Por Paulo José Cunha
Quando o jornalista Lustosa da Costa me ligou com o convite para ir jantar em sua casa na companhia de José Saramago, não acreditei que era verdade. Mas como já conheço esse cearense há algumas dezenas de anos e sei de seu atrevimento, terminei por acreditar que ele iria mesmo receber o português que havia me impressionado fortemente quando concluí a leitura de Jangada de Pedra.
Com a ironia afiada, sua marca registrada, Lustosa provocou: – Preciso de gente inteligente para entreter o homem, Bozó. E tu és metido a sabido, bicho. Trata de vir, não vai falhar, heim?
Que enrascada. Apesar da tentação dos camarões e dos líquidos preciosos que Lustosa e Verônica não economizam quando recebem amigos, objetei que, de Saramago, só havia lido a Jangada. E gostara (apesar das frases compriiiidas e da ousadia da falta de pontuação). – Pois olha, Bozó, trata de ler e logo O Ano da Morte de Ricardo Reis e o que mais encontrar por aí, porque vou te colocar na mesa do homem. E vais ter de arrumar assunto pra conversar com ele, ordenou.
Cá comigo, pensei: Saramago é comunista, logo há de gostar de falar sobre a obra de outro comunista, o colombiano Gabriel García Márquez. E essa eu conheço bem, li tudo dele. Se o problema é papo, pode deixar que eu resolvo.
Lustosa havia conhecido Saramago numa de suas viagens à Europa, não me lembro mais em que circunstância, acho que num evento na embaixada do Brasil em Portugal. Atrevido como é, convidara o português para jantar, quando voltasse a Brasília, onde já havia estado algumas vezes. Saramago não se fez de rogado. Ao vir receber o prêmio Luís de Camões, cobrou de Lustosa e o jantar foi agendado. Naquela noite, acomodaram-no entre mim e a Verônica . Lustosa, agitado como sempre, pulava de mesa em mesa.
Noite inesquecível. Até porque o receio inicial de conversar com um intelectual do porte de Saramago (que alguns anos depois conquistaria o Nobel) e cometer alguma gafe logo se desvaneceu diante de sua simpatia e franqueza. Franqueza que quase nos mata de rir quando contou, entre generosas taças de vinho, da overdose de Juscelino que havia tido ao se hospedar no Kubitscheck Plaza, em Brasília, onde a figura do construtor da Capital é reverenciada em todos os ambientes. “Pois nunca na vida convivi tanto com um homem como tenho convivido com vosso Juscelino. Durmo com ele e acordo com ele. Encontro-o à entrada, no hall, no desjejum, em toda parte. Até quando estou nu já me deparei com ele, em plena casa de banhos”, dizia, às gargalhadas. Uma senhora que se sentava à nossa mesa não gostou. Quando ele saiu para ir à “casa de banhos”, mostrou-se incomodada ao vê-lo “zombando” da figura de Juscelino. Deu-me pena de ela não perceber que Saramago queria apenas um motivo pra deixar mais descontraída a conversa com quem provavelmente nunca lera uma página de suas obras. Pedi-lhe que relevasse, não havia zombaria, só brincadeira pra descontrair o ambiente. Não adiantou. Retirou-se antes que ele retornasse. A conversa correu. Revelou que o que desejava mesmo era ser um andarilho, pra espiar em detalhes todas as bibocas do mundo. E depois contar tudo o que visse (nosso jantar foi terminar num de seus livros de viagens). Paradoxalmente, disse ter preguiça de viajar. Confessou-se fã da arquitetura de Brasília. Mas, novamente às gargalhadas, perguntou se quando Brasília havia sido construída não haviam inventado tintas de outras cores. “Ora, pois! Tudo é branco por aqui! Quando encontrar Oscar (Niemeyer) vou indagar-lhe se não gosta de cores”.
Não sei se indagou. Certo é que tivemos uma noite memorável. E nem precisei citar o nome de Gabriel García Márquez…
Lendo este seu artigo, me veio a lembrança de quando o Sr. era Prefeito. Em um jornal, aparecia sua foto com a imagem de Nossa Querida Mãe do Céu, Nossa Senhora de Fátima. Uma imagem grande e bonita bem atrás de sua costa. Pensei: deve estar sendo difícil para o Prefeito conciliar suas tarefas com sua educação religiosa. Sabemos que a política e ingrata. Imaginava o quanto a sua esposa – não recordo o nome – deveria se ater em suas orações, pra que o Sr se livrasse das armadilhas que o cargo lhe proporcionava. Portanto Sr. Serafim, não perca seu tempo com alguém que só teve tempo para criticar o nosso Deus. Há muitos que estudam, buscam o conhecimento e acabam se distanciando do Sr. da Verdade. “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (João 14.6). Acreditar que Deus existe, não é nenhum crime, como tambem, ser atéu, não é ser nenhum hipócrita, e devemos como Cristãos, acolher esses irmãos com carinho. Mas, eis que os atéus, não olham para esse lado, e passam a vida querendo destruir a imagem do Criador. Que diga o pai do atéismo contemporâneo, o biólogo Richard DawKins, que em seu livro “Deus Um delírio”, descreve Deus da seguinte forma: “O Deus do Antigo Testamento é talvez o personagem mais desagradável da ficção: ciumento, e com orgulho; controlador mesquinho, injusto e intransigente; genocida étnico e vingativo, sedento de sangue; perseguidor misógino; homofóbico, racista, infantícida, filícida, pestilento, megalomaniáco, sadomasoquista, malévolo”. (Cap. 2 Pg. 55). Escrevo isto tudo, pois encontro na inteligência de Saramago, a locura do mundo Neoliberal. O Evangelho Segundo Jesus Cristo, escrito por Saramago é obra abstrata. É uma tela branca exposta em museu com requinte de raridade. É uma obra comparavél somente a história do “Rei Nú”. Será que Saramago se conformaria em ver sua obra “Ensaio sobre a Cegueira” lida as avessas? Então, Sr. Serefim, o mundo não precisa escrever muito sobre Saramago,pois virão outros e mais outros, mas, O Deus Todo Poderoso continuará a alimentar a nossa alma de amor, de verdade e justiça. E com certeza, já deva ter perdoado o autosuficiente da verdade José Saramago.
Obrigado Sr. Serafim e que Deus derrame suas bençãos de amor sobre o senhor todos de sua família.