Alfredo MR Lopes (*) alfredo.lopes@uol.com.br:
Em clima de escassez do precioso líquido, racionamento em vários estados – no interior paulista quem for flagrado no desperdício de água paga multas pesadas – o Brasil segue fechando a tramela depois que o ladrão arromba a porta pra fazer a própria festa. Sem planejamento nem água nas represas, é automática a redução na oferta de energia, e o estrago da irrigação precária é fatal ao agronegócio. Pois bem, com a instalação de laboratórios de Aquicultura e Pesca Fluvial, Eco-Hidroinformática, Centro de Saberes e Cuidados Socioambientais da Bacia do Prata; Educação Ambiental e Laboratório de Micro-organismos ambientais e patogênicos na água, entre outros, no Parque Tecnológico de Itaipu, no município de Foz do Iguaçu, foi criado o Instituto Nacional das Águas, através de Lei 12954/14, sancionado pela presidência da República, nesta quarta-feira. A iniciativa, que foi debatida no Congresso, onde a região conta com uma bancada parlamentar descoordenada e servil, não inclui manifestação nem representação da Amazônia, 60% do território nacional, e com um quinto da água potável do planeta, segundo o IBGE, entre outros acervos.
É esta região, ademais, que abriga o aquífero Alter do Chão, um reservatório que alcança o Estado do Amazonas, Pará e Amapá, com 86 mil km³ contra 46 mil km³ pertencentes ao aquífero Guarani, sem a plataforma de rochas que o recobre, complicando o acesso. Alter-do-Chão, entretanto, é configuração arenosa e acessível como reserva estratégica, segundo pesquisas da Universidade Federal do Pará. De quebra, há três anos, estudos do Observatório Nacional, à frente o cientista Valiya Hamza, orientador da tese de Elizabeth Tavares Pimentel, da Universidade Federal do Amazonas, mostraram evidências de um rio subterrâneo de 6 mil quilômetros de extensão que corre embaixo do Rio Amazonas a uma profundidade de 4 mil metros com mesmo sentido de fluxo. É o Rio Hamza, em homenagem ao pesquisador indiano, que trabalhou dados de temperatura de 241 poços profundos perfurados pela Petrobrás nas décadas de 1970 e 1980. A descoberta acontece pouco depois dos geólogos italianos acharem um rio subterrâneo que corre embaixo de Roma, mais extenso que o Tibre – o terceiro maior da Itália, com 392 quilômetros.
O alerta sobre a criação da façanha federal do Instituto das Águas foi dado pelo físico Ennio Candotti, do Museu Amazônia, que também perguntou sobre o silêncio obsequioso da comunidade local – parlamentares, cientistas e jornalistas incluídos – sobre a iniciativa dos estudos de viabilidade para a construção de uma hidrelétrica nas corredeiras do Alto Rio Negro. Contrato já firmado pela Empresa de Pesquisa Energética do Ministério das Minas e Energia – que não dá colher de chá para energia solar – com a consultoria IGPlan, realiza até novembro próximo “serviços técnicos especializados para elaboração de estudos para o diagnóstico socioambiental e dos usos múltiplos da água da bacia do rio Negro, desde a região das cabeceiras inseridas no território nacional até a confluência com o rio Amazonas”. Casa de Mãe-Joana! Aí estão concentradas as principais etnias do Estado e os maiores parques de conservação ambiental. E para os amantes da flora, o bioma dessa bacia guarda 75% das bromélias e orquídeas catalogadas no planeta! O principal município do Alto Rio Negro é São Gabriel da Cachoeira (a 858 quilômetros de Manaus), com 90% de população indígena. A virtual hidrelétrica e a criação do Instituto Nacional das Águas sem a inclusão, ou debate estratégico, cientifico ou pecuniário com a comunidade da Pátria das Águas, como definiu a Amazônia o poeta Thiago de Melo, dão mostras da abordagem rasteira, irresponsável – posto que desprovida de conhecimento e compromisso – que descreve historicamente o olhar para a Amazônia da União federal.
A definição de gabinete das 29 hidrelétricas no bioma amazônico, 7 já em andamento, faz lembrar a iniciativa do projeto de um megalaboratório laboratório nacional chamado BioBrasil que ainda circula nas rodas politicas para definição da paternidade eleitoral, a ser construído, possivelmente, em Salvador, para utilizar o banco nacional de germoplasma. Pois é, nesse baile de alegorias nutracêutica, que já contabiliza meio bilhão de reais de recursos do BNDES, o portfólio genético da Hileia foi barrado. E o poderoso Grupo de Trabalho ministerial que libera o Processo Produtivo Básico demorou mais de quatro anos para liberar o PPB de um laboratório que se recusou a entrar na festa. A iniciativa empresarial foi desenhada com os paradigmas do plano de negócios da criação da Bioamazônia, há 14 anos, sem a floresta, porém.
Manter a floresta em pé, o imperativo categórico dos duendes malignos do imobilismo, é uma conversa mais obscena do que aparentemente se revela. Seus arautos integram o mesmo grupo de duendes que boicotam a modernização portuária da economia nacional e tem argumentos de sobra para estimular a estratégia ideológica, mercadológica e intercontinental do porto cubano de Mariel. “Não é porque você é paranoico que as pessoas param de lhe perseguir”, diziam os psiquiatras da Contracultura nos anos 60 da Guerra Fria. O projeto cubano – esboçado pela rapaziada arrojada do Itamaraty – foi aplaudido por setores da mídia europeia, que revelaram uma inconfidência guardada há sete chaves em alguns escaninhos do Planalto Central: além de recursos do BNDES, a área alfandegada de Mariel, 50 vezes maior que a área da ZFM, vai receber uma ZFM, sim, e com base ecológica, muito parecida com aquela que um dia o ministro do Desenvolvimento recomendou para os empresários locais. Além da modernização portuária, torcida e muita macumba pela suspensão do embargo americano, comércio à moda panamenha etecetera e tal, Cuba terá uma ZFM. Havana e adjacências têm mais farmacêuticos do que médicos desempregados. Estes já trabalham nos sertões nordestinos e amazônicos, com baixo custo e muito impacto popular. Na Zona Franca de Mariel, ó, – o dedo em forma de Ok para sinalizar aprovação! – dá-lhe biotecnologia com as ervas importadas da Amazônia! Quanto ao Amazonas, bem, pela fragilidade de sua infraestrutura e baixa competitividade, por enquanto, que se volte para sua vocação de “base ecológica”, necessariamente extrativista pela ausência crônica de formação biotecnológica visando agregação de valor. E que aumente sua pauta de exportação! O ecológico, tudo indica, nada tem a ver com a utilização dos recursos de P&D para a qualificação do perfil farmacológico, focado na utilização dessa imensurável bagagem genética que a Natureza aqui deixou e que o descuido de nossa representação política e ausência de lideranças regionais esnobam a cada dia, protelando a poesia da transformação. Valei-nos, a Virgem Maria, Nossa Senhora da Conceição!
Alfredo MR Lopes
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