Imagem: José Leandro de Carvalho – 1818
O acordo entre Mercosul e União Europeia celebrado no fim de junho foi o resultado de negociações diplomáticas entre os 2 blocos que pareciam mergulhadas em impasse. As discussões duraram 20 anos. Mas as divergências que se acumulavam eram bem mais antigas. Uma delas diz respeito a algo que surgiu 211 anos atrás: a TUF (taxa de utilização de faróis), criada por Dom João 6º em 1808.
Assim que a família real portuguesa mudou-se com toda a corte de Lisboa para o Rio de Janeiro, fugindo das tropas napoleônicas, os portos brasileiros foram abertos às “nações amigas”. A corte precisava de dinheiro para pagar as contas da casa nova, então aproveitou-se a oportunidade para criar a TUF. Instituir 1 tributo no Brasil já era algo fácil. E, uma vez existindo, a tendência, como mostraram 2 séculos de história, é nunca mais acabar.
A taxa funciona como uma espécie de pedágio marítimo. Cada vez que o navio estrangeiro para no porto, paga. Se atraca em Santos depois segue a Paranaguá, o armador, dono do navio, tem de desembolsar o valor duas vezes. É algo que varia entre US$ 1.500 e US$ 3 mil, conforme o tamanho da embarcação. Para companhias que usam muito os portos brasileiros, a conta chega aos milhões de dólares anuais. Por isso a preocupação dos negociadores europeus de eliminar a cobrança.
A arrecadação anual da Receita Federal com a TUF é de cerca de R$ 120 milhões. Disso, 10% vai para a Marinha para dar conta do que a taxa reamente se propõe: a manutenção dos faróis ao longo da costa brasileira, que ainda hoje ajudam os navios a se afastar dos rochedos, sobretudo em noites de tempestade. Mesmo com os radares, a precaução extra continua sendo útil.
Os armadores europeus pagam 25% de toda a arrecadação com a TUF. Uma boa parte do trabalho dos negociadores brasileiros foi convencer a Marinha a abrir mão da receita a que têm direito. O argumento é de que isso será compensado por rearranjos no Orçamento. E também que é importante para os militares e para todo o país a assinatura de 1 acordo que irá modernizar a economia brasileira, permitindo importar mais equipamentos, por exemplo.
O acordo ainda precisa ser ratificado pelo Parlamento Europeu e pelos 4 países do Mercosul. Se for aprovado, os armadores europeus terão outra vantagem: poder fazer o comércio entre países do bloco sul-americano, algo hoje proibido.
Argentina e Uruguai não têm a a TUF. Mas, assim como o Paraguai, oneram produtos de outros países com a chamada “taxa estatística”, que varia entre 0,5% e 2,5% da mercadoria que chega ao porto. Os europeus também ficarão livres disso. Mas os brasileiros, não.
A taxa estatística é cobrada mesmo no comércio entre países do bloco, que está longe de ser 1 mercado comum, com livre circulação de produtos, a ideia inicial. É algo a ser consertado. Em entrevista ao Poder360, o secretário especial de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Marcos Troyjo, disse que o acordo com a União Europeia será a oportunidade para “dar 1 reset” no Mercosul.