Dez mais da seção de direito público do STJ

Do JOTA, por Por Bárbara Pombo, Brasília:

O balanço sobre o trabalho da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no ano de 2014 demonstra que ministros ainda se alongam em discussões sobre temas já decididos e descumprimento de prazos de publicação de acórdãos. Ao mesmo tempo, porém, os ministros conseguiram julgar temas relevantes e atingiram a marca de 22 recursos repetitivos e os marcos de assegurar a transparência de gastos públicos com cartões corporativos da Presidência da República e autorizar o bloqueio de bens em casos de improbidade administrativa.

Não à toa a sessão de julgamentos da 1ª Seção está sempre lotada. Com uma média de 100 processos pautados, raro é não ver advogados em pé nas tardes das quartas-feiras. Mas foi com o volume expressivo de casos pautados e uma queda de 20% na distribuição de processos em apenas um mês que a seção de direito público encerrou o ano passado com 2.618 decisões – uma queda de 11% sobre as 2.937 de 2013.

A autorização de acesso a dados de cartões corporativos da secretaria da Presidência da República e a permissão para bloqueio de bens em ações de improbidade administrativa não foram as únicas questões relevantes endereçadas pelos ministros da 1ª Seção. Houve, ainda, a responsabilização de sócios de empresas em débito com a União e a negativa de ajuda de custo a servidor removido a pedido. O JOTA publica a lista dos dez principais temas decididos em 2014 mais abaixo.

Na área tributária, definições sobre o recolhimento ao INSS de contribuição previdenciária sobre verbas trabalhistas marcaram o ano. Em repetitivo, os ministros decidiram não haver a tributação sobre o terço de férias gozadas, aviso prévio indenizado e os 15 primeiros dias de afastamento que antecedem o auxílio doença. Por outro lado, determinaram o recolhimento previdenciário sobre os salário-maternidade e paternidade, além de horas extras, adicional noturno e de periculosidade. Em 2015, a discussão relativa à incidência da contribuição previdenciária sobre as férias gozadas deve ser solucionada pela Corte.

O ano que se inicia, aliás, reserva julgamentos impactantes para o Fisco e contribuintes, como a definição em recurso repetitivo sobre o conceito de insumo para abatimento de créditos de Pis e Cofins, a inclusão do Imposto sobre Serviços (ISS) no Pis e na Cofins, a cobrança de Imposto de Renda sobre juros de mora pelo atraso no pagamento de benefícios previdenciários e a definição da sistemática da contagem da chamada prescrição intercorrente, que pode dar fim a 70% das execuções fiscais em trâmite.

Publicação

No início de 2015, os ministros também deverão se debruçar sobre um problema que, apesar de envolver todo o STJ, tem sido especialmente relatado por integrantes da 1ª Seção: o descumprimento do prazo para publicação de acórdãos. “Ninguém cumpre, mas o prazo previsto no regimento é de 20 dias”, afirma Martins, que tem defendido alterar o prazo para 60 dias. Outra proposta, do ministro Mauro Campbell, altera o regimento para determinar a publicação em 30 dias.

Na 1ª Seção, nem todas as decisões proferidas ao longo de 2014 haviam sido publicadas até o dia 11 de dezembro. De acordo com o balanço ao qual o JOTA teve acesso, 118 acórdãos ainda pendiam de publicação o que, na prática, impede a parte vencedora de sentir o efeito prático do serviço prestado pelo Judiciário.

Na entrevista abaixo, o ministro Humberto Martins, de 58 anos, fala sobre essa questão e a dinâmica de trabalho na seção que presidirá até agosto.

O senhor afirma que o prazo para publicação dos acórdãos não tem sido cumprido. Como fazer, então, para que seja?

Com o próprio regimento que será modificado agora. Só quem pode punir o ministro por excesso de prazo é o CNJ. Há ministros que não apresentam logo o voto vogal ou o voto-vista. O jurisdicionado fica prejudicado pelo não cumprimento de um prazo razoável para a publicação. Na seção, eu recomendei a juntada em 15 dias. Decorrido os 15 dias eu determino a publicação.

Isso tem acontecido muito?

Quando a parte reclama, sim. Muitas vezes demoro um pouco porque a parte não está reclamando, quer dizer, demoro a cobrar a coordenadora da sessão para que faça a publicação.

Qual tem sido a dificuldade para vencer a pauta de julgamentos?

A grande verdade é que [os ministros] começam a discutir, debater e levam muito tempo, principalmente em matérias que já foram decididas. Em matéria de improbidade, por exemplo, um ministro que não vou dizer o nome, mas que todos sabem sempre será vencido, leva 30, 40 minutos argumentando e não vai convencer ninguém e deixamos de julgar alguns processos nesse período. Por isso, a última sessão do ano começou as 9h. Vencemos toda a pauta. O regimento permite estender a sessão em caso de necessidade e, infelizmente, tenho aplicado o regimento direto para ter maior produtividade e efetividade no julgamento.

Mais de 100 processos têm sido pautados a cada sessão. Há necessidade de enxugar a pauta para cumpri-la em uma tarde?

A regra é julgar todos no dia em que foram pautados. Adiamentos são excepcionais. Quando noto que há sustentações orais das duas partes em repetitivos eu começo mais cedo porque o tempo não dá. Não é apenas por causa dos debates, mas porque as sustentações só em um processo levarão 30 minutos. Quando vejo que não dará tempo de vencer a pauta começamos mais cedo na próxima e regularizamos.

Já foi cogitada a realização de sessões temáticas, questões de direito administrativo em um dia e casos tributários em outro? Há como organizar as sessões dessa forma?

