Em vários locais, a juventude está indo às praças; no mundo árabe, lutando pela democracia, acampados nas praças, como a Tahrir, no Egito; nos países europeus, por emprego, como na Praça Catalunha, em Barcelona, e no Portal Del Sol, em Madrid.
Tanto no mundo democrático da Europa, quanto no Egito, sem democracia, a juventude está carente de mudanças, descontente com os rumos da sociedade em que vive. Seja por falta de democracia, de emprego, de paz, de lazer ou de cultura.
No Brasil isso não está acontecendo. Aparentemente, nossos jovens estão contentes, mas, na verdade, eles não percebem a corda bamba por onde caminham ao longo da vida.
A infância, a adolescência e a juventude brasileira caminham sobre uma corda bamba, da qual milhões vão caindo antes mesmo de chegar à idade adulta.
Logo no início da vida, crianças caem da corda bamba por falta de uma UTI infantil ou porque as mães são desprezadas pelos pais e terminam abandonando o recém-nascido.
Milhões de crianças, que sobrevivem às primeiras horas de vida, continuam na corda bamba por falta de comida, de brinquedos, de estímulos educacionais, sem escolas maternais e sem o acompanhamento de mães preparadas ou de creches com qualidade. Caem da corda antes mesmo de começarem a caminhar.
Das que sobrevivem aos primeiros anos, milhões nem ao menos conseguem chegar à escola. Depois de caminhar alguns anos na corda caem logo depois, por não conseguirem entrar na escola, ficarem sem o desenvolvimento intelectual necessário e seguirem na vida sem as ferramentas básicas necessárias à vida moderna, tais como, emprego, renda e acesso aos serviços essenciais.
Mesmo as que entram na escola, continuam caminhando sobre a corda bamba. A pobreza das famílias e a má qualidade da escola expulsam a maioria delas antes mesmo do final do Ensino Médio. São derrubadas da corda, jogadas no chão, sem alternativas.
Das que concluem o Ensino Médio, mais da metade não teve um ensino de qualidade e, por isso, não entrará no Ensino Superior, nem em um curso profissionalizante competente, ou entrará, mas abandonará o curso por incapacidade de segui-lo até o final.
Pode até obter um diploma, porém sem conhecimento superior e ficará sem emprego de nível e renda superiores.
Ao longo de todo esse tempo, e mesmo depois, essas crianças, adolescentes e jovens estarão em uma corda bamba que ameaça derrubá-las pela morte violenta antes do tempo, pela droga que age como o motor do balanço da corda por onde caminham os jovens.
Um amigo, uma decepção, uma cobrança, o simples trago em um cigarro errado ou num copo de bebida pode empurrar o jovem para a queda com uma pequena chance de recuperação.
Mesmo os que não caem por força do empurrão das drogas, caem pela ociosidade, sem escola e sem emprego.
Mas não é apenas a escola sem qualidade e a falta de renda da família que derrubam crianças, os adolescentes e jovens de renda média e alta também caminham por uma corda bamba, pela falta de atividades e por causa de uma escola aparentemente boa, em comparação com as péssimas. Ou porque também correm o risco do consumo de drogas ou da droga do consumismo.
Move a corda também à alienação da voracidade do superconsumo para aqueles que aparentemente chegaram ao outro lado, mas vivem sacrificando a vida para o enriquecimento sem valor existencial.
E quase sempre se endividando, seja pela dívida consigo mesmo, por não atender aos desejos de consumo de luxo, seja pelo endividamento com os bancos para poder comprar o luxo que desejam. Endividam-se pelos desejos de compras não realizadas ou com os bancos pelo financiamento para realizá-los.
Concorre para mover a corda, a corrupção na política. Não apenas pelo desperdício de recursos públicos que vão para os bolsos de alguns, ao invés de ir para as políticas públicas, com investimentos para os jovens. Pesa também a decepção e a alienação que excluem os jovens da participação política.
No Brasil, atravessar os anos antes da vida adulta é caminhar sobre uma corda bamba, balançando constantemente diante da omissão do setor público, da desarticulação das famílias, da necessidade do consumo, da violência da droga e, sobretudo, por falta do estável terreno da educação de qualidade assegurada a todos.
Cristovam Buarque é professor da Universidade de Brasília e senador pelo PDT/DF