Por Sandro Vaia
Francenildo Pereira, o caseiro da República de Ribeirão Preto, casa em Brasília onde Palocci e sua turma faziam algumas travessuras, foi obrigado a explicar os 38.860 reais que apareceram em sua conta corrente depois que ele testemunhou que o ministro frequentava a casa.
O sigilo de sua conta corrente foi quebrado criminosamente por alguém cujo nome nunca saberemos, porque havia a suspeita que o dinheiro teria sido depositado por alguma entidade secreta que queria criar embaraços à vida pública do ministro.
O dinheiro, soube-se depois, fora depositado por seu pai e a quebra do sigilo foi atribuída a uma ordem de Palocci, que perdeu o cargo de ministro da Fazenda (mas não o de eminência parda) e mais tarde foi absolvido da acusação na Justiça.
Outro suspeito da quebra de sigilo, o então presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, também saiu ileso do episódio.
A circulação extraordinária de 38 mil reais pela conta bancária do caseiro que não ganhava mais de mil reais por mês, dizem, chamou a atenção do COAF, Conselho de Controle das Atividades Financeiras, que investiga lavagem de dinheiro e crimes afins.
A esse mesmo COAF não pareceu estranho que durante os 4 anos em que amealhou 900 e tantos mil reais de salários como deputado, o ex-ministro Palocci efetuasse compras de imóveis no valor de pouco mais de 7 milhões de reais.
Os negócios imobiliários de Francenildo Pereira são bem mais modestos. Resumem-se a um lote de terreno na cidade de Nazário, a 25 quilômetros de Teresina, capital do Piauí, comprado por 2.500 reais e atualmente avaliado em 8 mil reais. (Caseiros também sabem fazer negócios imobiliários rentáveis). Candidamente, ele perguntou:
-Por que ele (Palocci) não explicou de onde veio o dinheiro? Na minha época, eu tive que explicar.
A pergunta, de uma lógica arrasadora, resume de forma bem esquemática a espécie diferenciada de tratamento que se dá no Brasil às pessoas normais e às pessoas que gozam de privilégios políticos, sociais ou econômicos que as tornam diferentes das demais.
Isso sim é que é gente diferenciada, não os futuros usuários do metrô de Higienópolis.
O enriquecimento fulminante do ex-ministro da Fazenda e atual ministro da Casa Civil virou o assunto político da semana e empurrou para o segundo plano a discussão do Código Florestal,além de transformar a crise da ministra Ana de Hollanda numa (para usar uma expressão cara ao companheiro Delúbio) piada de salão.
Provável vítima de fogo amigo, já que poucos duvidam que Palocci tenha mais inimigos dentro do PT do que fora dele (a prova é que, no episódio, ele foi mais afagado pela oposição do que pelos próprios companheiros), o ministro enroscou-se numa explicação vaga de uma empresa de consultoria e uma nota desastrada acusando outros ex-ministros (que por sinal continuam sendo ex) de também terem enriquecido.
O ministro parece não ter entendido direito que ninguém o acusa de nada e que enriquecer não é pecado. Basta explicar os 7 milhões, assim como obrigaram o Francenildo a explicar os seus 38 mil reais.
Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez. E.mail:svaia@uol.com.br