantio em áreas adequadas/degradadas. Quem se interessou pr essa obviedade energética, ambiental e econômica do biocombustível. Aqui, ninguém.
Outra alternativa que vibrava em acompanhar e lamentava a dificuldade de fazer prosperar, era o aproveitamento dos resíduos de açaí para produzir MDF, o fruto da palmeira mais badalada da região amazônica: MDF é placa de fibra de média densidade, . Em Manaus, Antonio Mesquita, biólogo da antiga Utam, universidade de tecnologia criada em 1979, para dar base para a ZFM, descobriu o caminho. Entretanto, só encontrou abrigo na Universidade Federal do Pará e o Museu Emilio Goeldi, que está patenteando a invenção, e com acolhida da Universidade de São Paulo, campus de Pirassununga, na busca de preparar o produto para o mercado. O MDF em questão se constitui a partir das toneladas de caroço de açaí que as empresas jogam no ambiente. Mesquita, em seu doutorado, mostrou que o açaí se transforma em excelente alternativa para fabricação de móveis sustentáveis. O processo de fabricação do ecopainel consiste no aproveitamento das fibras dos caroços de açaí e a utilização de uma resina de óleo de mamão. Aqui ninguém deu trela para a invenção…
A necessidade é a base das soluções criativas. O grito de alerta de Moysés Israel, para olharmos com inteligência e insistência, nossas oportunidades, ecoará embalde até quando? Na estagnação da economia amazônica dos anos 50 – muito semelhante à esta que hoje se instala – a ordem era achar saídas. Dai, então, surgiram múltiplas ações pioneiras para produzir agro e bioindústrias que – naquele momento – fazem e poderão fazer dos emblemas e embates amazônicos, a descoberta deste tesouro tropical, o Eldorado Verde, o leite e o mel da promessa milenar judaica, cearense, portuguesa, libanesa…Por mais de 70 anos, Moysés defende o aproveitamento e beneficiamento de recursos naturais da região. São produtos buscados pelo mercado nacional e internacional, um ensaio de desenvolvimento socioeconômico, tradicionalmente coerente com os parâmetros ambientais. O Brasil assinou o Acordo do Clima, em Paris, em 2015, incluindo a Amazônia em todos os objetivos e compromissos de sua contribuição. Entretanto, mantém uma legislação proibitiva para acessar a biodiversidade, que impede que se dê ao bem natural uma finalidade econômica, a forma inteligente de resguardar um estoque natural. Resgatar essas iniciativas é louvar a teimosia de Moysés Israel. Mais do que isso, um convite para refletir sobre seus alertas. Fica aqui , Dr. Moysés, meu agradecimento sincero e saudoso, pelo livro, pelos recados, as lições de obstinação e dedicação pelo nosso Amazonas, legado que importa valorizar, aplicar, materializar em favor de nossa gente, urgentemente.