Editorial de O GLOBO, de hoje 27.01.2018, que merece a reflexão de todos nós.
Serafim Corrêa
Além de descaso com o crescimento autônomo dos gastos com pessoal, também existe incompetência
Tema mantido na agenda do país no mínimo há mais de duas décadas, a reforma da Previdência voltará à apreciação do Congresso, e os parlamentares brasileiros têm mais uma chance de adequar a seguridade aos novos padrões demográficos, que continuam a se alterar à medida que a população envelhece. Os políticos têm se recusado a fazer o ajuste necessário durante todo este tempo —não atacam para valer causas estruturais do déficit previdenciário —, preocupados apenas com os votos em cada eleição. Pois criam, com o passar do tempo, situações de extrema gravidade que prejudicam os mesmos eleitores que alegam defender. Não só no plano federal, mas em toda a Federação. Deveriam prestar atenção à crise fiscal nos estados, cada vez mais visível. E, por trás dela, está em boa medida a elevação das despesas previdenciárias (aposentadorias e pensões), que aumentam de maneira autônoma, em um momento de arrecadação tributária anêmica, devido à lenta recuperação da economia. E como a inflação está baixa, governantes não podem usá-la para reduzir as despesas em termos reais. Quando a moeda perde poder aquisitivo em alta velocidade, qualquer atraso em pagamentos embute um desconto. Daí a inflação funcionar contra a população, principalmente a mais pobre, e em favor do Estado.
Há de tudo nesta crise, inclusive má administração, além da leniência diante do crescimento das despesas com pessoal, em que se incluem aposentadorias e pensões, tanto que há estados em melhor situação que outros. Não se pode, também, tirar responsabilidade de Casas legislativas (assembleias estaduais e câmaras de vereadores), e não se deve esquecer os tribunais de contas, instituições vitais para manter a saúde fiscal da Federação, mas que costumam ser cooptados pelo Executivo e Legislativo, a fim de fazerem vista grossa diante de graves infrações à Lei de Responsabilidade. Sem punição, a delinquência fiscal continua. Goiás acaba de decretar “falência financeira” por 180 dias, aprovada pela Assembleia. Com uma dívida de R$ 3 bilhões, o estado passou para a administração do governador Ronaldo Caiado com apenas R$ 11 milhões no caixa.
Goiás vive a dura situação de ainda não atingir índices de dificuldades que o permitam se candidatar ao Regime de Recuperação Fiscal, como fez o Rio de Janeiro, mas não consegue se reerguer sem ajuda. E mesmo com auxílio do Tesouro, se não houver comprometimento do governo, de pouco adiantará.
Na fila da UTI fiscal estão ainda Minas, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Roraima e Mato Grosso. Para todos, é essencial que venha uma reforma da Previdência que os permita executar o ajuste que não têm condições políticas de fazer sozinhos. Precisam mobilizar suas bancadas no Congresso.