Por Vanja Carneiro Campos
Os adeptos incondicionais do “contra”, praticando abusos corriqueiros da incondicionalidade, certamente não apreciarão este artigo escrito sem ódio e que não ataca ninguém. Tampouco esperamos o endosso do grupo “sempre a favor”, historicamente alinhado em torno de quem assume um alto cargo. Aqui se trata de alguém que está deixando o poder. O texto a seguir privilegia os fatos, como prefere, em todo o jornal, a grande maioria dos leitores.
Fernando Lyra, nome que escrevemos com respeito e amizade, pediu exoneração da presidência da Fundação Joaquim Nabuco. Quando nomeado, em 2003, costumava dizer aos amigos mais próximos que não levaria para a instituição qualquer sentimento menor sobre os gestores que o precederam. Queria olhar para frente, abrir caminhos, inovar. Vê-se agora, oito anos depois, que cumpriu a missão.
Este compromisso de não rancor e eficiência inspirou recente Nota emitida pelos membros do Conselho Deliberativo da Fundação, com declarações que transcendem a simples lisonja formal. Figuras altamente representativas da inteligência brasileira, os signatários louvam o desempenho exemplar de um gestor dedicado “por vezes até com sacrifícios de ordem pessoal”. Dois relatórios apresentados ao final de cada período expõem, minuciosamente, as realizações da gestão concluída. Tentamos, nos limites deste espaço, resumir o seu conteúdo.
Houve significativo investimento na qualificação de pessoal, com abertura de concurso, após quase duas décadas sem renovação de quadros. Elevou-se, em consequência, o número de doutores e mestres na instituição. Facilitou-se a participação em congressos e simpósios importantes nas diversas áreas técnicas. Estimulou-se a publicação de trabalhos científicos e de novos títulos da Editora Massangana.
O Museu do Homem do Nordeste foi modernizado, com a redefinição do perfil de sua exposição permanente, reformou-se a Biblioteca Central Blanche Knopf, criou-se o Núcleo de Digitalização, e foi restaurado e reaberto com novas funções o Engenho Massangana, onde Joaquim Nabuco viveu sua primeira infância.
Intensificaram-se projetos e ações educacionais, desenvolveram-se estudos e pesquisas sobre a realidade do Nordeste, alargaram-se os laços com a sociedade civil e as comunidades, dinamizaram-se os serviços culturais, com reforma do Cinema da Fundação e outros equipamentos.
Cabe destacar uma iniciativa democratizante e inovadora que, dentro das atribuições da presidência, atendeu justa demanda dos pesquisadores. Foi a implantação, em 2003 e 2005, respectivamente, de processo eleitoral interno para escolha dos coordenadores e do diretor de Pesquisas Sociais. Fernando Lyra agiu, neste caso, com o mesmo tirocínio político e agilidade que o levaram a abolir a censura quando ministro da Justiça e, antes, como deputado federal, ao lançar a candidatura Tancredo Neves à Presidência, reanimando um País frustrado com a derrota da emenda das Diretas Já.
O dirigente cultural aqui reconhecido soube honrar mais uma função que lhe coube exercer na vida pública. Este artigo, escrito por uma servidora da Fundaj, tem o propósito central de fazer justiça. É um testemunho desinteressado e voluntário de sua luta, coroada de êxito, para que a Fundação Joaquim Nabuco se modernizasse e correspondesse, no século 21, ao sonho de Gilberto Freyre e outros pioneiros da pesquisa social.
Lemos com emoção a frase final da mensagem com que Fernando agradeceu o apoio dos servidores. Usou apenas duas linhas para falar de si mesmo: “Sigo a estrada da vida, com esperança no futuro de todos nós, do nosso Estado e do nosso País. É o que me move”.
Quem conhece de perto o caminhante, sabe da força interior que anima a sua marcha.
» Vanja Carneiro Campos é pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco