Por Bruna Suptitz- Jornal do Commercio UOL
A principal novidade da eleição de 2018 será a criação do fundo especial de financiamento de campanha, uma fonte de recursos públicos específica para este fim, além do que já é destinado anualmente às legendas por meio do fundo partidário. Esta deverá ser a mudança que causará maior impacto aos políticos e postulantes a um cargo eletivo.
Previsto no orçamento da União para 2018 em R$ 1,7 bilhão, o montante será distribuído majoritariamente de acordo com a representação partidária no Congresso Nacional. Contudo não há definição objetiva do critério para acesso aos recursos.
Para o eleitor, o mais perceptível deverá ser o fim da propaganda partidária gratuita e obrigatória, que deixará de ser exibida nos anos sem eleição e fora do período de campanha no ano eleitoral. A partir de 2018, a aparição de partidos em emissoras de rádio e televisão ficará restrita à propaganda eleitoral obrigatória no período de campanha ou nos debates entre os candidatos.
A medida tem relação direta com a criação do fundo de financiamento de campanha. Deixará de ser concedida isenção de impostos a empresas de comunicação em troca da cedência do espaço aos partidos, e essa será uma das fontes dos recursos que abastecerão o fundo – a outra parte virá das emendas parlamentares de bancadas.
Essas são duas das mais de 10 mudanças a valer no próximo pleito. Aprovados às pressas entre o final de setembro e o início de outubro, para que pudessem ser sancionadas pelo presidente Michel Temer (PMDB) a tempo de valer para a eleição de 2018, muitos dos itens deverão ser alvo de regramento via resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a ser publicada até 5 de março.
Na avaliação do advogado eleitoralista Antônio Augusto Mayer dos Santos, o que o Congresso Nacional aprovou como sendo reforma política transformou-se novamente em uma reforma eleitoral, com impacto imediato e pouco aprofundamento.
“A reforma política passa por repensar os cenários institucionais, ultrapassa a eleição”, sustenta. Para ele, o próximo pleito será um experimento. “Não acredito que essas regras possam vir a permanecer constantes sob ponto de vista definitivo”, completa.
Para o advogado Lucas Lazari, membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), “é natural se fazer alterações na legislação eleitoral a cada dois anos, porque é muito difícil uma reforma que altere todo o sistema de uma vez só”. Por esse motivo, ele acredita que serão votadas novas mudanças para a eleição de 2020.
Confira o que muda para o pleito de 2018 e a avaliação de especialistas
FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA
Passa a valer em 2018 um fundo com recursos públicos, que será utilizado pelos partidos especificamente para financiamento das campanhas, com fonte de custeio específica, sem criar despesa extra aos cofres públicos* e com regramento para a distribuição do montante entre os partidos, que terão acesso ao recurso somente em ano eleitoral. Para a distribuição no primeiro ano de vigência, será considerada a atual composição do Congresso. É diferente do fundo partidário, que continua existindo e é distribuindo anualmente.
Composição do fundo:
30% oriundo dos recursos reservados para emendas parlamentares de bancadas
70% oriundo dos impostos arrecadados de emissoras de rádio e televisão no ano da eleição e no ano imediatamente anterior
Distribuição:
2% igualmente para todos os partidos políticos
35% para os partidos que tenham ao menos um deputado federal
48% para os partidos constituídos na câmara dos deputados
15% para os partidos com senadores filiados
Avaliação:
Sobre a criação do fundo, Lazari entende que “mais que uma opção, foi uma necessidade depois que o STF proibiu a doação de pessoa jurídica, que eram os principais, senão os únicos doadores das campanhas eleitorais até o pleito de 2014”.
O acesso aos recursos por parte dos candidatos também é tema de debate. Santos acredita que isso passará pelo “prestígio” que o político tem dentro das cúpulas partidárias, já que não há regramento quanto à distribuição, uma vez que o recurso tenha chegado ao partido. Lazari também vê como problema, usando como exemplo o fundo partidário dividido nos diretórios nacionais, “que distribuem o dinheiro para quem tiver boas relações com o presidente nacional. Dificilmente chegam nos municípios”.
Outro ponto de avaliação é a origem do dinheiro para abastecer o fundo. Para Santos, a alegação de que não tira recurso de outras áreas não é válido. “Não é um valor novo, mas é subtraído, um realocamento de receita, em que haverá na origem um prejuízo”. Lazari complementa: “vai ter redução das emendas parlamentares para compor o fundo eleitoral”.
Ainda poderá ser objeto de controvérsia a definição dos percentuais de divisão, que apresenta diferença entre “partidos com ao menos um deputado federal” e “partidos constituídos na câmara dos deputados”. Para Santos, faltou objetividade nessa definição, por se tratar de receita de fonte pública. Ele acredita que este será um dos itens da reforma que o TSE deverá modular.
*com recursos já previstos, exceto para 2018, pois as empresas de comunicação já tiveram a garantia de isenção fiscal em 2017
FIM DOS PROGRAMAS PARTIDÁRIOS NA TV
As emissoras de rádio e televisão não exibirão mais, a partir de janeiro, a propaganda partidária obrigatória e gratuita, espaço que servia como compensação fiscal de impostos que não eram pagos por essas empresas de comunicação. Os recursos que serão arrecadados com esses impostos irão para o recém criado fundo especial de financiamento de campanha.
Com isso, não serão mais exibidas propagandas de partidos em rádio e televisão nos anos sem eleição e, em anos eleitorais, fora do período de campanha. A legislação proíbe a propaganda paga nesses veículos. Fica mantida a propaganda eleitoral obrigatória, em período de eleição, com as mesmas regras vigentes.
DEBATES
Passa a ser obrigatório o convite para debates, em emissoras de rádio e televisão, de candidatos ou coligações com representação de no mínimo 5 deputados federais. A regra vigente na eleição de 2016 estabelecia convite obrigatório para o debate a partir de 9 deputados representados. Antes disso, a exigência era de representação na Câmara dos Deputados, bastando para isso um parlamentar com assento na Casa.
PRAZO PARA CRIAÇÃO DE PARTIDO ANTES DA ELEIÇÃO
Será permitido concorrer à eleição partidos com registro até seis meses antes do pleito – em 2018, registrados até 7 de abril. Prazo anterior era de uma ano. O mesmo prazo valerá para o domicílio eleitoral do candidato na circunscrição em que irá concorrer. “Embora talvez não tenha relevância em termos de atualização, sob o ponto de vista jurídico formal é muito importante. Se surgir um novo partido político, poderá absorver a candidatura de alguém que hoje não é candidato”, explica Santos.
CLÁUSULA DE DESEMPENHO
Os partidos precisam atingir um desempenho eleitoral mínimo para ter direito a tempo de propaganda durante o período eleitoral e acesso ao fundo partidário. Para 2018, os partidos terão que alcançar, pelo menos, 1,5% dos votos válidos, distribuídos em, no mínimo, nove estados, com ao menos 1% de votos válidos em cada um deles; ou então eleger pelo menos nove deputados, distribuídos em no mínimo um terço das unidades da federação (nove). As exigências aumentarão gradativamente até 2030.
Para Santos, a medida vai impor aos partidos a necessidade de expandirem suas organizações e qualificar a nominata, pois será preciso desempenho na eleição. Lazari acredita que os partidos, principalmente os médios, vão focar na eleição para deputados federais, cargo considerado para a garantia dessa representatividade.
PERÍODO PRÉ-CAMPANHA
A partir da eleição de 2018, é possível a arrecadação de valores previamente ao registro da candidatura. “Isso é uma maneira de sustentar a pré-campanha”, explica Santos. “Distensiona uma situação nebulosa, porque o pré-candidato dispõe de alguns benefícios, como declarar a pretensão de concorrer”, completa. Caberá ao TSE estabelecer as regras, como a o período para o início da arrecadação, os documentos exigidos na abertura de conta, o que deverá ser declarado e o que fazer com a eventual sobra de recurso.
ARRECADAÇÃO
A partir do próximo pleito, será permitido aos candidatos arrecadar recursos em campanhas online, através de sistema de crowdfunding, a partir de 15 de maio do ano eleitoral. Também estão permitidas a venda de bens e serviços e a promoção de eventos de arrecadação.
LIMITE PARA DOAÇÕES
Empresas seguem proibidas de realizar doações para campanhas eleitorais. Pessoas físicas podem doar até 10% do seu rendimento bruto, declarado no ano anterior à eleição. O limite para autofinanciamento – candidato que utiliza recursos próprios para a campanha – havia sido vetado pelo presidente Temer quando sancionou o texto da reforma, em outubro, porém o veto foi derrubado no Congresso na semana passada. Com isso, o autofinanciamento por candidatos fica condicionado ao limite para doações de pessoa física. A dúvida é se o novo texto valerá para 2018 ou somente a partir de 2020, já que a alteração se deu fora do período de um ano antes da eleição seguinte.
LIMITE PARA GASTO EM CAMPANHA
Ficam estipulados os seguintes limites de gastos em campanhas, por candidatura, conforme os cargos em disputa:
Presidente da República – R$ 70 milhões em primeiro turno e R$ 35 milhões em segundo turno.
Governador – o limite de gastos vai variar de R$ 2,8 milhões a R$ 21 milhões e será fixado de acordo com o número de eleitores de cada estado, apurado no dia 31 de maio do ano da eleição.
Senador – o limite vai variar de R$ 2,5 milhões a R$ 5,6 milhões e será fixado conforme o eleitorado de cada estado, também apurado em 31 de maio do ano da eleição.
Deputados Federal – R$ 2,5 milhões.
Deputados Estadual ou Deputado Distrital – R$ 1 milhão.
SITUAÇÕES EXCLUÍDAS DO GASTO DE CAMPANHA
Deixa de contar como gasto de campanha, para fim de prestação de contas:
– Combustível e manutenção do veículo utilizado pelo candidato na campanha eleitoral.
– Gastos atrelados ao condutor do veículo.
– Alimentação e hospedagem do candidato e o uso de até três linhas telefônicas particulares pelo candidato durante a campanha eleitoral.
Avaliação:
Para Santos, essas questões deverão ser objeto de regramento, pelo TSE, quando lançar a resolução sobre os gastos de campanha. Ele antecipa entendimento de que deverá se tratar de apenas um veículo e um motorista atrelado à condução desse veículo, já que a redação da matéria está no singular.
MUDANÇA DE CÁLCULO PARA DISTRIBUIÇÃO DE SOBRAS
A forma do cálculo para distribuição das chamadas “sobras de vagas” nas eleições de deputados e vereadores foi alterada. No sistema proporcional, a distribuição de vagas se dá pelo quociente eleitoral. Até a eleição anterior, as vagas que sobravam eram distribuídas entre os partidos que tivessem eleito no mínimo um parlamentar. Com a nova regra, a vaga será destinada ao próximo candidato com maior número de votos, mesmo que o partido ou a coligação não tenham atingido o quociente.
Lazari considera esta, junto com a redução de deputados federais a contar para garantir a participação nos debates, uma das mudanças que beneficia partidos pequenos. –
Fonte: Jornal do Comércio (http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2017/12/especiais/perspectivas_2018/602384-campanhas-eleitorais-terao-novas-regras.html)