Na segunda, quando o Ministro Marco Aurélio do STF, através de liminar, decidiu afastar o Senador Renan Calheiros da Presidência do Senado abordei o assunto por quatro óticas: a da opinião pública, a política, a jurídica e a econômica.
Na terça, o Senador recusou-se a receber a ordem judicial num desrespeito claro. As reuniões do Senado foram suspensas e a Mesa do Senado divulgou nota dizendo que aguardaria a decisão do Pleno do Supremo.
Ontem o STF por 9 X 0 decidiu que o Senador fica proibido de assumir a Presidência da República, mas por 6 X 3 não será afastado da Presidência do Senado, o que compete ao próprio Senado decidir.
Hoje sigo o mesmo script para abordar as quatro óticas, outra vez.
OPINIÃO PÚBLICA – Ficou indignada. Queria Renan afastado e preso por desobediência.
POLÍTICA – Nos bastidores foi feito um grande acordo, embora todos neguem isso. Em troca da decisão do STF, nos termos em que foi tomada, o Senado retirou da pauta o projeto que estabelecia regras para punir magistrados e membros do MP por abuso de autoridade. Claro que todos negam, mas foi isso que aconteceu. Com isso, o ambiente político ficou menos tenso e foi preservada a independência dos poderes, mas que houve o acordo, isso houve. Aliás, hoje, em O GLOBO o Ministro Marco Aurélio diz:
“Já estava tudo acertado”
Marco Aurélio Mello denunciou o acordão no STF em entrevista para O Globo:
Que balanço o senhor faz do julgamento de ontem?
O balanço está no meu voto. No voto, eu busquei escancarar tudo, inclusive dizendo da responsabilidade do Supremo. Eu disse que a história, as gerações futuras são implacáveis. Agora, pelo que eu li hoje no Globo, já estava tudo acertado.
O senhor já sabia do acordo quando proferiu o voto?
Sabia pelo noticiário, pelas redes sociais, não por informação interna do Supremo. E, agora, claro que se confirmou. O meu voto teve uma parte substancial na qual eu cobrei a responsabilidade dos colegas a partir do que já circulava nas redes sociais.
Mas eles mantiveram o acordo.
É o que estou percebendo, que no dia anterior já corria em Brasília que o ministro Celso de Mello mudaria o procedimento que sempre teve e puxaria o voto…
JURÍDICA – Existem opiniões respeitáveis de um lado e de outro. No entanto, a leitura de alguns artigos da própria CF/88 sinaliza que prevaleceu a interpretação literal. Vejamos:
Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Art. 80. Em caso de impedimento do Presidente e do Vice-Presidente, ou vacância dos respectivos cargos, serão sucessivamente chamados ao exercício da Presidência o Presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e o do Supremo Tribunal Federal.
Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade.
§ 1º O Presidente ficará suspenso de suas funções:
I – nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia ou queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal;
II – nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo Senado Federal.
§ 2º Se, decorrido o prazo de cento e oitenta dias, o julgamento não estiver concluído, cessará o afastamento do Presidente, sem prejuízo do regular prosseguimento do processo.
§ 3º Enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o Presidente da República não estará sujeito a prisão.
§ 4º O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.
Vejam que os Poderes são INDEPENDENTES e HARMÔNICOS, não são subordinados. É a Teoria de Freios e Contrapesos. Sendo INDEPENDENTES, como por uma liminar, onde não está evidente nem a fumaça do bom direito, nem o perigo da mora ( não há viagem prevista do Presidente da República, nem do Presidente da Câmara) um Ministro de um Poder pode afastar o Presidente de outro?
Nesse aspecto foi muito lembrado o caso do deputado Eduardo Cunha. No entanto, há uma diferença fundamental: o Ministro Teori não deu liminar. Submeteu sua posição ao Pleno que a aprovou por unanimidade. E naquele caso Eduardo Cunha estava obstruindo a Justiça.
Registre-se por último que nada justifica a agressão verbal do Ministro Gilmar ao Ministro Marco Aurélio, muito menos a recusa do Senador Renan em receber a ordem judicial. As duas posturas não são condizentes com os cargos que ocupam, sendo que no caso de Renan, a meu ver, houve desobediência evidente.
ECONÔMICA – Por essa ótica a decisão foi recebida de forma positiva, pois garante que será colocada em votação a PEC do Teto dos Gastos em 2º turno, a primeira medida, de uma série, para reverter o quadro adverso da nossa economia.
O caminho para a travessia é cheio de ondas exigindo da sociedade como um todo e dos Poderes os contornos necessários para chegarmos a um porto seguro. Essa é a realidade com a prevalência da pauta econômica.