Osíris Silva
A produção de alimentos no Amazonas devia ocupar o centro das preocupações de governantes e da classe política. As representações dos produtores – sindicatos, associações, cooperativas, Federação da Agricultura e Pecuária do Amazonas (FAEAM) à frente – fazem sua parte. Organizam-se, mobilizam a assistência técnica, órgãos de pesquisa, entidades creditícias, lutam pela solução da grave questão fundiária que, em determinados casos, se arrasta por séculos. Esse esforço, entretanto, torna-se infrutífero – muitas vezes frustrante – exatamente por não contar com apoio explícito de políticas públicas de Estado voltadas a criar ambiência e medidas concretas no que pertine a) avanços de tecnologias de produção (envolvendo variedades agrícolas ajustadas às nossas condições de solo e clima; raças de animais, uso sustentável de pastos, fertilizantes e defensivos), b) extensão rural e c) ao estabelecimentos de prioridades adequadas às vocações das mesorregiões determinadas pelo Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE), ainda pendente no Amazonas. Fora desses balizamentos técnicos resta o improviso, a ação político-eleitoreiras com prazo de duração restrito e pré-determinado.
O Amazonas já contou com algumas iniciativas interessantes voltadas ao estímulo da produção. O programa Pró-Horta, desenvolvido pela Emater na época do governo José Lindoso (1979-1982) teve como objetivo mobilizar as comunidades das periferias das cidades (capital e interior) para implantação de áreas de produção de hortaliças e legumes. Foram utilizados, num primeiro momento, espaços ociosos de escolas pública, junto às quais técnicos agrícolas e assistentes sociais realizavam minucioso trabalho de motivação comunitária e aprendizagem de técnicas produtivas básicas. Os custos-benefícios foram impressionantes. Com muito poucos recursos investidos os resultados de produção superaram as expectativas. O produto era consumido pela própria comunidade e o excedente comercializado nas feiras. Lamentavelmente, os governos seguintes além de não darem continuidade ao projeto, extinguiram a Emater. E assim voltamos praticamente à estaca zero. Hortas comunitárias, diante da crise econômica e do desemprego, estão hoje se proliferando em diversas cidades brasileiras. Em Manaus e nas sedes municipais do interior do Estado, contudo, o assunto permanece ignorado.
Em seminários e reuniões técnicas o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) vem demonstrando técnicas de aproveitamento de potencialidades da biodiversidade amazônica; como transformá-las em produtos de acordo com tecnologias que possam gerar emprego, renda e melhoria de vida para a população. O trabalho é realizado envolvendo várias frutas e plantas da região – cereal matinal de açaí e de pupunha, vinagre de cubiu, camu-camu desidratado (liofilizado) e biofilme de cará. Tais tecnologias foram apresentadas durante a 70ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada de 22 a 28 deste mês, na Universidade Federal do Alagoas (UFAL), em Maceió.
Referência mundial nos estudos de biologia tropical, o Inpa se dedica a projetos de pesquisa e extensão, palestras e exposições sobre novas tecnologias de produção de alimentos. Os exemplos são extensos e variados, mas pouco aproveitados pelo governo e classes produtivas. No Amazonas persiste danoso distanciamento pesquisa-empresa em prejuízo da alavancagem do setor primário. No caso das tecnologias de alimentos, os resultados do Inpa comprovam a importância de superalimentos como o camu-camu, rico em vitamina C, para a proteção e recuperação da saúde. Igualmente, mostram ser possível aproveitar frutos regionais de forma tecnológica, agregar valor, melhor o potencial nutricional dos alimentos, além de aumentar o tempo de prateleira para torná-los viáveis para a indústria. Exemplos importantes: o cereal matinal e o biofilme de cará, em forma de fécula, que atua no controle do colesterol.
Manaus, 30 de julho de 2018.