Atribui-se a Goebells a afirmativa: diga-se a mentira mil vezes que ela se transformará em verdade. Atentos a essa malsã mas igualmente admitida máxima, podemos concluir quanto a mentira sustenta a sociedade por nós mesmos construída.
Indicar exemplos e aplicações da afirmação do Ministro da Propaganda de Hitler significaria gastar resmas incontáveis de papel. Por isso, basta-nos a indicação de alguns sintomas da absorção – acrítica ou não – do preceito goebelino, nesses dias tão conturbados de nossa política. Cuja conturbação – é bom logo esclarecer – não vem de hoje, nem é obra do acaso ou do tempo recente.
Refiro-me, especialmente, às mentiras relativas à crise da previdência. Como ela vem sendo apregoada pelos que derrubaram Dilma Rousseff, se os trabalhadores não sofrerem algum retrocesso nos direitos até aqui conquistados, a crise previdenciária tende a agravar-se.
É trazido, então, à opinião pública, panorama assaz inquietante: chegará o momento em que não haverá recursos para o pagamento dos aposentados. Vê-se, portanto, o Estado como portador de mensagens desestabilizadoras da psique dos indivíduos, cuidadosa e vigorosamente rejeitadas, quando está em jogo a estabilidade de governos e autoridades. Aqui, o pau que bate em Francisco não é o mesmo que bate em Chico. Para os primeiros, toda proteção, ainda que à custa do sacrifício dos cidadãos. Para os outros, o desdém e as decisões de cima para baixo. Nada mais…
Quando passou pelo Ministério da Previdência, Waldyr Pires deixou o sistema previdenciário saneado. O equilíbrio foi alardeado, causando mais que o simples otimismo. Os trabalhadores sentiram assegurada sua sobrevivência, ainda não suficientemente digna, e ainda injusta. Afinal, pagaram durante todo seu período produtivo, na certeza de que iriam desfrutar pelo resto da vida (nem assim tão longo quanto desejável) dos favores por eles mesmos financiados e conquistados. Com o que perde seu caráter de prebenda ou favor.
Hoje, tenta-se desmentir o que parece indesmentível. Sempre no sentido de exigir mais sacrifícios. Poucos os que perguntam sobre as causas de tamanha ruína. No entanto, conhece-la é indispensável, além de intransferível.
Quando muito, alega-se que os direitos assegurados pela Constituição de 1988 ampliaram de tal modo os benefícios aos mais pobres, que a Previdência acabou por desviar-se de suas obrigações. Tal é a alegação com que sempre se tem ameaçado recuar nas conquistas trabalhistas.
Quantos se perguntam dos desvios a que foram encaminhados os recursos tirados dos bolsos do trabalhador, a título de contribuição previdenciária? Quantos os brasileiros que sabem do financiamento, com essas verbas, de obras em nada relacionadas à sobrevivências (às vezes, mera sobrevida) dos contribuintes da Previdência?
Porque seja assunto que destruiria os pretextos que escondem a verdadeira intenção dos governantes e dos que lhes cercam, nada é dito a respeito disso.
Outra mentira, tecida e espalhada à moda Goebells, reporta-se ao financiamento de obras em outros países. Mesmo os mais informados fingem ignorar aspectos cruciais do problema, porque isso não lhes interessa. Seja do ponto de vista ideológico, seja do ponto de vista financeiro.
É prática do financiamento a outros países ou instituições deles, trazerem cláusula de cumprimento obrigatório, no que concerne à aquisição de bens e serviços. A regra é tal operação ser prioritariamente beneficiária de fornecedores do país financiador. Só na impossibilidade disso pode o tomador operar com terceiro país.
Os sábios da nossa economia, porém, “esquecem” essa prática, sequer diante de enormes placas e anúncios de empreiteiras brasileiras postadas diante deles, em informativos de televisão. Muitas dessas beneficiárias dos financiamentos a países estrangeiros pelo BNDES são as mesmas que a Lavajato incrimina.
O que se diz, a propósito desses financiamentos?
Que elas se destinam a beneficiar países amigos, escolhidos dentre os que mantêm alguma identidade ideológica com os governantes brasileiros. Os beneficiários mais importantes, além do próprio país financiado, seriam os governantes desses países. Nesse caso, sempre Cuba, Venezuela e Equador são os mais citados. O que revela certa desonestidade dos críticos.
Procure-se alguma palavra referente ao interesse das empresas brasileiras que vendem bens e serviços aos financiados! Busque-se compreender porque um ex-Presidente da República se transforma em garoto-propaganda e caixeiro-viajante das empreiteiras! Quantos, dentre os mais acerbos críticos dos financiamentos a países estrangeiros se dispõem a fazê-lo?
Ao contrário, disseminam mentiras, enquanto ocultam com aparência inocente ou ignorante as relações que subjazem às operações de crédito ao exterior.
Não se absolva grande parte dos media brasileiros, porque a estes caberia esclarecer o que ocorre nos bastidores. Sem isso, ela mesma acaba por acumpliciar-se com os malfeitores.