Energia solar e casas populares
A iniciativa do governo federal de incluir o uso de energia solar no programa habitacional que construirá 1 milhão de casas populares tem diversos aspectos positivos. Pelo menos quatro deles já merecem ser ressaltados:
1. na situação em que a economia mundial e a brasileira se encontram, assombradas pela ameaça de que a crise seja duradoura e profunda, serão gerados muitos empregos na fabricação de placas e equipamentos de captação da energia do sol;
2. as famílias destinatárias do programa social de habitação terão uma economia mensal de cerca de 30% na conta de luz, uma vez que o aquecedor dispensará o uso do chuveiro elétrico;
3. cria-se, assim, um círculo virtuoso, em que o valor economizado irá, em alguma medida, para a renda do trabalhador e, consequentemente, para o consumo, já que haverá economia no valor da conta de energia no fim do mês.
O quarto aspecto é o fato de a política pública adotar medidas que se enquadram nas metas do Plano Clima, lançado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no fim do ano passado, para redução de 72% da emissão de gás carbônico na atmosfera, entre 2008 e 2017, tendo como primeira iniciativa a redução do desmatamento da Amazônia. De acordo com o ministro Carlos Minc, do Meio Ambiente, o uso de energia solar em 1 milhão de residências representará que, pelo menos, 830 mil toneladas de carbono deixarão de ser lançadas na atmosfera. Na medida em que haja economia de energia, dispensa-se a construção de uma usina hidrelétrica de porte considerável, contribuindo ainda mais para a redução do impacto ambiental.
O presidente Lula manifestou entusiasmo com a proposta do uso de energia solar, numa conversa que mantivemos em 6 de março, em Vitória, ocasião em que me comprometi a lhe encaminhar documento atestando a viabilidade econômica e social da proposta. Na nossa visão, a energia solar dispensaria o uso contínuo do chuveiro elétrico, que tem por finalidade exclusiva aquecer a água do banho. O chuveiro é considerado o vilão do sistema energético, basicamente por três razões: consome entre 25% e 35% do que se gasta com eletricidade; tem potência muito elevada, chegando aos 5 mil watts, e exige do governo esforço adicional em relação à manutenção da qualidade do fornecimento.
O aproveitamento eficiente dos recursos públicos deve considerar os benefícios econômicos diretos, mas de uma forma ampla. Isso significa que, mesmo que o custo da construção de casa popular saia mais alto pelo menos R$ 600, que é o preço médio de um aquecedor solar nas condições atuais, os ganhos com sua utilização, no médio e longo prazo, compensariam o gasto público. Na União Europeia, por exemplo, a recuperação do investimento ocorre em até quatro anos.
O cálculo da economia com uso de energia é simples. Se considerarmos o valor da conta de luz de uma família de baixa renda, ao redor de R$ 50, o ganho mensal por unidade residencial seria de aproximadamente R$ 15. No ano, R$ 180 (o governo é ainda mais otimista e fala em R$ 300 a R$ 500). Em 10 anos, R$ 1,8 mil. Se multiplicarmos por 1 milhão de casas populares, em 10 anos haverá economia de R$1,8 bilhão. Isso representaria renda para as famílias.
Em termos de economia de energia, cada família de baixa renda consome, aproximadamente, 10 KWh/mês. A economia mensal é de 30 KWh/mês; multiplicado por 1 milhão, teremos o resultado de, aproximados, 30 GWh/ano. Isso supera o consumo de um mês de energia elétrica do estado de São Paulo.
Além da economia direta, a energia solar utilizada de forma disseminada para aquecimento de água residencial pode trazer outros benefícios à sociedade. Exemplo é a redução de gastos em infraestrutura na geração, transporte e distribuição da eletricidade e ainda na racionalização dos impactos ambientais e sociais causados pelas hidrelétricas.
É conveniente que, em tempos de mudança de paradigma como o que vivemos, decisões políticas arrojadas sejam tomadas, para que possamos constituir, cada vez mais, práticas de consumo sustentáveis.
Renato Casagrande é Senador (PSB-ES), presidente da Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle do Senado