Por Joaquim Falcão, no Blog do Noblat:
É sempre de manhã, em dias de semana. Por volta das onze horas. A audiência preferida é a família, tanto os jovens, que vão à escola a tarde, como as mães de família, e os milhões aposentados, que em geral moram sozinhos. Neste período surgem em inúmeros canais de televisão anúncios oferecendo de serviços de advogados. São muitos e de vários tipos.
Um senhor de cerca de cinquenta anos, cara séria e confiável. Voz pausada. De terno e gravata, à frente de uma estante cheia de livros encadernados. Mesmo sabendo que estamos numa terra onde quase ninguém mais usa terno e gravata, a não ser em Nova York e Boston, e os livros não são encadernados.
Ele olha para você com uma espécie de autoridade solidária e diz: É muito fácil fazer um plano de saúde. Difícil é receber do plano de saúde. Você precisa de um escritório de advocacia como o nosso. Somos especializados em receber de planos de saúde. Você precisa de ajuda. Você só nos paga, quando receber. Telefone agora: 0800……..”.
No outro anúncio, a cena é de um automóvel batido. Nada muito dramático. Nem muito sangue. Uma sirene ao longe sugere que a polícia está chegando. Mas a voz é solene e grave: “Se você se envolveu em algum acidente que causou dano, ou sofreu dano, você precisa de um advogado. Nós temos a proteção e a experiência de que você precisa. Telefone agora para 0800…..”.
Finalmente, o terceiro anúncio é mais incisivo e mais inesperado ainda “Se alguém, algum contador, algum inspetor fiscal está lhe importunando, você certamente precisa de ajuda com sua documentação de imposto de renda. Venha nos procurar. Nós temos os melhores advogados e auditores fiscais aposentados para lhe ajudar. Telefone agora para 0800….”.
Trata-se da televisão norte-americana estimulando a judicialização do consumidor e do contribuinte. A judicialização do quotidiano faz parte dessa cultura. Mas necessariamente não precisa ser um modelo de exportação. Pode haver outras alternativas e desde que enfrentemos nossas patologias.
Pelo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, em seu artigo 34, é proibido fazer propaganda dos serviços advocatícios. E no entanto, esta prática está crescendo informalmente, não através dos advogados de porta de cadeia como se dizia no passado. Mas através dos advogados de porta de juizados especiais ou dos balcões de atendimento dos usuários dos serviços públicos.
Não são os advogados diretamente. São funcionários contratados que distribuem folhetos aos consumidores contrariados com os serviços recebidos. Para marcar a presença, usam um colete de cor amarela, chamando os consumidores desorientados em suas reclamações.
O problema não é saber se o consumidor tem ou não razão. Em muitos casos tem. O problema é constatar que cresce nesta época de direitos de massa, mecanismos para-formais que estimulam demandas judiciais, que por sua vez, acabam por destruir os dois pilares dos juizados especiais: o de ser uma justiça rápida, sem sucessivos graus de jurisdição.
E de ser uma justiça para resolver conflitos de natureza privada entre os cidadãos e não necessariamente conflitos envolvendo serviços públicos.