Chorei. Sim, o mesmo peito que resistiu a tantos embates duros e não titubeou quando se viu solitário na defesa de tantas causas consideradas impossíveis não resistiu às lembranças do mestre Hélio Gracie. Na tribuna, durante sessão do Senado em homenagem à memória dele, com o plenário lotado de amigos de infância e juventude, alguns dos quais não via há mais de 30 anos, a figura desse grande guerreiro paraense me tomou por completo.
Não havia como resistir. Lá estava Tarcíso Moreno, meu maior rival no tatame, um ano mais velho, emocionado. “A gente não lutava. Brigava mesmo”, recordava ele. Lembro uma de nossas lutas, em campeonato, quando fomos parar embaixo da mesa onde estava Hélio Gracie e de lá só saímos quando puxaram a toalha, eu com a calça do quimono rasgada e ele com o paletó idem.
Olhei e vi essa lenda do vale-tudo, adversário do falecido Carlson Gracie, que é Euclides Pereira. Na mesa, Luiz Fux, ministro do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), faixa-preta de jiu-jítsu, e meus mestres Oswaldo Alves e Reyson Gracie.
Estavam lá, ainda, Wallid Ismail, Antonio Carlos, “Xuca”, advogado e ex-campeão brasileiro de judô, Ricardo Bittencourt, outro faixa-preta de verdade e a maior expressão mundial do jiu-jítsu, Rickson Gracie. Este, aliás, vem trabalhando na divulgação de seu projeto social “Guerreiros da paz”, visando acabar com essa história de violência que ronda a arte marcial.
Recordei Rolls Gracie, falecido, filho do velho Hélio. Vivemos como irmãos. Compartilhamos os momentos de obter a faixa-preta de jiu-jítsu e a beleza dos melhores dias do Rio de Janeiro. Até aquele momento fatídico do vôo de asa delta, lá em Mauá.
Hélio Gracie é um mito. Saiu de Belém para o Rio, com o irmão Carlos, muito jovem. Aprendeu olhando os treinos e virou professor quando o irmão não pode comparecer a uma aula. Entrou no tatame e dele só saiu morto.
Lutando, Hélio era imbatível. E lá se vão as recordações. Já idoso, ele resolveu desafiar minha guarda. Insistiu feito um leão. Não passou. A diferença de idade era gritante e, como todos sabem, isso pesa muito. Até para ele. Tirou o quimono, jogou no tatame e exclamou: “Deus, por que não me leva se eu não consigo nem mais passar essa guarda?”. Tratei de evitar desafio igual. Na próxima, com certeza, o mestre, teimoso como era, seria ainda mais tenaz e radical.
Mas foi uma sessão maravilhosa.
O Senador Flecha Ribeiro, meu colega de partido, chegou a dizer que “só os militares conseguem reunir tanta gente porque dão ordem unida”.
Foi gente do muay thai, como meu professor Dídimo Neto, grande lutador, aluno do mestre Arthur Mariano, veio os professores Henrique Machado, Elvis Damasceno e Paulo Coelho, o mestre Beo, perto dos 80 anos, José Mario Tranquilini, ex-campeão sul-americano de judô, o potiguar Marcelo Tigre, lutador de MMA que mora no Havaí, e tantos outros que nem me arrisco a continuar lembrando, sob pena de esquecer gente preciosa. E revi Haroldo Brito Filho, filho do meu primeiro professor.
Mestre Hélio, estavam todos lá. Sua memória permanece muito forte e bela entre nós.