“Eu quero ficar num apartamento!”

Quando fui vereador trabalhava na Câmara Municipal um cantor de músicas bregas. Ele, inclusive, era disputado nas campanhas eleitorais para animar os comícios, coisa que fazia muito bem.

Já prefeito, certa vez, esse cantor, agora aposentado, começou a ligar insistentemente para o meu gabinete querendo falar comigo. Eu estava cumprindo uma agenda externa e fui avisado. Ele insistia, dizendo que estava gravemente enfermo, não sabia mesmo se iria resistir e precisava falar comigo, pois temia não amanhecer tal era o seu estado de saúde.

Já estava anoitecendo e do meu gabinete ligaram para a Gina Sarkis, presidente da MANAUSMED, para ir até o hospital e ver o que estava acontecendo. Lá chegando, ela procurou saber o seu real estado de saúde. Não era nada grave. Tinha tido uma subida de pressão pela manhã e estava em uma enfermaria de quatro camas, com todo conforto, medicado e atendido. Inclusive, o médico disse que já ia liberá-lo para dormir em casa.

No entanto, tinha feito a maior confusão, querendo ir para um apartamento que não é coberto pelo plano de saúde da MANAUSMED. Ele, então, disse que era meu amigo e ia mostrar que falando comigo resolveria o problema.

Com essas informações, a Gina entrou na enfermaria. Estavam ele e mais três pacientes, todos bem acomodados, no ar condicionado e com bom atendimento.

— E aí rapaz, o que houve? Vim aqui a mando do Prefeito.

— Vocês tão vendo. Eu ainda tenho prestígio. O Prefeito não veio, mas mandou a doutora. Vocês vão ver como eu vou para o apartamento. Sou amigo dele desde quando ele era vereador.

E virando-se para a Gina, disse:

— Eu estou jogado aqui nesta enfermaria. Quero ir para um apartamento!

–Você não está jogado. Está sendo atendido, com todo conforto e segurança. Além disso, a MANAUSMED não pode dar apartamento, senão ela quebra e aí….

— Doutora, pelo amor de Deus, eu preciso lhe explicar. Deixe eu falar reservadamente com a senhora.

Levantou da cama, foi para um canto da enfermaria e disse:

— Doutora, a senhora sabe que eu já estou aposentado, mas ainda faço muito sucesso. Não posso ficar aqui na enfermaria porque o médico disse que eu tenho que repousar e não consigo. Aqui a minha vida é um inferno. Os outros pacientes e as suas visitas quando me reconhecem ficam pedindo o meu CD e até autógrafo. Como é que eu vou repousar?

A Gina voltou a explicar que não era possível e ele insistiu. Nessa hora, o médico entrou, tirou a pressão, fez a avaliação e disse que ele estava liberado para dormir em casa.

Ele não se fez de rogado.

— Ainda bem, doutor, vou ficar livre desse assédio dos fãs aqui da enfermaria que não me deixam em paz querendo CD e autógrafos!