Durou dois dias a visita do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ao Brasil, e passada a exagerada euforia de nossos meios de comunicação com a presença do “homem mais poderoso do mundo”, uma análise sóbria do saldo de sua vinda revela muito pouco. Comentei anteriormente que o interesse de Obama no Brasil é um elogio ao desenvolvimento e à crescente influência que nosso país tem no cenário internacional, mas um elogio algo vazio: não se converteu em acordos comerciais de relevância, tampouco no apoio político que esperávamos para reformar o Conselho de Segurança da ONU e incluir o Brasil como integrante permanente. Uma decepção.
Os acordos assinados são tímidos se comparados ao potencial de negócios que os dois países têm a fazer –desde que os norte-americanos revejam sua absurda política de subsídios à produção interna. Já a declaração por meio de nota oficial conjunta sobre a inclusão do Brasil no Conselho de Segurança da ONU é quase lacônica: usa termos não comprometedores como “apreço à ideia” de um assento permanente para nosso país, e coloca os Estados Unidos como nossos “parceiros”. É pouco. Hoje, se posta em discussão a reforma da ONU, não há garantia sequer de que os EUA votariam favoravelmente, quanto mais fazer campanha pela inclusão do Brasil no CS.
É posicionamento radicalmente distinto do que o mandatário estadunidense adotou quando esteve em Nova Delhi, quando pontuou claramente a necessidade de reformar os órgãos internacionais e de incluir a Índia no Conselho de Segurança –deferência que o Brasil também merece, sob todos os pontos de vista.
Ficam, para os brasileiros, a simpatia e o carisma do casal Obama e um show de intransigência do aparato norte-americano de segurança. Em Brasília, a equipe estadunidense causou mal-estar ao forçar ministros de estado a passarem por revista (!) antes de irem ao almoço com empresários, desrespeitando acordo previamente firmado entre as diplomacias dos dois países. No Rio, a cena insólita do serviço secreto norte-americano inspecionando, inclusive com cães farejadores, carros da Polícia Federal arrancou vaias do público que aguardava em frente ao hotel onde hospedou-se a família Obama.
Chama a atenção também que o presidente norte-americano autorize de solo brasileiro o bombardeio da Líbia, sabendo que nosso país é contra a ação militar e defende, em todos os casos, a negociação pacífica para resolução de conflitos. Posição essa corretamente reafirmada pela presidenta Dilma Rousseff durante pronunciamentos ao lado de Obama e também pelo Itamaraty, por meio de nota oficial.
A postura da presidenta como um todo, aliás, merece destaque. Ela demonstrou firmeza na defesa dos interesses nacionais em todas as suas manifestações, em especial por maior abertura do comércio bilateral. Não podemos e não devemos nos contentar com a sinalização de Obama de que os Estados Unidos querem ser os maiores compradores do combustível extraído da camada Pré-Sal –único momento em que o presidente norte-americano foi incisivo, sem tergiversar.
Queremos vender petróleo, laranja, algodão, etanol e mais, abrir o mercado norte-americano para nossos produtos tecnológicos, de alto valor agregado. Precisamos de um aliado de peso que compreenda que a ONU ainda opera de acordo com uma lógica do século passado, e que só poderá a ser um organismo legítimo quando refletir o mundo multipolarizado de hoje. Está claro que a diplomacia brasileira, soberana e independente, seguirá insistindo nesses pontos, e os “primos ricos” do norte não ignoram a importância dessas medidas. Aguardemos que, na próxima vez que um presidente norte-americano vier ao Brasil, medidas praticas nesse sentido estejam em curso.
José Dirceu, 65, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT