Peço desculpas ao leitor por voltar ao tema, mas acompanho de perto o drama do caboclo na enchente e não posso deixar de relatá-lo neste espaço. Vejo Anamã, Barreirinha e Canutama, onde as sedes municipais ficaram debaixo d’água, e Caapiranga, com 80% inundados. Estamos no fim da cheia. Vem aí a vazante. Cumpro, então, a obrigação de apresentar sugestões para melhor conviver com esses momentos de angustiante emergência.
Para ser justo, Governo do Estado e Governo Federal mostraram boa vontade em ajudar as Prefeituras. A burocracia, porém, prejudicou a eficácia do crédito depositado no cartão magnético estadual. As cestas básicas enviadas pelo Ministério do interior chegaram deterioradas, muitas vezes, e os prefeitos tiveram que montar equipes dispendiosas para embalá-las – os valores parecem pequenos, num orçamento como o de Manaus, perto dos R$ 1,5 bilhão/ano, ou do Estado, em torno de R$ 7 bilhões/ano, mas alguns milhares de reais ganham dimensão de sacrifício, num orçamento anual que não passa dos três dígitos.
Tenho uma idéia envolvendo o Seguro-Defeso.
Quando fui Ministro-Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, o então representante da categoria na região e hoje deputado estadual, Walzenir Falcão, levando consigo uma delegação da Associação Nacional dos Pescadores, foi ao meu gabinete pedir ajuda para criar o Seguro-Defeso. Trabalhamos, conversamos, fomos ao Ministro do Trabalho e conseguimos criá-lo.
Esse salário extra, pago ao pescador no período do Defeso das espécimes ameaçadas de extinção na Amazônia, pode e deve ser estendido por mais dois meses. O Ministério do Trabalho paga. O Ministério da Pesca autoriza. Falta apenas o Ibama acordar e cuidar mais de políticas macros, deixando de lado a pequenez de perseguir o caboclo.
Um exemplo: em Itapiranga, a população precisa de madeira para construir pontes, nos locais mais inundados da sede municipal, e está sendo impedida pelos fiscais do Ibama. Sou um militante da ecologia. Defendo a causa preservacionista. Não participo, no entanto, de política nenhuma que não tenha o homem em primeiro lugar. Vou à direção do órgão, esta semana, e serei duro ao cobrar explicações por essa postura radical, sem amparo na legislação, uma vez que se trata de sobrevivência e emergência, numa região da mais absoluta falta de meios alternativos para a construção de obras como essa.
Está chegando a emergência da vazante. Doenças oportunistas e de veiculação hídrica, como gastroenterite, certamente atingirão a população. Sugiro a criação de um Seguro-Agricultor, nos moldes do Seguro-Defeso. Afinal, a agricultura familiar do Amazonas, cuja maior parte está localizada nas várzeas ou na área muito próxima a ela, foi praticamente dizimada. Vou levar a idéia à Explanada dos Ministérios.
As autoridades brasileiras precisam entender o princípio geral do funcionamento da Nação: o cidadão vive nas cidades, não no Estado, nem na União. É o prefeito que lida com ele. Por isso, os recursos do cartão-enchente e as cestas básicas seriam muito melhor utilizados se fossem enviados diretamente para as Prefeituras, sem dispensar a necessária e profilática fiscalização dos devidos Tribunais de Contas.
Missionária
Encontro, numa dessas viagens pelo interior, a missionária Edilane. Ela milita bravamente junto aos ribeirinhos, flagelados da enchente. Está grávida, de um filho concebido quando trabalhava ajudando os carentes do Timor Leste. Espera uma menina. Disse-lhe que se fosse menino a escolha do nome seria muito fácil: Noé, nascido no meio do dilúvio.
Arthur Virgílio Neto é líder do PSDB no Senado.