Do CONSULTOR JURÍDICO, por André Luis Bitar de Lima Garcia e Karine Moura Pinheiro
O mercado imobiliário aquecido em nossa cidade já provoca também efeitos no Judiciário. As construtoras devem ligar o sinal de alerta quanto aos seus deveres, investindo em uma assessoria jurídica qualificada, a fim de prevenir litígios e exercer de maneira consistente suas defesas em processos judiciais, os quais têm se tornado mais frequentes diante da conscientização dos compradores aos seus direitos. A falta de cumprimento contratual por parte das construtoras quanto ao prazo de entrega do imóvel vem acarretando no dever de reparar os danos suportados pelo comprador, cuja indenização abrange tanto a esfera material quanto moral.
As construtoras têm sido condenadas a pagar indenização por danos materiais sob a forma de lucros cessantes, correspondentes à renda dos alugueis que o comprador deixou de auferir ou que pagou em razão da impossibilidade de dispor do imóvel a partir da data convencionada para entrega do empreendimento. É necessário atenção, pois os tribunais de nosso país já reconheceram esse direito ao comprador.
Além dos danos materiais, entendimento que vem se consolidando no Judiciário é o direito do comprador à indenização por danos morais, sob o argumento de que a não entrega do imóvel na data prevista contratualmente provoca angústias, noites mal dormidas ao comprador, que na maioria das vezes empreende muitos esforços para adquirir o imóvel, com privações de toda ordem, como viagens, lazer, automóveis etc. É preciso ressaltar que já existem decisões judiciais reconhecendo que o simples atraso na entrega do imóvel gera, por si só, desconforto e constrangimento e, consequentemente, direito à indenização por dano moral, por considerar que a frustração do atraso supera os meros dissabores da vida moderna (Agravo Regimental no Recurso Especial 735.353/RJ).
Os tribunais brasileiros, inclusive o Superior Tribunal de Justiça, já tiveram a oportunidade de reconhecer o dever da construtora em indenizar por danos morais o comprador que sofre com atrasos na entrega de imóveis, especialmente diante do caráter pedagógico e preventivo da punição.
Diante do atual cenário jurisprudencial, as construtoras precisam prestar atenção à data prevista no contrato para a entrega do empreendimento, pois é o ponto referencial para o nascimento do direito do comprador à indenização pelas perdas e danos advindos de sua não observância. Não se pode esquecer que quem estipula a data da entrega do imóvel é a própria construtora, a qual possui técnicas suficientes para vislumbrar os imprevistos oriundos da construção de um grande empreendimento.
No intuito de flexibilizar essa data e, consequentemente, o ponto referencial do nascimento do mencionado direito do comprador à indenização por perdas e danos, as construtoras têm estipulado uma cláusula contratual que prevê um prazo de tolerância que se inicia a partir da data estipulada para a entrega do empreendimento.
Ocorre que, para o judiciário, as mencionadas cláusulas de tolerância submetem a data da entrega do imóvel ao livre alvedrio da construtora, frustrando completamente os interesses do comprador, o que contraria o princípio da boa-fé e o equilíbrio que deve presidir as relações contratuais, pois cria uma expectativa no comprador e depois permite que a mesma seja frustrada por uma justificativa qualquer.
Em alguns contratos, a aplicação dessa cláusula de tolerância independe de qualquer justificativa das construtoras, em outros tal cláusula é aplicada quando ocorre caso fortuito ou força maior. Ocorre que, estipulam eventos completamente previsíveis em se tratando de construção civil, tais como: greves, chuvas, inadimplemento de parte dos promitentes compradores, atraso na entrega de materiais, suspensão ou falta de transporte coletivo etc.
A jurisprudência tem se pronunciado no sentido de que a data de entrega do imóvel só pode ser prorrogada em caso efetivo de força maior ou caso fortuito e desde que devidamente provada a sua ocorrência. Conclui-se, portanto, que a data da entrega do imóvel é um aspecto fundamental do contrato firmado entre as partes, razão pela qual é necessário que as construtoras tenham cautela ao, com base em contrato de adesão, estipular unilateralmente um prazo de tolerância, sem qualquer respaldo legal ou justificativa plausível.
Portanto, a elaboração dos contratos deve ser feita com muito cuidado e em observância ao equilíbrio e boa-fé contratual, afinal a legislação procura amparar aquele que é mero aderente, que no caso é o comprador. A simples assinatura do instrumento particular de promessa de compra e venda não significa que o comprador estará submetido a toda e qualquer cláusula previamente formulada, notadamente quando possuir conteúdo abusivo. Nesse sentido, a adequação dos instrumentos contratuais é um imperativo diante da realidade das leis vigentes e da interpretação que os tribunais têm adotado sobre tais controvérsias, sob pena das construtoras experimentarem severos incômodos.
Comentário meu: São muitas as reclamações quanto ao não cumprimento por parte das construtoras locais dos prazos de entrega dos imóveis. Se os compradores começarem a se organizar para cobrar das construtoras o que a jurisprudencia está consolidando, vão “quebrar” algumas construtoras em Manaus.
André Luis Bitar de Lima Garcia é advogado do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff – Advogados.
Karine Moura Pinheiro é advogada do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff – Advogados.