“Mas não se matam cavalos?”

Por Alfredo MR Lopes  (*):
alfredo.lopes@uol.com.br

Durante a Grande Depressão, nos anos 30 nos Estados Unidos da América, uma imensa maioria da população carecia de uma vida digna, sofrendo com o desemprego. Foi nessa época que, entre outras oportunidades inusitadas, apareceram os concursos de dança, que testavam ao extremo a resistência dos competidores em troca de comida, roupas e alguns míseros trocados. Este momento de desenganos e incertezas foi retratado no filme de Sidney Pollack, They Shoot Horses, Don’t They?, Mas não se matam cavalos?, exibido no Brasil como  A noite dos desesperados, uma adaptação do romance de Horace McCoy, chamado They Shoot Horses, Don’t They? O drama de incertezas e descrenças traduz muito dos elementos políticos, econômicos e midiáticos que ora experimentamos, onde os incentivos fiscais da Zona Franca de Manaus passa a integrar, em vez da solução, a causa dos problemas nacionais. Por essa lógica, melhor seria que não resistíssemos, ou melhor, existíssemos.

No jornal Valor desta segunda-feira, na busca equivocada de explicar a gestão aloprada do governo federal que consegue, por inépcia ou sintropia,  impedir o crescimento natural da economia do Brasil – este amontoado de oportunidades em todos os setores – alguns economistas desembarcam mais uma vez na Zona Franca de Manaus. Veem a procura de culpados. Um bode expiatório. Aqui, onde ancoram críticas ocas, maledicentes, suspeitas e inconsistentes, nunca molharam os pés da indagação na fecundidade destas várzeas. Defendem que se matem os cavalos, a montaria das Amazonas para defender o chão, a cria e a autonomia tribal. Misturam alhos com bugalhos, colocando no mesmo paneiro “uma  extensa lista de incentivos, alguns deles bastante polêmicos”, a começar pela Zona Franca de Manaus, o Simples Nacional, a desoneração da folha de salários, e os aposentados do Brasil. “Mas não se matam cavalos?” Para eles, são todos de alguma maneira discutíveis na opinião de especialistas, e consomem mais de 50% do total de renúncias. Os cálculos estão em estudo detalhado feito pela equipe econômica do Credit Suisse, liderada por Nilson Teixeira. A serviço de quem?

A expectativa do Credit Suisse – banqueiros obrigados a revelar que guardavam dinheiro sujo de sangue – é que, com a Zona Franca, o governo deixe de arrecadar R$ 26 bilhões em 2016 ­ ou algo próximo a um Bolsa Família. Tenha paciência. A Bolsa é esmola, a ZFM emprego, dignidade, redução de desigualdade regional. Eles raciocinam com números, não com fatos, muito menos com pessoas.  Como diz Afif Domingues, presidente do Sebrae, o governo faz a conta oficial da renúncia,  contabilizando o que as empresas do Simples pagariam se estivessem no lucro presumido. “Isso é um sofisma. Porque se as empresas não estivessem no Simples, não haveria essa arrecadação. As empresas deixariam de existir. Elas morreriam.” No caso da ZFM, diz o presidente do Centro da Indústria,  Wilson Périco, não  há perda para a União, pois se ela não existisse as empresas não se instalariam no Norte do país…. e se enganam também os que pensam que as industrias, se não tivessem os incentivos Constitucionais da Zona Franca migrariam de Manaus para outra região do País, NÃO, o Brasil perderia os investimentos, perderia, principalmente, os empregos gerados por esses investimentos e toda a arrecadação de tributos gerados hoje, portanto, não haveria um centavo a arrecadar. Outro dia, num debate sobre Mobilidade Urbana, no Comitê Cidadão, ao saber que Estado, União e Município ficam no jogo de empurra sobre a responsabilidade com os buracos do Polo Industrial, o pastor adventista José João foi categórico: “Antes da mobilidade precisamos falar e cuidar da estabilidade do polo industrial de Manaus, de onde sai nosso pão de cada dia.” Se nem os nativos cuidam da ZFM, Pastor, porque bancos suíços esfaimados ou economistas aloprados o fariam?

(*) Alfredo é filósofo e ensaísta