A CPI DA TOMADA: ONDE ENFIAR OS TRÊS PINOS?

Por  Ribamar Bessa:

Essa pergunta será feita ao dono do Hotel Garvey, em Brasília, no dia em que o deputado Eduardo (vixe) Cunha (vixe) do PMDB (vixe-vixe) instalar a CPI da Tomada para investigar as empresas fora-da-lei que continuam usando tomadas antigas de dois furos. Tal CPI será criada – não tenham dúvidas – se Cunha com seu bico curvo e adunco e suas garras afiadas de carcará perceber que pode ganhar “politicamente” alguma coisa com isso.
Fiz a mesma pergunta nesta sexta-feira ao Reginaldo, funcionário da Recepção do Hotel: onde enfio os três pinos? Eu havia feito uma reserva no Garvey. Realizei o check-in e subi ao terceiro andar, encontrei a porta danificada do quarto 333  com a madeira compensada toda esfolada. Como toda desgraça é pouca, uma vez lá dentro, tento ligar o notebook, que está dentro do Padrão Brasileiro de Plugues e Tomadas, descubro que o pino não entra no buraco. O que aconteceu depois é quase inenarrável.
Desci para a Recepção e interpelei o funcionário do Garvey Park Hotel, situado na Asa Norte, distante apenas 9 km do Palácio do Planalto. No site, eles anunciam que tem “móveis modernos, guarda-roupas espaçosos e pisos de azulejo” e de quebra se gabam de ter funcionários poliglotas: “Nós falamos a sua língua”. Mentira! Suas tomadas monolingues não entendem o dialeto dos plugues e sequer possuem um tradutor, um reles adaptador, para quebrar um galho. E Reginaldo não entendeu o que eu falava.
Cacimba da Dadá
Costumo viajar levando sempre na mala um kit de adaptadores com tomada chata, tomada com terra, sem terra, etc. especialmente depois de um sufoco no aeroporto de Bogotá, em que não consegui ligar meu notebook. Mas só faço isso em viagem ao exterior, onde o padrão é outro, diferente do nosso. No Brasil, existe uma lei desde 2002, com prazo de adequação até 2010, que obriga todo mundo a trocar a tomada de dois pinos pela de três. Mas o Garvey não está nem aí.
A gente até que entenderia se o transgressor fosse o Hotel Cacimba da Tia Dadá em Urucurituba (AM), no meio da floresta amazônica, ou o Hotel Mocorongo, em Santarém. Mas logo em Brasília, na capital federal, a 5 minutos de táxi da Câmara de Deputados? Lá a expectativa é outra. Seria possível perdoar se o Garvey oferecesse adaptadores aos seus hóspedes, enquanto não faz a reforma. Ou se pelo menos abrisse uma loja para vender adaptadores e ganhar dinheiro com a operação. Nada disso.
– Ás 21 horas, onde é que encontro um adaptador?
Reginaldo, o zeloso funcionário, coitado, disse que não era possível usar qualquer aparelho de três pinos. Diante do meu desespero, respondeu que o problema era meu e não do hotel. Invoquei a lei. Nada. Expliquei, quase chorando, que precisava redigir essas mal traçadas linhas e enviar ao jornal. Nada. Cartada final: ameacei deixar o hotel. Ele sem pestanejar, sem qualquer interesse em segurar o hóspede, me devolveu a ficha. Cumpri, então, a ameaça. Deixei o hotel. Telefonei pra mais três perguntando se tinham tomada de três pinos, dois deles não tinham.
Dessa forma, o Garvey  não é a única empresa pré-capitalista que desafia a lei no coração da República. Prefere perder uma diária do que fazer a reforma exigida. Sequer opta pela merreca de um adaptador de cinco reais para melhor atender o hóspede.
Pedi para falar com o gerente, não tinha gerente. Reginaldo me explicou que aquele quarto – não era o único – pertencia a outra empresa, que terceirizou várias habitações naquele hotel. Era um hotel dentro do hotel, só que sem funcionários responsáveis.
Enfia na dele
De qualquer forma, antes de cancelar a reserva e abandonar o local explodindo de raiva pelo constrangimento e pelos maus-tratos, pedi o livro de registro de reclamações e redigi um protesto furibundo, que ninguém vai ler, nem tomar qualquer providência. Os empresários da rede hoteleira gozam de total impunidade para seus desmandos. O público que se lixe.
A Polícia Federal, seguindo o modelo da “Lava-Jato”, podia muito bem criar a Operação “Enfia na Tomada dele”. O Macaco Simão, em sua coluna na Folha de São Paulo explorou um cartaz exibido numa manifestação na avenida paulista, com a foto de uma tomada de três pinos e a frase: “Só essa porra já merecia um impeachment”. Segundo ele, “tomada de três pinos é pior que corrupção. Se a Dilma prometer a volta da tomada de dois pinos, a popularidade dela explode prá 20% Rarará”.
Esse novo padrão brasileiro criou a chamada “tomada-jabuticaba”, de três pinos,  que só existe no Brasil, com um encaixe diferenciado e formato em poço, cujo objetivo seria evitar o contato acidental do usuário com a corrente elétrica. Na época da lei, estatísticas duvidosas falavam do registro de 13.776 internações hospitalares com 379 mortes – isso num período de dez nos – decorrentes de acidentes com correntes elétricas em residências, locais de trabalho, escolas, asilos, além de incêndios causados pelo tipo de tomada antiga.

Nem sei se é verdade, mas se for verdade o Hotel Garvey continua, então, sendo um perigo para a vida de seus hóspedes, por incompetência ou mesquinharia. Não existe um órgão fiscalizador que faça cumprir a lei. Moral da história: se for a Brasília, faça como se estivesse indo para o exterior, leve vários adaptadores. Ou fuja de hotéis sem tomada de três pinos onde enfiar o plug do seu computador.