Em abril de 2021, a Espanha decidiu constituir uma comissão formada por especialistas, recrutados no governo e fora dele, para produzir um diagnóstico do seu sistema tributário e a partir daí elaborar propostas visando melhorar sua eficiência e ajustá-lo às novas exigências da fiscalidade ambiental e da economia digital.
Em fevereiro passado, a comissão apresentou, para debates, o “Libro Blanco sobre la Reforma Tributaria”, um consistente documento de 788 páginas.
A Espanha fez a opção correta. Qualquer reforma deve ser precedida por um diagnóstico, que especifique o problema e aponte, de forma transparente, soluções acompanhadas de suas repercussões. Caso contrário, é um mero pacote autoritário, que não raro embute interesses pouco virtuosos.
O caminho espanhol não é inédito. Na década de 1960, foi instituída, no Brasil, a Comissão Especial da Reforma Tributária, integrada por qualificados especialistas, cujos trabalhos resultaram na Emenda Constitucional nº 18, de 1965, nossa mais arrojada reforma da tributação do consumo.
Ninguém tem dúvidas quanto à existência de inúmeros problemas no sistema tributário brasileiro. É preciso, todavia, examiná-los com profundidade e imparcialidade.
A instituição de uma comissão, hoje, poderia ser um bom começo. Alguns critérios para orientar os trabalhos também ajudariam: só reformar o que for essencial, considerados os benefícios e os custos da mudança; buscar a verdadeira modernidade, que inclui a fiscalidade ambiental, a economia digital, o uso parcimonioso da extrafiscalidade, o novo financiamento da previdência social; coibir o planejamento tributário abusivo, que erode as bases tributárias e gera desequilíbrios concorrenciais.
A temática, todavia, não deveria ficar limitada à reforma dos tributos, em sentido estrito, mas conferir atenção a questões sempre ignoradas: o burocratismo tributário, insistentemente alegado como pretexto de proposições e jamais enfrentado; o federalismo fiscal, colcha de retalhos que abriga inconsistentes critérios de partilhas de renda e suspeitosas transferências voluntárias, e desconhece a especificação das competências dos entes federativos e os arranjos de cooperação entre eles; e o processualismo patológico, principal fonte do assombroso volume de litígios e da insegurança jurídica.
Como ensinava Mário Henrique Simonsen, integrante da Comissão de Reforma: “Se for bem enunciado, o problema mais difícil do mundo será resolvido. Mal enunciado, o problema mais fácil do mundo jamais será resolvido”.