Todas essas manifestações que vimos pipocando em diferentes países, que também se expressam de forma bastante própria em cada um deles, piscam numa mesma direção.
O comum parece ser a insatisfação, a raiva, o medo, a angústia e a indignação. Sentimentos que podem ou não ser canalizados perigosamente. Devem ser entendidos como indicação de que algo profundamente “errado” está acontecendo e não corresponde aos anseios desses jovens.
As manifestações utilizam presença, discursos, gritos, por vezes violência e instrumentos que antes não eram disponíveis. E nós, mesmo tentando entender, no máximo percebemos que há um novo movimento em uníssono, múltiplo e que tem uma capacidade gigantesca de propalar-se.
O novo parece ser, além da comunicação em tempo real e das redes sociais, o momento peculiar que o mundo vive. Nessas últimas semanas, o que era uma ação de jovens insatisfeitos pela percepção de que as portas para a realização de seus sonhos se estreitavam, tomou forma mais ampla e nítida: a sociedade está cada vez mais desigual.
Mas o que leva à manifestação, seja no Twitter ou indo às ruas, é se perceber fora do jogo. E eles têm razão, pois 20% dos mais ricos consomem 70% da produção mundial, enquanto os 20% mais pobres consomem menos do que 2%.
Essa disparidade, há um tempo atrás, não incomodava tanto aos jovens dos países ricos. Mas, na medida em que veem suas chances de emprego e consumo desabarem, a revolta contra os governos que produziram tal situação é imensa. Eles não têm respostas, eles querem solução. Querem luz no final do túnel para voltar a sonhar e realizar.
Os jovens se deram conta, antes dos trabalhadores mais velhos, que seus representantes não estão nem aí para o estreitamento de suas oportunidades de ascensão social, sua ânsia por liberdade, participação e democracia. Foi ficando claro que governos como os da Europa e dos Estados Unidos, que socorreram com mais de US$ 2,1 trilhões o sistema financeiro, não os representam.
As instituições mundiais e os sistemas eleitorais vigentes, assim como as regras que têm conduzido o mundo, estão caducas. Seria como se o mundo já estivesse tocando outra música e a orquestra continuasse na partitura anterior. Não dá. E como mudanças dessa profundidade nunca ocorreram com rapidez, encontramo-nos todos atônitos com a aceleração do processo.
Enquanto esses movimentos vão como nuvens se redesenhando, sem céu azul, fica a pergunta: para que e para quem servem esses governos? Não nos esqueçamos das faixas empunhadas em manifestações na Espanha: “Se não nos deixarem sonhar, não os deixaremos dormir”. A luz não vai parar de piscar tão cedo.
MARTA SUPLICY escreve aos sábados nesta coluna.