ESCOLA DE TEMPO INTEGRAL PARA QUÊ?

Por Francisco R. Cruz – empresário

Com alguns séculos de atraso, em meados da década de noventa, o país finalmente acordou para a importância da educação. Em tempo recorde (1995 a 2000), praticamente, todas as crianças entre sete e catorze anos encontraram o caminho da escola. Cuidar da qualidade seria a etapa seguinte o que não aconteceu. Essa dificuldade tem anulado parte daquele esforço, pois, mais de 50% dos alunos passam pela escola sem deixar a ignorância. Elas chegam ao quinto ano reconhecendo algumas palavras, mas sem saber exatamente o sentido delas. São “analfabetos funcionais”. Versão melhorada do analfabeto.

Na tentativa de mudar essa situação o país tem titubeado. Alternam-se ações entre invencionices sem resultados, mas boas de voto e outras que podem apresentar melhorias, mas num prazo que não atende a urgência requisitada neste momento. A gestão, principal problema do setor, é colocada de lado, consolidando a nossa posição na periferia do desenvolvimento tecnológico.

Atualmente a “informatização das escolas” e a “escola de tempo integral” encantam a todos. São dois programas de uma lógica meridiana e, como tal, têm o apoio da população, portanto, com “retorno político” garantido, o que, no fim, é o que mais interessa. Não é por outra razão que constam da plataforma de qualquer agremiação partidária país afora. Uma festa para o marketing eleitoral! Preocupações dessa natureza nunca foram muito além disto, só se descobrem suas inconsistências e inviabilidades, quando os resultados não aparecem e muito dinheiro já foi gasto.

A informática, por exemplo, até agora tem servido apenas ao marketing político no caso público e ao marketing comercial na escola particular. É claro que o seu potencial é extraordinário. Mas, segundo especialistas, ainda não há nada que comprove sua eficiência no aprendizado em sala de aula, pela falta de uma adequada metodologia pedagógica em sistemas universalizados. Apesar disto, nossas escolas estão sendo entupidas com computadores e outros artefatos, aparentemente, sem que a comunidade escolar esteja preparada para tal. Há casos em que os equipamentos chegaram à escola e nunca sequer foram ligados, como, aliás, a imprensa tem noticiado.

No segundo caso, é evidente que o tempo de permanência na escola tem influência no desempenho escolar, mas, se estamos contando com essa ferramenta para mudar a qualidade da educação brasileira, como é a necessidade, seria melhor reavaliar. A escola de tempo integral só pode gerar os resultados que o país precisa se for universalizada e de forma rápida, o que torna a missão impossível. Temos muitas escolas. São quase 180 mil. Imagine o tempo que vai levar para adaptar todas elas e construir outras tantas, pois não se pode esquecer que, praticamente, todas funcionam em dois turnos. Se for levado em conta o histórico atual, o custo equivale a um PIB (Produto Interno Bruto) do país e o tempo de conclusão um século. Não temos esse dinheiro e muito menos esse tempo.

Sem analisar essa perspectiva, quase todos os estados brasileiros estão levando adiante esse projeto. Como os recursos são limitadíssimos, essa tarefa vem sendo cumprida a passos de cágado, velocidade que fere a Constituição, pois, cria uma casta de privilegiados, escolhidos, sabe-se lá sob quais critérios. E que resultados já ofereceram? Significativamente nenhum que possa ter alterado positivamente os indicadores globais da nossa educação. Tudo leva a crer que a única vantagem é representada pelo tempo de permanência em sala de aula.

Ora! Se estender o tempo resolve, a Lei de Diretrizes de Base (LDB) de 1996 já indicava uma solução mais plausível: “a jornada escolar deve ser de quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado”. Desde então as escolas deveriam funcionar nos dois turnos com essa quantidade de horas. Em vez da progressividade recomendada pela dita LDB, regredimos, pois, atualmente, a média é de três horas segundo as pesquisas. Se fosse da nossa cultura cumprir a lei, além das quatro horas determinadas, a jornada já teria sido aumentada em pelo menos uma hora. Seriam mais de duzentas horas/ano.

No trabalho de construir uma boa educação e fazer sair da sala de aula pessoas preparadas para transformar o país nas dimensões política, social e econômica, temos o dever de não medir esforços. Nesse sentido, não há justificativa alguma para que os estudantes tenham três meses de férias. Imagine-se o atraso que causa a uma criança ser interrompida pelas férias na fase de alfabetização. Ao retornar um ou dois meses depois, esqueceu tudo e tem de voltar ao ponto inicial. É dinheiro jogado fora. Há inúmeros exemplos dessa natureza. Reduzir esse período para os trinta dias convencionais é uma obrigação. Com essas duas mexidas, mais de quatrocentas horas seriam acrescentadas ao sistema, mais da metade do tempo que as crianças passam hoje em sala de aula. E, o mais importante, baixo custo e pode ser implantada para todos, sem privilégio algum, a qualquer momento.

Evidentemente que os problemas da educação vão além do aumento da jornada, mas, independentemente de outras ações que devem ser tomadas, os resultados entre quem estuda três horas (média atual) e cinco horas e meia (tempo possível) devem ser infinitamente melhores.

A escola de tempo integral, inegavelmente, é uma excelente alternativa, pena que tenha chegado com dois séculos de atraso. É um erro tentar implantá-la agora. Insistir na ideia demonstra a nossa falta de percepção de urgência, nesse momento crucial da nossa educação. Ela só teria sentido se fosse para abrigar apenas os alunos “fora de série”, uma população desconhecida e que não recebe qualquer cuidado da nação brasileira. É mais um desperdício do qual nos arrependeremos no futuro. Ou, como diz a diretora da ESCOLA BRASILEIRA DE PROFESSORES, Guiomar Namo Melo: “escola de tempo integral PARA QUÊ? SÓ SE FOR PARA OS PROFESSORES”.