Desmatamentos na Amazônia – não é novidade para ninguém – existem e vem se intensificando nos últimos 40 anos. Dados do Centro de Ciência do Sistema Terrestre do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) demonstram que, ao contrário do que se propaga, os picos de desmatamento ocorreram entre 2002 e 2005, em que áreas desflorestadas superaram 25 mil km². Exceção a 2005, quando foram desmatados 19.014 km² . Daí em diante, os números se mantiveram numa faixa média de 5 a 7 mil km² . Em 2019, ao todo, foram 9.205 km² desmatados, enquanto, até julho de 2020, 1.654 km².
O maior problema da Amazônia, na verdade, decorre da ausência de políticas públicas adequadas. A segunda metade dos anos 1950 e os 1960 configuram o período de maior efervescência, com a firme presença do governo no Setentrião brasileiro. Havia a preocupação de Brasília de efetivamente ocupar a região e defender as fronteiras. Isso levou à construção de grandes estradas, como a Belém-Brasília e a Transamazônica, projetos de telecomunicações, ao estímulo à migração de imensos contingentes do Centro-Sul e do Nordeste, à oferta de incentivos, a distribuição de terra e crédito para a atividade agropecuária, além da criação da Sudam, Suframa, reestruturação do Banco da Amazônia e investimentos na formação de técnicos de alto nível. Com a redemocratização de 1985 os programas da Operação Amazônia perderam o rumo, abrindo espaço para ações predatórias do meio ambiente que se estendem até os dias correntes.
Estudos da Embrapa mostram que, apesar do desmatamento dos últimos 30 anos, a realidade não é assim tão catastrófica. O Brasil é um dos países que mais conserva sua cobertura florestal, com 69,4% de suas florestas primitivas. Dos 100% de suas florestas originais, a África mantém hoje 7,8%, a Ásia 5,6%, a América Central 9,7% e a Europa apenas 0,3%. A América do Sul mantém 54,8% de suas florestas originais. Embora deva-se mencionar o esforço de reflorestar, não é possível ignorar que 99,7% das florestas primárias europeias foram substituídas por cidades, cultivos e plantações comerciais. Não que se cogite, certamente, o mesmo destino ao bioma amazônico, mas alertar para o fato de que o governo precisa assumir posicionamentos objetivos, de protagonismo, em relação às questões que tangem ao desenvolvimento sustentável da região.
Segundo a Embrapa, hoje, 84,1% do bioma Amazônia está recoberto por vegetação nativa (353.156.844 ha), incluindo vegetações florestais, não florestais e mistas, em terras públicas e privadas. As grandes superfícies hídricas (8.818.423 ha) representam 2,1% do bioma Amazônia. Os ambientes predominantemente naturais, vegetação nativa e grandes superfícies hídricas, somam 86,2% do bioma, conforme mapeamento e cálculos da Embrapa Territorial, baseados em dados de satélites do Inpe, CAR e TerraClass. Adicionalmente, deve-se levar em conta que, segundo o Código Florestal, cerca de 80% da floresta já está protegida e destinada à preservação, alcançando 173,4 milhões de hectares ou 41,3% do bioma, constituídas por 204 Unidades de Conservação, 330 Terras Indígenas e 32 Áreas Militares decretadas e estabelecidas.
Ao cruzar dados do Inpe com as informações do Cadastro Ambiental Rural (CAR/SFB), os analistas da Embrapa Territorial apontam que no primeiro semestre de 2019 foram identificadas 76.016 queimadas em áreas de desmatamento já consolidado na Amazônia. Esses locais, segundo o estudo, desenvolvem atividades agropecuárias “há anos, dezenas de anos e até há séculos”; e que cerca de 90% das queimadas detectadas em 2019 ocorreram em locais já desmatados e estão associadas ao uso do fogo na agropecuária por produtores pouco tecnificados”, diz o documento.
O problema de maior vulto não é exatamente o desmatamento em si, mas a ausência de políticas públicas realistas e arrojadas indicando ao mundo que, sim, a Amazônia tem dono, que a ajuda internacional é bem vinda, mas sob comando direto do Brasil. Para maior eficácia desse posicionamento o governo brasileiro precisa de um plano de desenvolvimento, de programas e projetos efetivamente transformadores. Do contrário, é o mesmo que chover no molhado. Lá fora e aqui, come rain, come shine.