1. O Senado, na forma da Constituição Brasileira, não é a representação do Povo, mas dos Estados. Por isso mesmo, independente do número de eleitores, todos os Estados elegem 3 senadores. Embora tenha funções legislativas análogas à Câmara de Deputados, sua função constituinte máter é dar garantias ao bom funcionamento da Federação.
2. Nos últimos anos o Senado vem se transformando numa poderosa “Câmara de 81 deputados”. Com apenas 81, a articulação das decisões se torna muito mais simples e com isso as compensações individuais e partidárias e as negociações. Toda a complexidade de 513 deputados é simplificada e a representação popular se torna afetada pela média aritmética entre Senado e Câmara de Deputados.
3. Com o abandono crescente de suas funções constitucionais de guardião da Federação, o Senado viu, passivamente, por omissão ou por desconhecimento, suas funções precípuas sendo invadidas pelo Ministério da Fazenda (MF). Há anos o Senado através da Resolução 43 regulamentou os limites de endividamento de EEs e MMs. O MF não dá a mínima bola e aplica seus critérios decididos administrativamente. O Congresso não regulamentou o Conselho da LRF. O MF entende que o Conselho é ele.
4. Uma série de conflitos de interpretação entre os Estados, Estados e Municípios e Estados/Municípios e a União, leia-se MF, há muito não tem o Senado como interlocutor. Isso vale para matéria não regulamentada como a emenda 29 da saúde, ou mesmo matéria regulamentada, como o Fundeb. A inscrição em despesas correntes ou de capital das receitas provenientes das folhas de pagamento pagas pelos bancos, da mesma forma. A contabilização das multas como despesa não-tributária ou não. E segue a lista.
5. Autodispensado de suas funções constitucionais precípuas e transformado em uma poderosa e flexível câmara de deputados, o Senado passou a viver, de forma concentrada, os problemas que os deputados vivem, para o bem ou para o mal, de forma diluída. Um senador passou a valer vários deputados, e com isso é a eles que se dirigem os lobbies, a pressão do governo federal, as pressões socioeconômicas, etc.
6. As matérias que dependem do Congresso, presidido pelo Senado, não andam. Há quase 10 anos não se vota os vetos em leis (que assim não se completam), nem as contas dos presidentes da república.
7. O Senado sangra. E se não recuperar suas funções constitucionais de Guardião da Federação, sangrará ainda mais, contribuindo para a amputação da democracia, com o Governo Federal intervindo, centralizando e transformando Estados e Municípios, os entes federados, em joguetes do MF e da presidência da república. A omissão constitucional e o poder abusivo assumido serão cada vez mais a contraface da moeda do desgaste de um poder central para a existência de fato da Federação.
César Maia é ex-prefeito do Rio de Janeiro