Por Marina Silva:
Os novos prefeitos completam três meses no cargo e começam a enfrentar cobranças e críticas. Tudo normal e democrático, afinal fizeram promessas e têm que mostrar serviço. Mas é fundamental que a boa gerência seja sustentada pela visão estratégica e pelo planejamento para enfrentar os graves problemas da mudança climática, que tanto afetam as grandes cidades. E não acho demais insistir: mais que de gerentes, precisamos de líderes que tenham visão antecipatória dos grandes desafios que se colocam nas diferentes realidades do país.
Na semana passada, voltou ao noticiário o debate sobre trânsito e poluição. O prefeito de São Paulo afrouxou de tal modo a inspeção anual de veículos que a tornou quase sem efeito no controle da poluição.
Isso não é pouco: o Laboratório de Poluição Atmosférica e Saúde da USP estima que 4.000 pessoas morrem anualmente por causa da poluição dos veículos na cidade.
Os municípios seguem o que a “gerência” nacional decide. Para enfrentar a crise econômica, o governo repete estímulos fiscais para a indústria de automóveis sem exigir contrapartidas sociais e ambientais, embora saiba, como todos sabem, que apenas empurra a crise para mais adiante e agrava os problemas urbanos.
O que pode ser feito? Há um acúmulo de conhecimento sobre a mobilidade urbana, a poluição e suas implicações econômicas e sociais, especialmente na saúde da população e nos empregos da indústria. Todos os aspectos desse complexo assunto são debatidos há anos. Mas as discussões são esquecidas e a complexidade é desprezada nas decisões políticas, que se fixam apenas nas questões levantadas pelos lobbies mais poderosos e nos efeitos eleitorais que possam ter.
No caso de São Paulo, aplicável a outras grandes cidades, foi sugerida a regulagem de veículos novos a cargo de indústrias e concessionárias, subsídios para combustíveis menos poluentes, estímulo ao transporte coletivo com maior controle de poluição e um variado conjunto de ideias que não atrapalham o desempenho da economia, mas a colocam sob nova perspectiva social e ambiental.
Penso que as decisões do poder público podem ser tomadas construindo consensos e formalizando pactos entre os setores envolvidos. Não custa ouvir quem vive os aspectos diferentes de cada problema.
As cidades não precisam ser feridas na crosta do planeta, onde se agrava a crise civilizacional. Podem ser fontes de inovação e criatividade, laboratórios de soluções sustentáveis.
Nas eleições de 2012, vários candidatos a prefeito assinaram compromisso com essa segunda opção. Os que se elegeram podem ficar certos de que ninguém precisa fazer críticas e cobranças, a própria realidade de suas cidades se encarregará disso.