Um balanço sereno e objetivo feito uma semana depois do encontro dos presidentes Lula e Barack Obama em washington sábado pp já nos permite dimensionar com relativa segurança os seus desdobramentos. A reunião realçou a importância que o Brasil tem hoje no mundo, no novo cenário mundial, não apenas por sua liderança na América do Sul mas, também, como membro dos BRICs e do G-20 e pelo papel que desempenha como uma das maiores economias do mundo.
O tamanho continental de nosso país e suas expressivas população e economia não explicam sozinhos porque em recente pesquisa o Brasil foi classificado pelos europeus em sexto lugar no ranking mundial, logo após, os Estados Unidos, Grã Bretanha, Alemanha, Japão e Franca.
A classificação nesse patamar só pode ser explicada pela nossa política externa, pela ação nos organismos e acordos internacionais, pela predsença e pelos investimentos, exportações e políticas de integração seja via MERCOSUL, seja mediando e buscando saídas pacificas nos conflitos regionais, seja liderando a UNASUL.
É por essa posição singular do Brasil que a crise internacional ocupou um lugar de destaque na agenda dos dois presidentes. Não foi apenas pela sua gravidade, mas em correspondência mesmo ao papel que o Brasil – ao lado dos outros três BRICs, Rússia, Índia e China – pode jogar no G-20, na busca de saídas e de reformas nos sistemas financeiro e de comércio mundial.
O Brasil tem posição e liderança na rodada de Doha. Na crise internacional defende uma forte regulação do sistema financeiro que ponha um fim nos instrumentos e na falta de regulação que possibilitaram desencadeá-la. Isso leva à necessidade de estatização dos bancos para se obter uma retomada imediata do crédito e uma solução para os chamados ativos podres.
Essa autoridade que temos vem da nossa situação em geral e das medidas que tomamos para enfrentar a desaceleração econômica, mudar o modelo energético mundial com base no etanol e no biodiesel, e na prioridade que conferimos às pesquisas de novas fontes de energia, não apenas eólica e solar, mas também nuclear.
Para o Brasil a saída da crise exige a democratização dos organismos de poder e decisão em nível mundial – ONU, FMI, BIRD e OMC – a ampliação do G-7 para G-20 e medidas que devem ir além do enfrentamento da crise financeira e econômica para evitar que a recessão mundial, a falta de crédito e a queda dos investimentos e do comércio represente mais fome e desemprego para os países pobres.
Daí a importância da retomada das negociações de Doha para eliminar o protecionismo, e da reforma do FMI e do BIRD para dar sustentação aos países emergentes com políticas novas de crédito e de comércio.
Sem a mudança de governo nos Estados Unidos, sem a nova política da Casa Branca não seria possível esse encontro entre os presidentes dos dois países e nem teria surgido a agenda comum de reuniões preparatórias para o G-20.
A administração democrata mudou a agenda dos Estados Unidos, não apenas no enfrentamento da crise mas, também, com a anunciada retirada das tropas do Iraque, a mudança da política ambiental e, esperamos, uma nova política para a América Latina começando por Cuba e pelo abandono de políticas falidas como a de combate ao narcotráfico, cujo maior exemplo é o Plano Colômbia.
Não devemos subestimar a gravidade da crise financeira, a falência dos bancos americanos e europeus, e suas conseqüências não só econômicas, como a recessão e o desemprego, mas também políticas, representadas pela perda do apoio popular dos governos da Grã Bretanha, Franca, Espanha, Alemanha e Itália, e a crise social na Europa do Leste.
O ajuste será duro e prolongado e trará mudanças drásticas no mundo, começando pelo mapa político da Europa como aconteceu nos Estados Unidos com a vitória de Barack Obama. Um novo mapa de poder surgirá no mundo pós-crise. De nossa capacidade de enfrentar no Brasil a turbulência econômica internacional e influenciar as reformas mundiais, depende nosso papel nesse novo mundo que surgirá das ruínas do neoliberalismo.
José Dirceu é ex-ministro chefe da Casa Civil do governo Lula.