Há, mas de comum acordo com o colegiado. Essa proposta ainda não chegou à presidência. Há ideias isoladas de ministros, como julgar apenas teses repetitivas em um período da sessão.

Como a 1ª Seção tem sentido os efeitos do Núcleo de Repercussão Geral e Recursos Repetitivos (Nurer)?

De um mês para outro a distribuição [de processos] caiu em torno de 20% apenas na 1ª Seção em razão do filtro que tem sido feito. Antes essa triagem era responsabilidade dos gabinetes. Hoje, só são distribuídos após a verificação da admissibilidade.

Sentimos também os efeitos porque o Nurer enviou para os ministros os processos que estavam demorando nos gabinetes para dar maior agilidade. Esses processos estão represando ações na origem por ausência de decisão. Em dois dos casos indicados pelo Nurer nós cancelamos a afetação [como repetitivo] e decidi monocraticamente, liberando os processos na origem. Em um deles só havia outros 9 processos discutindo o tema na origem e no outro havia um óbice processual.

Há um número de corte para estabelecer se a tese é ou não repetitiva?

Se entendermos que as teses ainda podem tramitar em número grande junto aos tribunais podemos resolver com um número pequeno de casos sobrestados. Depende mais de percepção e intuição do julgador. Mas os tribunais de origem já estão indicando para o STJ se a tese é repetitiva. Mesmo com a indicação, o ministro faz o juízo de valor para decidir pela afetação. Podemos julgar o caso apenas para fixar o entendimento da 1ª Seção e não o entendimento da seção em repetitivo, que tem uma força quase vinculante.

A composição da 1ª Seção foi alterada significativamente nos últimos dois anos com a aposentadoria de quatro ministros (Castro Meira, Eliana Calmon, Ari Pargendler, Arnaldo Esteves). Em 2015, o ministro Napoleão Nunes Mais Filho se aposentará. Como mudança tem afetado o trabalho e a jurisprudência da Corte?

Há uma influência muito grande porque muitas vezes os novos ministros podem ter entendimentos pessoal diferente. Quando a composição muda a jurisprudência oscila. Pessoalmente, acho que gera insegurança ao jurisdicionado e a estabilidade da jurisdição e manutenção da jurisprudência. Se no seu tribunal de origem votava diferente chegará aqui e manterá o entendimento.  Traz instabilidade em relação a segurança jurídica.

Qual a opinião do senhor sobre a regra de aposentadoria compulsória aos 70 anos?

Sou favorável que não haja aposentadoria compulsória desde que o magistrado esteja produzindo bem e na sua melhor capacidade intelectual. [A atuação do magistrado] deveria ser prolongada de acordo com a capacidade dele de produção. Acho que o juiz não deixa de estar apto quando atinge os 70 anos. Até porque pode estar no auge culturalmente e na sua produção. O juiz atualizado nunca envelhece e o jovem desatualizado está velho. O juiz deveria sair muito mais cedo, antes dos 70 anos, se não está produzindo. Assim como o juiz produtivo e no seu melhor nível intelectual deveria ficar além dos 70 anos.

Os dez mais de 2014, na visão da presidência da 1ª Seção:

1. Não incide contribuição previdenciária sobre o terço de férias para empregados celetistas. EREsp 973.125/SC, relatora ministra Assusete Magalhães, julgado em 5/12/2014.

2. Obrigação da Presidência da República de fornecer, via Lei de Acesso à Informação, as informações de gastos corporativos da presidente e do vice-presidente da República.  MS 20.895/DF, relator ministro Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 12/11/2014.

3. Recurso repetitivo: Possibilidade de responsabilizar sócio da empresa que possui dívida não-tributária com a União diante de indícios de dissolução irregular. REsp 1371128/RS, relator ministro Mauro Campbell, julgado em 10/9/2014.

4. Reafirmação de jurisprudência: Neto inválido de servidor público tem direito à pensão, em equivalência ao filho, se possível a interpretação da lei local com atenção ao princípio da dignidade humana. Rcl 8478/MG, relator para o acórdão ministro Mauro Campbell, julgado em 13/8/2014.

5. Recurso Repetitivo: Possibilidade de o juiz bloquear cautelarmente os bens do réu em ações de improbidade administrativa, sendo desnecessário comprovar a tentativa de ocultar ou dilapidar o patrimônio. Resp 1366721/BA, relator para o acórdão ministro Og Fernandes, julgado em 26/2/2014.

6. Legítima a cobrança da tarifa de esgoto mesmo que não haja o serviço de esgotamento sanitário. Rcl 12312/RJ, relator ministro Herman Benjamin, julgada em 27/8/2014.

7. Recurso Repetitivo: Profissionais com licenciatura em educação física só podem atuar na educação básica. As demais funções são reservadas aos bacharelados. REsp 1361900/SP, relator ministro Benedito Gonçalves, julgado em 12/11/2014.

8. O contribuinte em boa–fé não está obrigado a arcar com multa e juros se a fonte pagadora não efetuar a retenção do tributo devido. EREsp 1334749/AL, relator ministro Sergio Kukina, julgado em 22/10/2014.

9. Servidor público removido do cargo a pedido, mesmo que por processo de remoção, não possui direito à ajuda de custo. Pet 8345/SC, relator ministro Humberto Martins, julgado em 8/10/2014.

10. Mantida a portaria do Ministro da Justiça que determina a delimitação das terras dos índios da etnia Guarani-Kaiová. MS 16792/DF e MS 16850/DF, relator ministro Humberto Martins, julgados em 24/9/2014.