Mamirauá e a falência do interior

Por Osíris Silva – Economista:

Ao se debater o futuro da Amazônia, da Zona Franca de Manaus e do Amazonas, em particular, evidente se torna incluir a exploração de sua biodiversidade biológica, do setor primário (produção de alimentos) e do ecoturismo. Óbices quase incontornáveis, todavia, limitam e emperram ações governamentais nessa direção. Parcos investimentos e precária infraestrutura rodoviária, fluvial, portuária, energética e de saneamento básico constituem fatores praticamente intransponíveis, inibidores do crescimento econômico.

O professor da UFAM e ex técnico do INPA, Casemiro Elifio, recentemente em passagem por Humaitá, ao comentar, por e-mail, a questão Plano B x ZFM x Crise econômica do País, objeto das duas últimas colunas, descreve cenário nada animador ali encontrado. Por falta de competência política e administrativa Humaitá não avança, observa. O município, segundo Elífio, depara-se com verdadeiras “aberrações”, tais como: “energia fornecida por termoelétrica quando há hidrelétrica em Porto Velho; embora rede de fibra ótica passe por dentro da cidade, sinal de internet ainda é obtido por meio de onda de rádio; o diesel para a usina termoelétrica da cidade é transportado via balsas com destino a Porto Velho, em vez de ser descarregado diretamente em Humaitá. De Porto Velho a Humaitá o transporte se faz por via terrestre”. Quadro esse, convém salientar, típico das áreas interioranas.

O Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM), localizado na região de Tefé, da mesma forma que as demais instituições de C,T&I vive momento de intensa dificuldade financeira, limitando seriamente suas operações. Segundo o diretor do Instituto, pesquisador Helder Queiroz, atualmente “há risco de o ISDM entrar em colapso por falta de repasse de recursos pactuados com o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) para sua gestão”. A iminência de tal desastre, salienta Queiroz, terá impacto gigantesco sobre a economia regional face à natureza especializada de seus serviços, que compreendem “assessoramento técnico e científico a várias atividades extrativas, ajudando na melhoria da produção, organizando arranjos produtivos e sua sustentabilidade, que resultam em ganhos dos pequenos produtores, além de atuar na consolidação de cadeias produtivas da biodiversidade, normalmente informais”.

Os recursos orçados para 2015, de R$ 21 milhões, foram reduzidos a R$ 12 milhões, volume inferior até para fazer face às necessidades de pagamento do quadro funcional e cumprimento da programação operativa. O cenário vai se agravar ainda mais considerando que para 2016 a previsão orçamentária não será diferente.  Em decorrência, a Comissão de Avaliação do Contrato de Gestão celebrado entre o MCTI e o IDSM reuniu-se em Brasília nos dias 19 e 20 de outubro com o fim de informar ao ministro Celso Pansera, do MCTI, sobre a grave situação, que já provocou o desligamento de 55 colaboradores (mais não foram demitidos por falta de verbas destinadas a rescisões contratuais).

A situação da Reserva Mamirauá é tão crítica que poderá vir a falir a qualquer tempo, avalia o cientista do INPA, Charles Clement, também membro da Comissão da IDSM. Sua  iminente  desativação virá certamente ocasionar sérias repercussões internacionais, além de constrangimentos ao governo brasileiro, particularmente no momento em que o mundo se prepara para a 21ª Conferência do Clima (COP 21) a ser levada a cabo no próximo mês de dezembro, em Paris. O Instituto, convém salientar, desfruta de enorme visibilidade mundial resultante do sucesso das tecnologias socioambientais e pesquisas sobre áreas úmidas, o miolo da Amazônia, lá desenvolvidas, destacando-se o bem-sucedido plano de manejo para pirarucu, peixes ornamentais, caranguejo, jacaré, madeira na várzea, etc. Estima-se que dois milhões de pessoas, beneficiárias diretas ou indiretamente dos planos e atividades do IDSM, poderão ficar ao desamparo. Calamidade anunciada.